Capítulo 4

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Há dois meses estamos nessa, sem previsão nenhuma, sem certeza nenhuma, o mundo está estranho, mais do que o normal, hoje acordei vidrado nesse pensamentos, não me sinto muito bem.

Pelo lado bom, hoje é terça-feira, ou seja, dia de consulta com a Stela, a terceira aliás. Não documentei ou mencionei a segunda pois não teve nada de especial, eu só contei mais da minha vida, especialmente dentro da internet, e disso vocês já sabem, não toda história mas o suficiente. Ah, e conheci a cachorrinha da Stela, Miley, sim, tipo Miley Cyrus, ela tem uma paixão secreta pela Hannah Montana, bem esquisito.

Enfim, hoje acordei totalmente desanimado, mas as quatro da tarde, isso vai mudar. E não, eu não tô gostando da Stela, quer dizer, no sentido romântico, juro que tô me controlando pra não gostar dela assim, mas tá difícil.

Bom, chega desse conflito interno, por mais que eu não queira, tenho que levantar da cama e fazer algo da vida.

- Acabou o toddy - João abre a porta do meu quarto e me mostra o pote de achocolatado vazio.

- Que maravilha, o dia tá sendo ótimo.

- Mas já tá estressado, Pedro? Você acabou de acordar, sonhou com o quê?

- Sonhei que eu jantava você na porrada, não enche - Me levanto da cama com dificuldade.

- Olha mano, já chega. Quem você pensa que é pra falar assim? - Ele chega mais perto, parece bravo.

- Quê? Do que você tá falando?

- Tá insuportável conviver com você, eu tava tentando relevar todos esse dias, mas porra, você é um escroto o tempo todo, eu nem te reconheço mais!

- João, você tá exagerando.

- Não, eu não tô. Eu sei que você tá com a cabeça cheia, mas isso não te dá o direito de ser um filho da puta.

- Filho da puta? Você enlouqueceu? E tudo que eu já fiz por você? Esqueceu? Seu ingrato do caralho!

- Não joga isso na minha cara, já provei muitas vezes que sou grato, e tô provando agora, tô falando isso pro seu bem, você trata todo mundo mal ultimamente, até nossos pais.

- Nossos pais? Como assim?

- A mãe ligou ontem e você foi horrível com ela, eu nem acreditei na forma que você tratou ela.

- Mano, vocês são muito sensíveis...

- Sensíveis? Somos realistas! Não tá dando mais pra aguentar, eu juro que tentei mas...

- Ah, não tá dando pra me aguentar? Então vaza daqui, caralho!

- Pedro...

- Vai embora então mano, a mãe não tá toda chateadinha também?Volta pra casa dela pra falar mal de mim, vocês adoram fazer isso!

- É sério que você quer estar certo ainda? Jura?

- Se eu tô certo ou não, não me importa, quero que se foda. Já que tá tão insuportável conviver comigo, volta pra casa dos nossos pais.

- Eu vou, mas só um conselho, se continuar orgulhoso assim, vai acabar sozinho, como sempre acaba. Amanhã eu volto pra pegar minhas coisas.

E sem olhar pra trás, João vai embora. Sinceramente, queria entender o que acabou de acontecer aqui.

Insuportável de conviver? Escroto? É sério? Eu não acredito que ele, meu próprio irmão disse isso. Qual é, eu não sou tão horrível assim, pelo menos eu não era.

Mas aqui estou, sozinho de novo, aliás, eu e meu orgulho, apenas isso.

Eu nunca admito que estou errado, e por isso eu acabo perdendo tudo.

O dia passa, nada produtivo, única coisa que eu fiz hoje foi almoçar e tomar banho, nada de gravar vídeo, nada de fazer live, pura procrastinação.

Pensei que receberia alguma ligação da minha mãe, me dando bronca, mas nem isso, talvez eles devem ter desistido de mim de vez, e eu entendo. Eu poderia ligar, me desculpar, dar razão ao meu irmão e pedir que ele volte pra casa, mas eu não consigo, meu orgulho me vence em todos os conflitos da minha vida, eu odeio isso.

Por enquanto, não consigo ser maior que meu ego, então vou fazer o que sempre faço, ignorar e deixar acontecer. Meu irmão tá certo mais uma vez, eu sou um escroto.

Finalmente, alguma coisa boa no dia está prestes a acontecer, minha consulta, então vamos lá.

- Boa tarde, Pedro. - Ela me atende com um sorriso muito simpático.

- Boa tarde, Stela, como você tá?

- Estou bem, e você? Não parece bem.

- Ah, não é nada.

- Qual é, eu sou sua terapeuta, meu dever é fazer perguntas e o seu é responder, agora me diga mocinho, o que houve?

- Tive uma briga com o meu irmão, das feias.

- Nossa, eu sinto muito, quer falar sobre isso?

- Eu não sei.. não sei nem o que pensar sobre isso, mas sei que estou errado.

- Como sabe disso?

- Ele disse que sou um escroto, que sou insuportável de conviver, e ele tá certo. Mas e você, acha isso também?

- Bom...

- Nossa, esquece, nos conhecemos há duas semanas por chamada de vídeo, não tem como você responder isso.

- É, não tem mesmo, mas quero descobrir mais de você, se eu puder.

- Você pode, mas assim, não queria que soubesse muito, não quero que você vá embora também, você é uma garota muito legal, nem sei se conseguiria ser minha amiga.

- Eu já sou sua amiga, e gosto muito das terças-feiras, são os dias que eu conheço mais um pouco de você, e tem sido ótimo.

- Obrigado Stela, você é demais, mas não precisa ser tão gentil assim, sei que não sou o que você descreveu.

- Se você não é o que eu descrevi, o que você é?

- Um moleque orgulhoso e egoísta, como eu te disse no dia que nos conhecemos, você tá perdendo tempo aqui comigo, você é incrível, e merece trabalhar com alguém mais decente.

- Ok, chega de se menosprezar assim, é torturante. Eu não consigo ver nenhuma dessas características em você, pra ser sincera, eu não consigo ver nada, você não me permite, só me fala da sua vida na internet, eu só conheço o Tio Orochi que todos conhecem, eu preciso conhecer mais de você pra poder te ajudar, por favor.

- E se eu te afastar? E se você me conhecer e me deixar como todos fazem?

- Eu não vou te deixar...

- É muito fácil falar.

- Eu vou cumprir, te dou minha palavra, nós temos um compromisso, você é meu paciente.

- É só isso que eu sou pra você, né? Um paciente.

- Eu não quis dizer isso...

- Não, tudo bem, é melhor que eu seja só isso pra você, pro seu bem.

- Pedro, não diz isso...

- Tá tudo bem, sério, esquece isso. Podemos parar por aqui? Tô meio indisposto.

- Claro, nos vemos terça que vem? - Ela diz isso com desapontamento na voz e nos olhos.

- Sim, até - Após isso, encerro a ligação.

O que tá acontecendo comigo? Será que eu consigo viver sem estragar uma parte boa da minha vida?

Mais perguntas sem respostas, parece um ciclo sem fim.

Love in Quarentine - OrochiOnde histórias criam vida. Descubra agora