JIMIN
Eu senti doer enquanto cuidava da dor de Taehyung. Senti pela primeira vez como se deixasse um vaso de vidro escorregar de meus dedos e espatifar no chão, reduzindo-o à migalhas brilhantes. Ouvir Taehyung narrar o que tinha acontecido entre ele e Hoseok só reforçou minha culpa do que havia acontecido entre eu e Jungkook: não dei a devida atenção ao que era importante para ele. Minhas inseguranças eram realmente maiores que meus sentimentos?
Três toques suaves na porta fizeram com que nos sentássemos e Taehyung abriu a porta para que a mãe entrasse com uma bandeja contendo duas canecas cheias de chocolate quente – uma receita misteriosa de família que levava canela e parecia fazer sumir as tristezas. O clima estava ameno pela chuva que se aproximava, mas não estava frio a ponto de aquilo ser um gesto para nos esquentarmos. Era mais um conforto doce para espantar a amargura dos corações e ambos sorrimos pela gentileza, beijando-a como agradecimento. Cobrimos as canecas com as mãos, uma escrita "Soul" e a outra "Mate". Tínhamos réplicas dessas em minha casa e como duas crianças, recusávamos a usar outra coisa quando passávamos o dia juntos. Tia Minhae acariciou nossos cabelos ao sentar na cama entre nós dois, observando o chocolate nos acalmar.
– Eu posso ajudar em algo? – ela perguntou, preocupada em ver nossas expressões tão cabisbaixas. Taehyung sorriu pequeno e se aconchegou nos braços dela.
– Já melhorou muito com isso – ergueu a caneca e ela sorriu antes de beijar seus fios. Mas eu continuei calado.
Observei os dedos dela nos cabelos do meu primo, entrando em transe enquanto me perdia em pensamentos. Ela nos deu colo enquanto o chocolate entorpecia nossos corações tumultuosos, os braços maternos emprestados em silêncio. Eu gostava do conforto que passava, mesmo sem saber o que nos dizer, ela mostrava que estava ali. Beijando nossas testas, tia Minhae recolheu as canecas vazias e nos deixou um pouco mais tranquilos do que estávamos antes de ela entrar no quarto.
– Tae – chamei e ele percebeu minha apreensão em continuar, o que não era muito comum entre nós dois. Ele esperou com curiosidade para que eu enfim completasse – Como é ser bissexual assumido?
Taehyung arregalou os olhos, não era como se eu não estivesse ao lado dele quando se assumiu ou como se fosse nossa primeira conversa sobre o assunto. Mas ele me conhecia bem demais para entender que aquilo era um sinal de que eu estava cogitando, que queria saber os sentimentos mais profundos que vinham atrelados a isso antes de eu mesmo senti-los. Ele recostou na cabeceira e eu ao lado dele.
– Nesse país, nesse mundo? Nunca é fácil, Jimin – ele disse e mesmo sério, parecia passar tranquilidade na conversa como se não quisesse que eu sentisse medo – Eu perdi pessoas que achei serem minhas amigas, perdi até parte da minha família. Sabe que nossos avós não conversam muito comigo – assenti e desviei o olhar dele. Era meio doloroso pensar que alguém de dentro da nossa família nos rejeitaria por sermos quem somos – Mas eu também ganhei pessoas de confiança ao meu lado, mamãe e titia nunca me abandonaram. Não vou dizer que é o sonho de qualquer garoto receber olhares atravessados e ter oportunidades negadas só por não negar quem sou – ele sorriu triste das lembranças antes de olhar para mim – Mas sabe o que era ainda pior que isso? – neguei – Viver com medo de mim mesmo.
Eu engoli em seco e ele esticou os braços, me oferecendo um colo que eu aceitei.
– Eu não tinha paz antes de assumir para mim mesmo que gostava de meninos e meninas. Em casa ou na escola, não importava. Tudo parecia uma prisão, eu não me sentia seguro, não me sentia eu mesmo – ele continuou, a respiração fazia minha cabeça mexer vez ou outra por estar deitado em seu peito – Quando eu me assumi, eu sabia que também estava assumindo riscos. Mas para mim, nada se comparava a sensação de liberdade. Todos os não's que ganhei, os olhares preconceituosos, eu não me importava com nenhum deles. Sabe porquê? – ele olhou para baixo e eu ergui meu semblante, encontrando seu sorriso doce tão parecido com o da titia – Porque eu me aceitava do jeito que eu era, Chim. E a opinião de ninguém conseguia ser mais forte que isso.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Secret Love Song | jikook
FanficAos dezesseis anos somos feitos de poucas certezas e uma das únicas de Park Jimin é de que ele não gosta de meninas. Depois de uma reação exagerada de seu pai ao descobrir a bissexualidade de seu primo, Jimin decide viver sua descoberta em segredo...