~. Capítulo 2 .~

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"Alguém sabe me explicar de onde vem a sinceridade das crianças?

Mateus Barcelos.".

MATEUS

Vovô não respondeu de imediato. Olhando fixamente para mim, ele vincou a testa e cruzou os braços, ao passo em que colocou um sorriso bondoso na face enrugada. Eu tinha certeza que ele estava zangado, mas não sabia dizer se eu era o causador do sentimento.

— É impressão minha, ou o mocinho andou ouvindo atrás da porta? — perguntou Seu Ulisses, a mão descendo até meu pescoço. — Responda, meu filho.

— Desculpa — abaixei a cabeça.

— É feio ouvir atrás da porta — disse o velhinho, erguendo o meu queixo e me obrigando a olhar para ele. — Promete que não vai mais fazer isso?

— Tá, prometo — balancei a cabeça afirmativamente. — Tá bravo comigo, Vô?

— Eu? Bravo com você? Jamais! — rindo, Seu Ulisses fez cócegas em meu pescoço. — Você é um anjo, um anjinho lindo! Por que eu ficaria bravo com você?

— Você é o melhor vô do mundo — deitei a cabeça no peito remendado do cara.

— E você, o menino mais amado do universo — com os olhos marejados, ele acariciou meus cabelos. — Não quero que você ligue para as bobagens que seu pai diz, tá bom? Combinado?

— Combinado, vô!

— Já que eu não posso brincar com você, por que você não vai até a casa do Yuri? — sugeriu Seu Ulisses, a voz demonstrando cansaço. — Que foi? Por que você ficou com esse biquinho lindo?

— Yuri tá muito falso! — exclamei, sentindo raiva em meu coração. — Você acredita que ele não me convidou para comprar o uniforme da escola? Tô chateado, cara!

— Deus amado, como eu amo esse menino — vovô gargalhou, depois, passou a mão pelo tórax. — E quando você vai comprar o uniforme da escola?

— Mamãe falou que a gente vai amanhã — respondi. — Tô tão ansioso!

— Elisa não vai à faculdade amanhã? — ele estranhou.

— É claro que não, né, vô? Amanhã é sábado! — balancei a cabeça negativamente. — Tá ficando esquecido, é, velhinho?

— Desculpe, não tá mais aqui quem falou — ele voltou a rir. — Pestinha lindo! O vô te ama, meu filho.

— Hum... — puxei o ar com força pelo nariz. — Cidinha fez bolo! E parece ser de chocolate!

— Ei, para onde o senhor vai? — quis saber Seu Ulisses. — Volte aqui, nós estamos conversando!

— Eu vou comer bolo, né? — parando de correr, coloquei a cabeça dentro do quarto dele. — Você pode esperar, a minha fome, não. Tchau!

POUCAS HORAS MAIS TARDE

Eu estava entediado, muito entediado. Fazia pelo menos 20 minutos que papai e eu estávamos sentados nos bancos duros e desconfortáveis do postinho de saúde, esperando alguém nos chamar para tomar vacina. Eu queria voltar para casa, queria brincar com meus amigos, assistir meus desenhos favoritos. Se a gente demorasse a voltar, eu iria perder as aventuras do "Popeye".

Mexendo as pernas para frente e para trás, arrisquei olhar para o rosto de papai. Papai parecia tão assustado, tão angustiado! Eu, no lugar dele, sentiria vergonha de ter medo de agulhas, mas preferi guardar a minha opinião para mim, pelo menos naquele momento. Para ele sei que não puxei, pois nunca tive medo de tomar injeção. Tenho tanto orgulho disso!

Marcas do Passado: Segredos do Coração - (EM DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora