Capítulo 2

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— Tudo bem, eu topo.

Ela diz, encostada no umbral da porta, seu tom é tão denso e decidido que quase soa pesaroso, Shouto fica tão chocado que quase se esquece que era exatamente o que queria ouvir dela, talvez porque seja inesperado, afinal, dada a forma como Uraraka vem agindo perto dele, ele tinha certeza que ela não ia aceitar sua proposta.

Amigos com benefícios.

Ele talvez tenha ouvido esse termo em algum momento, já que não lhe era completamente estranho, deve ter sido no vestiário da agência, mas Shouto deve ter guardado na cabeça com uma definição completamente diferente, porque quando os paramédicos lhe entregaram o papel que precariamente protegia as vias respiratórias de sua colega e garantiram que ela estava segura, ele leu o papel e não pôde evitar de se sentir preocupado. "Benefícios"? Que tipo de benefícios? Será que Uraraka estaria com problemas financeiros e listou os possíveis conhecidos que poderiam emprestar-lhe dinheiro? Por que ele não estava na lista, então? Shouto ficaria contente em ajudar, daria qualquer quantia sem perguntar nada e nunca mais falaria no assunto, ela provavelmente traria isso à tona e insistiria que lhe pagaria um dia, mas por parte dele, nunca haveria dívida nenhuma. Eles são amigos, afinal.

Ou não são? Talvez não muito próximos, mas ele acredita que sim, existe um certo conforto em saber que será parceiro de patrulha dela, em almoçar com ela, e às vezes Shouto se pega querendo perguntar a opinião da Uraraka sobre os mais diversos assuntos, e se ele não o fez, foi por... bom, não há nenhum motivo em específico, ele acha, só nunca houve uma oportunidade. Mas o híbrido lhe considera sua amiga, uma das mais próximas.

Então ele não entendeu porque não constava em uma lista de amigos a quem ela poderia recorrer caso estivesse com problemas, o mais estranho disso é que, no papel todo amassado e manchado de algo que tinha um cheiro forte de álcool, havia pessoas elencadas sem nomes. "Vizinho de cima" e "barista sorridente" estavam ali, e Shouto achou estranho ela não saber os nomes dos amigos para quem havia cogitado pedir dinheiro. A não ser que... não fosse nada disso.

Tudo fez mais sentido quando Shouto pesquisou na internet. Bom, não fez tanto sentido assim, ele ainda não entende porque não consta na lista, muitos nomes aqui seriam escolhas equivocadas, a começar pelos homens cujos nomes ela nem sabe, como poderia garantir que são confiáveis? Os outros só são ideias ruins mesmo. O Yoarashi? Não se atrai por mulheres, e mesmo se se atraísse... não, apenas não. O Shinsou? Não saberia lidar com a Uraraka por muito tempo, talvez até a magoasse, mesmo que não intencionalmente. Há outros nomes de heróis aqui, mas Shouto nem entende porque ela os considerou uma opção quando... quando ele está aqui, sempre esteve.

Verdade seja dita que, assim como o Shinsou, ele não sabe lidar com ela de vez em quando, Uraraka é tão honesta quanto ele, mas de uma maneira mais doce, ela não deixa ninguém desconfortável, diferente dele. Mas ao mesmo tempo, Shouto é de longe quem melhor seguiria o conceito de "amigo com benefícios" e melhor se encaixa nos requisitos necessários que leu serem importantes nessa relação: conversaria com ela sobre o que quer e o que está disposto a oferecer, jamais lhe cobraria por atenção ou se acharia no direito de ditar a ela o que quer que fosse, seria discreto e não contaria para ninguém e teria sempre muita sinceridade, inclusive para informar à ela que gostaria de terminar, caso achasse necessário.

Surpreendeu-lhe que Uraraka não tenha levado nada disso em consideração, ela é tão intuitiva e observadora, parece conhecê-lo tão bem na forma que sempre sabe o que dizer para deixá-lo à vontade, ela teria percebido que ele é a opção ideal.

Ou talvez não, foi ele questioná-la sobre isso que percebeu que talvez possa magoá-la com mais facilidade que o Shinsou. Ela parecia mortificada com a pergunta, é bem verdade que ele planejou não ser tão direto, Shouto teve uma semana inteira para pensar em como abordá-la, ele queria ter feito antes, mas achou inapropriado já que ela estava se recuperando. A ideia era só devolver o papel, mas então ela o convidou para um café, e ele tomou como um sinal para agir, sentindo que Uraraka tentaria enterrar o assunto e fingir que aquela lista nunca existiu.

Pretensamente simplesOnde histórias criam vida. Descubra agora