Capítulo 12

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As noites que se seguiram na mansão dos Winks foram igualmente infernais. E se por um lado Dara tinha o silêncio de Margot, também passara a ter a curiosidade atiçada por Philip todas as manhãs, com doses homeopáticas do falatório popular à cerca daquela mansão e o enigmático habitante da torre.

O astuto jovem, com o intuito de cativá-la, e assim ganhar-lhe a confiança, passou à entregar em domicílio produtos de sua quitanda. Um método eficiente de puxar assunto com a ruivinha que, embaixo dos imensos olhos azuis, passara a exibir também imensas olheiras: "herança" que recebera pelas noites mal dormidas.

— Obrigada, Philip, agradeço mesmo não vendo lógica no que faz. Então os Winks não te pagaram e mesmo assim você continua vendendo a eles, e agora ainda faz as entregas pessoalmente...? — questionou a moça, verdadeiramente intrigada.

Philip permaneceu mudo por um momento, relembrando a mãe à fazer-lhe o mesmo questionamento e a resposta que havia lhe dado: "Eu sei o que estou fazendo, mamãe. É para um bem maior. Quando nos livrarmos do domínio dos Winks, a senhora vai me agradecer, assim como todos nessa cidade. Serei o herói local!"

Ele respondeu, achando por bem ocultar as promessas de mundos e fundos que recebera do senhor Dramovic...

— Philip? Estou falando com você!

— Sim...? Desculpe.

— Por que faz isso? Por que traz tudo o que precisamos e sem cobrar nada?

— Não cobro porque eles não pagam apenas por enquanto, mas está tudo anotado na minha caderneta. — disse convicto, tocando a ponta do lápis que sempre carregava apoiado na orelha direita.

Não satisfeita com a resposta, ela insistiu:

— Não tem sentido. Por que faz isso?

— Por você. Não quero que lhe falte nada, mas sei o quão desagradável pode lhe resultar uma ida ao vilarejo.

— Desagradável é mesmo. Mas faz tudo isso por mim?

— Claro. Por que estranha tanto o fato de preocupar-me com você?

— Tirando o fato de eu não me lembrar desde quando nos tornamos amigos, há também a questão de que ninguém faz nada de graça, sobretudo se a gentileza parte de um homem para uma mulher. Temo decepcioná-lo e; assim como os Winks que não o pagam; também eu acabe não retribuindo-o a contento.

— Mas eu não estou lhe cobrando nada...

— Por enquanto.

— É sempre tão desconfiada?

— É sempre tão prestativo?

— Está bem, eu confesso... — suspirou o rapaz.

— Confessa, é? Confessa o quê? — aproximando-se mais do portão, curiosíssima.

— Tudo o que espero obter em troca é a sua companhia, a sua atenção. Gosto de conversar com você. É inteligente, e tão espontânea... Diferente de todas as garotas que já conheci. Não faz ideia do quão valiosos são para mim esses breves instantes em que me concede sua agradável presença.

— Hum... É só isso? — perguntou, com ar de desdém, fingindo não ter se impressionado com o que acabara de ouvir, o que o irritou.

— Acha pouco?!

— Desculpe, Philip, mas eu tenho que entrar. Já disse: os meus patrões não iriam gostar de me ver no portão falando com um estranho.

Isso o irritou um pouco mais:

— Garanto que os estranhos são eles! — agora ela afastava-se, em direção à casa, e ele subia o tom da voz — Não acha estranho que o jardim de uma mansão como essa esteja abandonado? Eu me pergunto: por onde andará o jardineiro? O que foi feito do pobre infeliz?...

Deixando esse questionamento no ar, ele também virou as costas, afastando-se do portão. Ao ouvir aquela insinuação, Dara olhou para trás, mas tudo o que pôde foi acompanhar enquanto Philip tomava o rumo do vilarejo.

                              *****
Durante o trajeto, que fazia sem pressa, Philip pensava sobre as palavras que dissera à Dará, em seu discurso improvisado. "Se tivesse ensaiado, não teria me saído melhor." Mas o que o que o afligia fora a espontaneidade com que externara aquelas palavras. Era como se realmente tivesse saído do âmago de seu ser, e se assim o fora, isso invertia a ordem das coisas de uma forma preocupante, afinal o combinado era ser ele a seduzir, não a ser seduzido. Sacudiu a cabeça na tentativa de afastar aqueles pensamentos inconvenientes de sua cabeça, mas tudo o que conseguiu com aquele gesto foi descabelar-se e derrubar o lápis no solo. Restou curvar-se para apanhar o lápis do solo e, após uma breve olhadela para trás, seguiu o seu rumo.

O Fantasma de Lockwood (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora