Capítulo 1

45 2 2
                                    

  Saímos para o corredor, os saltos fazendo barulho ao se chocarem com o chão de mármore.

  Passo a mão pela franja, incomodada com os fios que ficam entrando no meu olho, amanhã provavelmente estaremos aqui novamente e eu vou provar mais cinquenta apliques de modelos diferentes, estou realmente surpresa com a quantidade de tipos de franja existentes.

  Desconfio que estão apenas repassando os apliques vez após outra, seria perfeitamente possível eu não me dar conta já que não prestei atenção em nenhuma das provas realmente.

  Mas acho completamente coerente levando-se em consideração a quantidade de coisas com as quais tenho que lidar no momento. Em como minha cabeça vive um turbilhão da hora que acordo até quando vou dormir e as até mesmo durante o sono.

  Já perdi as contas de quantas vezes acordei durante a noite e achei que uma ida a sacada me ajudaria a colocar as coisas no lugar, sempre voltava para a cama com os pensamentos acelerados do mesmo modo e as bochechas mais geladas que o resto do corpo por conta do ar frio da noite.

  Está tudo muito confuso ainda, mas tento começar com as coisas mais simples toda manhã, parece ser mais fácil de lidar com o turbilhão de informações, ou com a falta delas, dessa forma.

  Já fazem duas semanas que estamos no palácio e uma que estou enrolando para escolher meu maldito novo corte de cabelo. Nunca achei que perderia tanto tempo com uma coisa tão idiota.

  Ainda não tive contato com ninguém da corte, a Rainha Alice e os poucos conselheiros com os quais tive o prazer de me encontrar me dizem que é para que tenha oportunidade de lidar com todos os acontecimentos recentes sem ser importunada por perguntas e pelo assédio da corte, mas eu desconfio que eles só não querem ter de explicar o porquê de a princesa parecer uma maluca que fica o tempo todo distraída com a mobília e as paredes.

  Não que eu esteja realmente prestando atenção nesses itens, se estivesse decoraria pontos de referência dentro desse labirinto e pararia de me perder dentro do que dizem ser minha própria casa. É só que fica mais fácil me perder em devaneios quando tenho um ponto fixo para onde olhar, isso faz com que o tempo passe mais rápido.

  Aqui é tão ridiculamente grande que não sei como alguém tem a audácia de se referir a isso como uma casa apenas, mas os franceses parecem não ver problemas em dizer isso por aqui.

  É muito silencioso também, posso ouvir apenas algumas portas se fechando quando alguém precisa ir de um outro a cômodo, ou os passos, daqueles que devem ser os conselheiros da Rainha. Isso as vezes me assusta, é estranho viver em um lugar carregado de passado, com retratos de pessoas que já passaram dessa pra melhor e ouvir passos ecoando ao mesmo tempo, não tenho medo de fantasmas mas a sensação é estranha, nada boa.

  Além disso eu cresci em um orfanato, cheio de outras crianças e consequentemente barulho em todos os momentos, mesmo quando não devia haver, sendo assim o silêncio absoluto me é estranho.

  Deixo todos os pensamentos e perguntas fluírem. Tudo que sei até agora passando em retrospectiva em minha mente.

  Em suma é isso: Meu nome, descobri recentemente, não é Elizabeth Willows apenas-nome-e-sobrenome como eu imaginava, mas sim Charlotte Elizabeth Mary Daiana Grace Marie d' Valois, ou seja, muitos-nomes-e-sobrenomes-de-rainha-e-disnatias-mortas-ou-não-tão-mortas-assim. O que nos leva ao segundo fato: Eu faço parte de uma dinastia, a monarquia está tão em alta por aqui quanto os jeans rasgados em 2016.

  O que nos leva ao último fato ao qual tenho acesso: não estamos mais no século XXI, nunca estivemos.

                                                                                           ***

EncontradaOnde histórias criam vida. Descubra agora