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ALEX leu o documento inteiro mais uma vez e seu olhar em chamas se direcionou 
para o rosto sombrio de Louise.
— Memorial Gabrielle Alcolar... Louise, que significa isso?
— É...
Tentou responder por duas vezes. Sua voz falhou em ambas.
Mas não foi preciso formular uma resposta. O raciocínio rápido e penetrante de 
Alex organizou as informações no documento e já chegara a uma conclusão.
—  Gabrielle Alcolar. Você estava grávida? Deu à luz uma criança? Minha filha?
Louise  conseguiu  apenas  inclinar  a  cabeça,  acenando  que  sim,  de  modo 
desconsolado.
— Você não se dignou a me contar? Em me deixar conhecer... —  Ela não viveu tempo suficiente para ser conhecida por ninguém! — explodiu 
Louise, com lágrimas rolando pela face. — Ela nasceu prematura, assim como morreu 
prematuramente. Não chegou a viver nem um dia...
— Ah, Louise!
De  repente  ela  estava  em  seus  braços,  a  cabeça  reclinada  no  ombro  dele,  as 
lágrimas molhando a camisa de Alex.
Ele a acolheu. E a deixou chorar, murmurando suavemente palavras de conforto 
em espanhol, como se a emoção do momento o fizesse esquecer o inglês.
Só quando os soluços dela diminuíram e ela deu um profundo suspiro, é que ele 
tocou  em  seu  queixo  e  levantou­lhe  o  rosto,  para  que  os  olhos  castanhos  dela 
encontrassem os seus e neles surpreendessem o brilho das lágrimas ali contidas.
— Esse Memorial... a mansão... era para isso que você queria a mansão.
Arfando de modo nada elegante, Louise encontrou uma forma de concordar. — Eu queria um lugar onde as mães que perderam seus filhos pudessem ficar. 
Um lugar onde tivessem um tempo para se recuperar, convalescer. Quando Gabrielle 
morreu,  passei  horas  andando  pelo  campo  ou  isolada  lendo  na  biblioteca. Acho  que 
isso salvou minha vida. Eu queria que outras pessoas tivessem a mesma chance que 
eu tive.
— Compreendo.
Algo na voz dele destoou. Ele estava lendo o outro documento, e ela sabia que 
era a certidão de nascimento de Gabrielle.
— Você compreende, era muito importante para mim.
— Ah, sim.
Ele  não  conseguia  desviar  a  atenção  das  palavras  no  papel  que  segurava. 
Gabrielle  Louise  Browning.  Nascida  em  9  de  maio.  Gabrielle  Browning.  Quando 
registraram o nascimento de sua filha não lhe deram o seu nome.
— Agora compreendo como a mansão era importante para você.
Louise  percebeu  que  o  tinha  perdido  de  alguma  forma.  O  corpo  alto  e  esguio 
estava contraído em rejeição, afastando­se rigidamente dela.
Lá fora, o som de um carro anunciou a chegada dos primeiros convidados. Alex 
aproveitou a desculpa para se retirar. —  Minha familia chegou. Vou descer para recebê­los. Leve o tempo que quiser, 
desça quando estiver pronta.
Louise  já  começara  a  esboçar  um  sorriso  de  agradecimento  pela  gentileza 
quando foi surpreendida pelo que ele disse em seguida. — Não  se preocupe  com o que  vão pensar  sobre a  sua presença. Vou dizer a 
eles que é apenas uma visita rápida, que amanhã mesmo estará de volta à Inglaterra.
Não se tratava de uma sugestão de desculpa, mas de uma ordem, compreendeu 
ela atordoada, enquanto ele saía e fechava a porta. Ele deixou claro que deveria partir 
no  dia  seguinte.  Pelo  visto,  era  o  afastamento  permanente  de  sua  vida...  e  ela  não 
sabia o motivo.
ENQUANTO  OS dois observavam o  carro da família de Alex afastando­se da  casa, Louise  sentiu que  seu  coração  se  contraía. Se antes ficara angustiada ao pensar no 
encontro com eles, agora desejava que permanecessem mais tempo.
Será que Alex cumpriria sua ameaça e a mandaria para casa? Desejaria ele se 
livrar dela em tão pouco tempo?
O homem ao seu lado estava agora silencioso e reservado. Sentiu que deveria ter 
a iniciativa de retomar o assunto. —  Gostei  muito  de  sua  família —  disse  hesitante. — Seus  irmãos  se  parecem 
muito com você. Logo se percebe que têm o mesmo pai.
Tanto  Joaquin  quanto  Ramon  Alcolar  eram  altos,  morenos  e  atraentes  como  o 
irmão. Entretanto, nenhum deles provocava nela o efeito que ele sim produzia.
— E Mercedes...
A expressão carregada de Alex se amenizou ao ouvir o nome da irmã.
— Mercedes é uma tagarela — disse ele. — Nunca sabe quando calar a boca.
— É fácil gostar dela.
Louise  esperava  que  sua  voz  não  demonstrasse  o  constrangimento  que  sentia. 
Ficara  sozinha  com  Mercedes  por  algum  tempo,  e  esta  havia  lhe  dito  algo  que  a 
perturbara e que era difícil de acreditar.
— Então... devo começar a fazer as malas?
Era uma pergunta, mas também um desafio. Alex não respondeu.
— Se vou partir amanhã, devia... Mas, Alex, eu não quero ir embora!
Diante disso, Alex reagiu. Estavam entrando na cozinha quando ele se virou. Por 
um breve momento deixou perceber um olhar transtornado que logo foi substituído pela 
aparência impassível. Ela sentiu que o abalara.
Imediatamente ele se recompôs.
— Por que não? — perguntou friamente.
Louise  avaliou  que  ele  não  demonstrara  frieza  suficiente.  Claro  que  o  atingira. 
Esse fato, combinado ao que lhe dissera Mercedes, fez com que ela se sentisse mais 
determinada: não ia desistir sem lutar.
— Não posso lhe dizer... ainda. Não antes de você me responder uma pergunta.
Lá estava de novo, um vestígio de incerteza que ela, sensível a tudo o que dizia 
respeito a ele, percebeu imediatamente.
— Louise, isso importa? — Acho que sim. Pode ser a pergunta mais importante que já fiz em toda a minha 
vida.
Agora realmente ela captara toda a atenção de Alex. Os olhos cinzentos a fitavam 
atentamente, vigilantes. — Então, pergunte — disse bruscamente.

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