"À medida em que os flocos de neve se acumulavam nas velhas vidraças encardidas, o silvo do vento tornou-se mais audível e o frio ainda mais intenso. A impressão que eu tinha, era que os uivos incessantes da ventania queriam me dizer alguma coisa, mas o quê?
No auge da solidão, minhas únicas companhias naquele início de madrugada foram o choro e o frio, que insistia em passar pelas frestas da cabana no alto da colina que eu conseguira ocupar. Até quando eu iria sofrer? Até quando eu continuaria à mercê de minha própria sorte?
Tremendo dos pés à cabeça, com a face lavada pelas lágrimas e com as pontas dos dedos dormentes, não me restou alternativa a não ser colocar os cobertores por cima da cabeça para me livrar dos gemidos do vento. A tentativa de me aquecer, todavia, não surtiu efeito e eu continuei submerso no gelo e na angústia que tomava conta de meu coração.
Cansado de viver em circunstâncias tão precárias, fechei os olhos e por um instante, apenas por um instante, cogitei a possibilidade de desistir da vida e de deitar nos braços convidativos da morte. Como seria morrer? Será que iria doer? Será que aquele maldito sofrimento ficaria esquecido com a passagem para o outro mundo?
Mas então o lindo rostinho dele invadiu minha mente e me obrigou a mudar drasticamente de planos. Não, eu não podia morrer. Eu precisava viver, viver para ter a chance de explicar para meu paulista metido a carioca os motivos que me levaram a abandoná-lo no Brasil.".
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Marcas do Passado: Segredos do Coração - (EM DEGUSTAÇÃO)
RomansaSe durante a infância Mateus Barcelos era considerado dócil, carismático e deveras inteligente, a partir da adolescência seus rótulos mudaram para inconsequente, rebelde e mal-educado. Escravo de futilidades e dono de um temperamento por vezes gross...