Capítulo 42

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Fosse por excesso de alegria, por pura ansiedade ou tristeza ou tristeza profunda pela saudade antecipada, o fato é que a noite fora mal dormida para todos na mansão dos Winks. Independente de tudo isso, o dia da partida nasceu na forma de uma manhã cinza e fria, típica de inverno.

Edgar descera logo cedo, mas não para o café. Optou por refugiar-se em seu escritório, recusando-se a fazer companhia à mesa para os seus próprios hóspedes. Uma situação um tanto quanto constrangedora.

Pela segunda vez naquela manhã Margot adentrava o cômodo em que seu patrão estava sem que ele escutasse suas batidas anteriores à porta. A cozinheira torcia para que, dessa vez, ele ouvisse pelo menos os seus conselhos:

— Senhor Winks, vim avisá-lo que eles já terminaram a refeição e estão realmente de partida. Dara, inclusive, já se despediu de mim e do meu irmão.

De costas para a empregada e de frente para a janela de vitral que dava para o jardim, Edgar não moveu-se um centímetro da cadeira que ocupava, limitando-se à proferir uma pergunta sem relevância:

— Acha que conseguiu convencê-los de minha indisposição?

— Creio que não. Eles são todos muito inteligentes, devem ter percebido o meu desconforto ao mentir. Pior: devem estar achando que não passa de uma má vontade do senhor.

— Não, você sabe muito bem que não é isso, e nem precisou mentir exatamente... Eu não sou o único no mundo a não gostar de despedidas.

— Sabemos muito bem que não se trata apenas disso, não é mesmo, senhor Winks?

A inesperada ousadia da sempre tão contida funcionária fez com que o patrão se voltasse para ela pela primeira vez:

— O que está querendo insinuar, Margot?

— O senhor vai me perdoar, senhor Winks, mas até então eu achava que o senhor a amava.

— E não acha mais?

— Para deixar que ela parta assim, não.

— Aí é que você se engana: o amor muitas vezes exige sacrifícios. É justamente por amá-la demais que eu devo deixá-la partir, para que, ao menos ela, possa ser feliz. — Voltando-se novamente para o vitral multicolorido da janela, para tentar esconder de Margot a emoção que lhe tomava enquanto prosseguia:

— Eu fiz de tudo o que estava ao meu alcance para que ela fosse feliz. Contratei o melhor detetive para poder dar à Dara o presente que ela mais queria: saber do seu passado, da própria origem, encontrar algum parente vivo... Eu não posso agora estragar tudo, se eu já sabia que seria assim. Dara é jovem e vivaz, como poderia prendê-la a mim? Olhe todo esse aço nas minhas pernas! — esmurrando parte da engrenagem na altura de sua coxa direita — Não posso mantê-la nesse lugar esquecido pelo resto do mundo! Creia-me, será melhor assim e, com o tempo, eu ficarei bem.

Extenuado pelo desabafo, viu a empregada aproximar-se e pôr-se à afrouxar os ferrolhos da janela, decidida:

— O senhor é quem sabe se vai querer continuar se iludindo com um colorido falso ou encarar que essa é a manhã fria e cinza que pode ficar ainda mais triste quando dessa cadeira o senhor vir a carruagem partir, levando Dara, talvez para nunca mais voltar. Se perdoará sabendo que não fez nada para evitar? — a cozinheira escancarou de vez a janela, e uma lufada gélida adentrou o ambiente ao mesmo tempo que esta deixava-o.

Margot havia dado o seu recado. O desfecho cabia a Edgar.

O Fantasma de Lockwood (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora