Capitulo 4- A planta cura tudo

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Após uns dias no hospital, fui autorizado a vir pra casa continuar a medicação para diminuir a dor e aguardar pela viagem. Pelo menos vou poder jogar uns meses depois da operação, segundo o médico, então eu tive uma ideia. Mas já vamos chegar lá.

Aqui, como em outros bairros de Luanda, vizinho é como família, e todos quando souberam do que estava a se passar comigo, ajudaram com o que podiam. E segundo algumas tias do bairro, não era necessário eu viajar, bastava me darem a planta " cura tudo " e eu ficaria logo melhor.

- Mana viajar aí bem distante pra quê? nos países dos racistas? Vamos só lhe dar a planta cura tudo e ele vai ficar mbora* bom bem rápido, essas doenças dos brancos saem rápido - disse uma vizinha pra minha mãe.

Mas cá entre nós, se essa planta curasse mesmo tudo, em Angola já nem haveria coronavírus. Mas prontos. Todos os dias em casa vinham pessoas com suas teorias sobre o que eu tenho, umas mais engraçadas que as outras.

- Isso é fiticho* ( feitiço )  mana Fátima, esse miúdo assim bem saudável já apanha essas doenças de se operar? - disse uma das vizinhas.

- Ou é mesmo mal olhado. Eu já andava a desconfiar daquela vizinha daí a frente, ela olha muito mal as pessoas. Coitado do miúdo.  - disse a outra.

- Vê ainda se isso não é de família mana, na família do teu marido ninguém apanhou isso?

Essas não ficam só do FBI porquê? é cada coisa que elas insinuam.

Naquele momento triste e difícil que eu estava a passar, eu consegui ver quem são os meus de verdade e quem não são, percebi que quando estamos a passar por situações dessas muita gente nos dá as costas. Eram poucos os que foram pra o hospital me ver, e são poucos os que vêm pra minha casa me ver. Eu havia sido esquecido.

Mas não me abalei com isso, porque eu tinha o mais importante naquele momento: a família. A minha família esteve sempre aí comigo, de dia e de noite. Samuel fazia muitas campanhas pra ajudar a conseguirmos o dinheiro da passagem, ele me apresentou os seus amigos que estavam o ajudar nessas campanhas, Daniel e Stelio, eles pareciam ser fixes.

Meu pai fez um montão de dividas, e por um momento me passava na cabeça que era melhor eu morrer só já, só pra o meu pai não ter que fazer essas dividas todas, porque eu sabia que ele não tinha como pagar elas, meu pai era um simples camionista que fazia rotas inter-provinciais. Mas depois eu tirei isso da cabeça e vi que na mesma ele ia ter que fazer mesmo dividas pra os gastos do meu enterro.
E então me apareceu mais uma ideia. E vamos chegar nisso lá mais pra frente.

Minha mãe recebia ajuda da igreja e de pessoas próximas, e aos poucos nós estávamos a conseguir ter o dinheiro da passagem.

E então eu tive a conversa com os meus pais.

- Pai, mamã. Eu quero pedir desculpas por vos causar esses todos transtornos, eu não devia ir jogar mesmo sabendo que eu não estava bem.

- A culpa não é tua filho, tu não sabias - disse o meu pai.

- Eu quero recompensar-vos, eu sei da quantidade de dividas que vocês fizeram e eu quero ajudar a pagar elas, a Inglaterra é um país onde o futebol dá dinheiro, mesmo em clubes pequenos. E eu quero tentar a minha sorte lá. O médico disse-me que depois da operação eu posso voltar a jogar e então porque não tentar lá? e assim eu vou em busca do meu sonho de ser jogador e também de dinheiro pra pagar todas essas dívidas.

- Filho lá é um país complicado de se viver, tu não conheces a língua, o clima é muito frio lá.

- Mamã eu posso aprender, posso começar a estudar as coisas básicas enquanto espero a viagem e lá continuo a aprender com a prática, e quanto ao clima eu vou me habituar.

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