Baby ❀

235 22 3
                                    

"A minha mãe começou a ter que dormir comigo porque quando dormia sozinho eram no máximo três ou quatro horas, o que não dava para sustentar um dia inteiro de aulas. Mas ela também começou a ficar cansada, dia e noite a ouvir-me chorar e chamar pelo nome dele e por ela enquanto dormia, mesmo quando ela também tinha que lidar com a sua própria dor estava a matá-la aos poucos."

 Foi quando decidi abandonar a universidade e falei com o Luke. Já eramos amigos há tantos anos e eu conhecia-o como a palma da minha mão, sabia que não me ia deixar ficar mal, por isso pedi-lhe para ficar uns tempos no apartamento dele e ele fez ainda melhor. Ofereceu-me um lugar para viver com ele. 

Desse modo tirei um peso das costas da minha mãe e pude sofrer sem que ela o visse e sofresse mais. Aos poucos fui-me recompondo disso mas até a melhor das pessoas se cansa quando não vê os outros colaborar. Foi isso que aconteceu comigo e com o Luke. Ele esteve quase a expulsar-me do apartamento porque eu estava literalmente enterrado na merda e não saia para trabalhar de modo que ele tinha que pagar todas as contas, incluindo o aluguer do apartamento. Foi quando surgiram os outros rapazes. Aos poucos, e um de cada vez, eles foram-se juntado a nós e decidiram não me expulsar, o que eu agradeço até hoje.

"Foi por isso que choraste enquanto sonhavas e chamavas "mamã"?" - passei a mão pela sua face, com algumas lágrimas ainda a escorrer.

"Sonhei com uma dessas noites em que ela teve que me embalar até eu adormecer. Ela passou uns maus bocados comigo, o Christian sempre foi muito mais apegado a ela que ao meu pai por isso sofreu menos. Não que não tenha sofrido também, afinal era pai dele. Acho que foi a partir daí que a nossa relação se foi deteriorando. Ele tinha ciumes porque a nossa mãe me dava mais atenção e passava a maior parte do tempo comigo. As discussões tornaram-se mais frequentes o que chateava profundamente a nossa mãe, por isso ela começou a chegar a casa cada vez mais tarde. Esse foi outro dos fatores que me levou a sair de casa."

"E o que aconteceu depois?" - por essa altura os nossos dedos já estava entrelaçados ao passo que nos inclinávamos mais e mais para perto um do outro.

"Quando saí ela decidiu vender a casa e comprar uma mais pequena. Com o tempo o Christian também arranjou uma casa com o Crawford, que ele chama de irmão, apesar de não serem irmão de sangue. Acho que o Chris o preferia ter como irmão que a mim..."

"Não digas isso Ash, não-" - fui interrompida.

"Não digas que não é verdade Daisy, porque eu sei que é. Enfim, não é algo que me incomode porque ele só se tem tornado uma pedra no sapato ao longo dos anos." - revirei os olhos para as suas palavras o que o fez rir.

"Tu também não és fácil com ele." - argumentei.

"De qualquer maneira, um dia ela chegou-nos com a noticia de que se ia casar novamente e apresentou-nos o Greg. Ele é um bom homem, de uma nacionalidade da qual eu nunca tinha ouvido falar, mas tudo bem." - riu.

"Qual é a nacionalidade dele?"

"Luso-Australiana." - fiquei surpresa. Então o Greg também era metade português, metade australiano, assim como eu. - "O ponto é que ele tentou com muita vontade substituir o meu pai e isso acabou por me afastar dele e aproximá-lo do Chris, onde encontrou um aliado dentro da família. A relação deles enoja-me. O Christian é um traidor."

Revirei os olhos mais uma vez. 

"Ele não é um traidor Ash, apenas seguiu em frente e aceitou o novo marido da tua mãe, lutando por criar um bom ambiente. Isso não quer dizer que ele tenha esquecido o teu pai ou o tenha substituído pelo Greg."

