Capítulo 2

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"Se amor é cego, nunca acerta o alvo."

Willian Shakespeare

O sinal para o fim das aulas do dia soou e estou caminhando em direção ao auditório, quando alguém grita meu nome. Viro-me e me deparo com um rapaz baixo e gorducho correndo em minha direção.

Ícaro é o tipo de pessoa que todos querem por perto, é compreensivo e sempre tem os melhores conselhos.

-Ei! Espera aí! -Ele grita quase sem fôlego.

Eu o espero para que entremos juntos ao auditório e, particularmente, fico feliz que ele me acompanhe, não sou boa com recepções calorosas.

-Que bom que me esperou, achei que fosse cabular mais essa aula. -Ele disse olhando fixamente em meus olhos.

Odeio quando faz isso, digo, olha-me fixamente. Faz meus olhos ficarem tão sem graça ao lado dos dele que são cintilantes e azuis. Menciono a beleza de seus olhos e ele retruca:

-Pare, não são tudo isso...

Mas Ícaro sabe que é verdade, só é modesto demais para admitir.

-E você sabe que não é sempre que eu cabulo, e, quando cabulo, é para fazer alguma atividade...

-Sei – Ícaro rebate – Aprender línguas não é válido. -E sai andando.

Entramos no auditório e procuramos um lugar bem ao fundo, assim que a senhorita Cassandra chega, sentamos mais a frente para que possamos ouvir direito. A senhorita Cassandra é uma mulher que possui uma certa idade, mas sua aparência é muito jovem, há quem diga que é uma herança de sua avó, que era francesa.

Ela passa uma folha para cada um sobre os eventos anuais que teremos e nesse momento digo a Ícaro:

-Você viu que a Elisabeth vai participar das aulas também?

-Claro que eu vi, quem não veria? Afinal ela é melhor amiga da Isabela, a irmã doRodrigo que todo mundo "ama". -Responde ele com ironia.

Elisabeth é o tipo de garota que parece ter saído de um romance americano, de tão linda que é. Possui cabelos loiros bem claros e ondulados, olhos verdes, é alta e magra, o sonho de qualquer garoto. Mas sua beleza é altamente comparada a sua arrogância, qualquer oportunidade que ela tem para arruinar os outros e se dar bem, ela faz. Pena que não são todos que a veem assim. Ela é manipuladora e eloquente, consegue até mesmo, fazer com que os professores a admirem, mesmo que saibam o quão horrível ela é. Isso me deixa atordoada, mas logo este pensamento se desfaz, Ícaro está com a folha na minha frente e logo percebo que está mostrando as possíveis encenações para o fim do ano.

-Jade, isso é incrível! Poderemos encenar Shakespeare!

Entrego-lhe um sorriso sem graça, sei que Shakespeare é um de seus autores prediletos, mas eu não me conformo com a ideia de encenar Romeu e Julieta, não gosto de mortes, ainda mais em um romance! Onde já se viu? Tudo bem, eu até entendo que a geração do romantismo é sim caracterizada pela morte das personagens, mas não consigo entender o que há de romântico nisso, ver que você ama partir é uma das piores coisas que podem acontecer.

-Talvez poderíamos encenar "A cartomante" de Machado de Assis, ou até mesmo "A formiguinha e a neve" de João de Barro, essa história é tão linda... Lembro-me quando minha avó a contava para mim.

-Não seja esquisita! Shakespeare é uma divindade, se não atuarmos essa peça meu coração seria capaz de romper-se em mil pedacinhos...

-Se eu sou esquisita, você é dramático!

-E não é esse o propósito de eu fazer teatro? Minha atuação só não é melhor do que a da Elisabeth, aquela ali sabe ser fingida, até parece natural.

Não contive a risada, ela sabia mesmo ser fingida.

A professora Cassandra voltou a falar:

-Bom, para sabermos a peça a ser encenada ao fim do ano, faremos uma votação. Optei por fazê-la hoje, para que possamos ir aprendendo com base em algo já concreto. Peço que cada um olhe atentamente as peças dispostas e escolha de acordo com aquilo que mais sentem afeição. Nesse momento não devemos seguir a razão, mas sim a emoção.

Achei engraçado aquilo, aparentemente ela nem era casada, nem namorava. Pelo jeito a razão reinava em seu corpo. Ela continuou:

-Após tomarem a decisão, peguem um papel e uma caneta, escrevam-na e coloquem na urna aqui na frente. Caso dê empate, eu sortearei.

Olhei as opções atentamente:

· Aladdin – Adaptação de Elizabeth Rudnick

· A Cartomante – Machado de Assis

· A Formiguinha e a Neve – João de Barro

· A Revolução dos Bichos - George Orweel

· Capitães da Areia – Jorge Amado

· Romeu e Julieta – Willian Shakespeare

Nunca fui boa com escolhas, acho que a frase que mais me afeta é "Você que sabe". Por fim opto por "A Formiguinha e a Neve", essa história me traz boas lembranças. Escrevo a escolha num papel e o coloco na urna.

Espero 15 minutos até a professora Cassandra contar os votos e mencionar o mais votado:

-Romeu e Julieta! Certamente temos um trabalho duro pela frente, mas percebo que meus alunos possuem bom gosto.

Ícaro está agitado em meu lado, muito feliz que sua escolha obteve incríveis 14 votos! Mais que a metade de alunos que temos na sala, certamente escolheram essa história por conta do beijo o final, mas quem se importa? A não ser que a preocupação seja com a transmissão de germes.

Senhorita Cassandra escreve o resultado na lousa:

Aladdin: 3

A Cartomante: 2

A Formiguinha e a Neve: 1

A Revolução dos Bichos: 2

Capitães da Areia: x

Romeu e Julieta: 14

Assim que termina de escrever, ela se vira e diz:

-Os papéis serão escolhidos de acordo com o rendimento de vocês. Faremos algumas audições antes de escolhermos o elenco final. Quem não se adaptar em nenhum papel, poderá ajudar o pessoal do curso de design e montar o palco, figurino etc. Assim, não ficará sem nota para atividades extracurriculares.

A maioria ficou histérica, todos queriam o papel principal. O sinal tocou e as pessoas aglomeravam-se na porta, na frustrante tentativa de sair e ensaiar para as audições.

Ícaro e eu ficamos sentados até o momento em que todos saíram e logo após, resolvemos no retirar também. Aceno para a professora que retribui com um sorriso e saio.

Com amor, Romeu.Onde histórias criam vida. Descubra agora