Capítulo 8

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— Eu estou apaixonada, Shouto.

Não que ele seja a pessoa com o maior domínio sobre o assunto, mas quando uma pessoa tem um momento catártico de perceber que está apaixonada por alguém, o mais comum seria anunciar o fato com um brilho nos olhos e um rubor nas bochechas, evidenciando sua vergonha em assumir algo tão íntimo e... provavelmente bom e especial.

Mas a Fuyumi faz soar como se tivesse acabado de se dar conta que esqueceu as roupas no varal em um dia intensamente chuvoso, ela repete "eu estou apaixonada" e o encara, suspirando de um modo que faz parecer que está se livrando de um grande peso, mas seus olhos ainda transmitem um sentimento que corre nessa família junto do sangue: culpa.

Shouto não é bom em ler emoções, a não ser em pessoas cujas expressões já indicam muito do que estão sentindo, como o Midoriya e a Uraraka, mas dessa vez, fica fácil de interpretar porque é um sentimento do qual ele partilha. E no momento, a culpa dança por sua cabeça.

Talvez não "culpa" mesmo, mas as sensações que tal sentimento provoca. Aquele desconforto no estômago sempre que se recorda de onde pode ter errado, a ansiedade em pensar o que poderia ter feito de diferente, a incerteza e a angústia cada vez em que pega o celular e abre a conversa com a Uraraka, relendo a última mensagem dela. Dá pra ouvir a voz sempre animada e energética de sua amiga com benefícios, e Shouto escreveu o princípio de um pedido de desculpas diversas vezes, travando na hora de dizer pelo quê, exatamente, está se desculpando.

Por ter mudado seu comportamento um pouco antes de ela partir para a missão? Ele nem havia percebido a tal mudança se ela não tivesse apontado, então não foi proposital, fora que é meio como Shouto sempre é. Por ter dito que não há espaço para drama no tipo de acordo que eles têm? Mas é verdade. Ou por ter finalizado rápido demais e não tê-la feito gozar? Ele lamenta por isso, mas não acha que Uraraka gostaria de receber uma mensagem com ele se desculpando por isso. Então... Shouto quer se desculpar, mas não sabe pelo quê, ele está se sentindo mal e culpado, mas não consegue apontar o porquê.

Tudo que ele sabe é que, sempre que se lembra dos olhos dela encarando-o, desejando, exigindo uma resposta, o híbrido se sente desconfortável, muito, chega até a incomodá-lo fisicamente, em forma de um aperto nas entranhas. E tudo se mistura a uma curiosidade, uma necessidade de saber se está tudo bem com ela nessa missão, não há dúvida de que tudo dará certo, o Hawks soube escolher sua equipe, Shouto só quer saber como ela está se sentindo, Uraraka tem uma tendência boba de querer justificar tudo e se desculpar demais, sendo que não há necessidade disso, ele só quer ouvir dela que está tudo bem, independente do que "tudo" possa vir a significar.

Então esse tem sido Todoroki Shouto pelas últimas três semanas: frustrado, irritado com algo que ainda não conseguiu identificar, exausto cada vez que pensa nela e em tudo que gostaria de fazer quando Uraraka estiver de volta, e incomodado quando pensa que talvez não será capaz, pois... eles não estão nos melhores termos no momento, mesmo que não tenha havido uma briga de verdade. Ou talvez tenha, ele só fugiu dela. Patético.

Shouto se pega, então, naquela estranha sensação de quando tudo parece tão complexo que lhe causa vertigens. Uma sensação que não costumava existir até seu primeiro ano na U.A., onde conheceu pessoas que não só evitavam ficar em silêncio quando algo as incomodava, como também o incentivavam a fazer o mesmo. Pessoas como o Bakugou, que sempre vocalizaram sua raiva, ou como a Ashido e o Kaminari, que despejavam seu descontentamento de maneira que nem pareciam estar realmente tão frustrados assim, e como o Midoriya e a Uraraka que, diante de algo que percebiam não serem capazes de resolver sozinhos, encontravam ajuda e apoio um no outro. Shouto não é bom em expressar seus problemas, mas sente que sozinho poderá acabar piorando tudo quando for inevitavelmente falar com a manipuladora de gravidade, então ele meio que precisa falar sobre isso com alguém.

Pretensamente simplesOnde histórias criam vida. Descubra agora