Nunca fugirei

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Depois de alguns ônibus, chegamos a um mirante quase nos arredores da cidade. Eu não diria que a viagem foi realmente desconfortável, mesmo quando ficamos em silêncio o tempo todo, não soltei a mão dela em nenhum momento, lembrei-me da segurança que me dava segurá-la e não queria deixá-la ir. Agora, estamos sentadas em um banco que mostra de frente toda a paisagem de Madri, cada uma com as mãos nas pernas, estamos só olhando para frente sem dizer nada, há um ar de incerteza em geral, mas ainda não o torna desconfortável.

Eu olho a cidade e começo a pensar em todas as coisas que aconteceram e que nos trouxeram aqui. Viro-me para Cris e consigo ver como há lágrimas caindo de seus olhos, meu coração dói só de ver e paro de lutar contra o fato de que preciso fazer algo para que ela deixe de ficar triste. Pego a mão dela e a aperto delicadamente, faço isso algumas vezes até que ela se vira para me olhar.

"Olá."

Cris solta uma pequena risada e me dá um breve sorriso.

"Olá."

Sua voz é baixa e rouca, cansada. Assim que ela termina de falar, seu sorriso cai e seus olhos se enchem de lágrimas novamente.

"Vem, Cris."

Eu a puxo em minha direção e ela não põe resistência, acomoda a cabeça entre meu pescoço e meu ombro e eu me acomodo para poder colocar os dois braços em volta dela. A princípio, suas mãos estão entre nós, mas pouco a pouco ela começa a se mover para colocar os braços sob os meus e me abraçar pelos ombros. E assim ficamos por um longo tempo, às vezes Cris se acalma e às vezes chora novamente, a certa altura sinto suas emoções passarem por mim e, sem saber por que, começo a chorar também, naquele momento Cris me segura com mais força e eu sinto sua respiração de maneira que eu começo a sincronizar com a dela.

Cris se levanta da posição dela e me olha diretamente nos olhos, percebo como eles parecem mais claros do que eu os vejo há vários dias. Ela olha para mim e seus olhos me lembram de algo, como um sonho, um pedido de desculpas, um beijo, um sorriso e os olhos azuis de Cris me olhando alegremente além das lágrimas.

"Sinto muito."

Ela parece confusa por um segundo.

"O que? O que exatamente eu tenho que te perdoar?"

Eu levanto meus ombros e inclino a cabeça levemente.

"Por fazer você chorar."

Limpo uma lágrima dela com o polegar e pressiono os lábios, percebo que não a beijo há dias e quanto preciso disso.

"Bem, se não é sua culpa."

"Vamos, Cris. Se eu não tivesse ido embora como fiz, você não se sentiria tão mal."

Cris olha para baixo e pega minha mão, fazendo círculos no dorso com o polegar.

"Esta semana é o aniversário do dia em que você-"

Ela para e suspira.

"O que eu quero dizer é que eu teria chorado de qualquer maneira."

Olho para baixo e vejo o polegar de Cris fazendo círculos na minha mão, concentro-me no movimento, no sentimento, em como parece que meus batimentos cardíacos mantêm o mesmo ritmo que o movimento circular. Viro minha mão e a levanto para que minha palma esteja aberta na frente de Cris, ela imita o movimento e entrelaçamos os dedos, olhamos para as mãos unidas e sorrimos.

"Senti sua falta, Cris. Pode não ter passado muitos dias, mas foram muitos pra mim."

"Você não precisa me dizer, eu sei."

Segurando FumaçaOnde histórias criam vida. Descubra agora