"Isso não é algo que me importe. Já passaram tantos anos desde que tudo aconteceu, acho que estamos demasiado habituados a conviver assim para o fazermos de outra maneira."

"Apesar de tudo Ash, acho que devias terminar o curso de Administração antes de entrares de cabeça no de Psicologia. Afinal, era o sonho do teu pai que o fizesses e tu gostavas do curso certo?" - ele assentiu. - "Só te falta um ano e é um curso com tanto futuro. Podes fazer essa pequena homenagem ao teu pai enquanto crias algo novo para o teu futuro e segues em frente da dor do passado."

Naquele momento e apesar de toda a nossa conversa profunda ele parecia mais atraente que nunca, com a lua a bater em metade da sua cara, iluminando os seus olhos verdes e os lábios avermelhados, por isso, quando ele disse para me sentar no seu colo nem cheguei a questionar nada. Sentei-me com uma perna de cada lado das suas. Estávamos tão perto que podia sentir a sua respiração por toda a minha cara.

"Acho que preciso de um abraço para ficar mais confiante quanto a essa decisão." - sorriu de lado, pondo a mão no fundo das minhas costas ao que eu me aproximava mais para abraçá-lo. - "Obrigada por me ouvires, bebé." 

Suspirei com o apelido, não conseguindo decidir se me agradava ou não. Quando me afastei, a pressão da sua mão nas minhas costas manteve-me perigosamente perto e não me consegui aguentar mais. Encarei os seus lábios onde a língua dele tinha passado à segundos atrás e fui invadida pelo enorme desejo de o beijar. Ele parecia sentir o mesmo porque no momento seguinte tinha a outra mão na minha bochecha, acariciando-a de leve e trazendo-me para mais perto.

Começou com um singelo encostar de lábios, tão leve que mal podia ser sentido, e então fizemos mais pressão, iniciando um beijo doce à luz do luar.

Não foi nada extremamente intenso, não houveram línguas a lutar por espaço, pelo contrário, foi calmo e controlado, o que era o total oposto da minha relação com Ashton, mas ainda me fez sentir um milhão de borboletas no estômago e deixou aquele gostinho por mais.

Deixei um ultimo beijo na sua bochecha e voltei para o meu lugar no banco de passageiro esperando que ele me levasse para casa.

Só muito mais tarde, a altas horas da madrugada, enquanto estava deitada de costas para Ashton, com todas aquelas almofadas entre nós e os cobertores diferentes a cobrir cada corpo é que me lembrei do beijo com Mason e o comparei com o do Ashton.

O beijo que tive com Mason era muito mais adequado para descrever a minha relação com o Ashton: rápida, fogosa e intensa, ao passo que o meu beijo com o Ash descrevia na perfeição a minha relação com Mason: plácida, calma mas com um gostinho de quero mais.

Apesar das diferenças, não podia desejar um melhor primeiro beijo com Ashton, acho que mostrou o seu lado escondido, aquele que quase ninguém vê e que o torna um cachorrinho com olhos grandes a quem todos queremos pegar e levar para casa para cuidar. 

Se me perguntarem se eu trocaria a calma daquele momento por um intenso como aconteceu com Mason a reposta seria não porque eu sabia que com Ashton podia ter muito dos dois e nunca me cansaria, o que, com toda a certeza não acontecia com Mason.

Adormeci só por volta das três da manhã e, nessa noite, sonhei com lábios cor de cereja e um menino sozinho numa sala, com os olhos inchados e vermelhos de tanto chorar, um cobertor preso fortemente pela sua mão, enquanto berrava o nome do seu pai.

De manhã quando acordei descobri que tinha estado a chorar enquanto dormia, e que a minha cara estava pressionada no peito desnudo de Ashton que ainda dormir profundamente, com um raio de luz a atravessar as cortinas e a fazer uma linha diagonal iluminando parte do seu rosto e destacando as suas pequenas imperfeições. 

***************************************************************************************

ThinkingOutLoud69 

Secrets of Past (A.I)❀Onde histórias criam vida. Descubra agora