Folhas Brancas

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Luke - Outubro de 2018

Dawn e eu estamos na varanda de cima, sentados em espreguiçadeiras ao sol. Ela está com um caderno apoiado nas pernas, as costas no encosto da espreguiçadeira, enquanto ela bate com a ponta da caneta preta na bochecha direita. Por alguns segundos, Dawn fecha os olhos. A luz dourada do sol da tarde toca sua pele, fazendo com que ela pareça sintilante. Dawn está vestindo um macacão branco de alças finas. A pele dos seus braços e pernas estão expostos. Sob esta luz, tudo me lembra da última vez... A última vez em que estivemos juntos

Afasto os pensamentos. Eu tenho uma namorada. 

Dawn e eu viemos para a varanda, juntos, para tentar escrever alguma coisa. Começamos a missão de escrever alguma música, mas impus a condição de que ela me deixasse fazê-la parecer um ser humano saudável novamente. Agora, pegamos sol com frequência e ficamos algum tempo do lado de fora de casa, no quintal ou na varanda, mesmo que ela esteja trabalhando. Dawn tem trabalhado muito, e eu me ocupo fazendo outras coisas enquanto ela está trabalhando com traduções. Faço comida para nós dois (quando não tenho preguiça e peço delivery). 

Hoje, no entanto, ela decidiu tirar um dia afastada das traduções para fazer música. Dawn disse que tinha uma ideia ou outra para algumas letras, mas não sei o que aconteceu com suas ideias desde que viemos para cá. Ela está alternando entre encarar as folhas em branco do caderno, bater com a caneta contra a bochecha e fechar os olhos para pensar. 

Eu estou observando ela. Talvez se eu pensasse em alguma coisa, poderia mostrar a ela e então trabalhar em conjunto. Mas tudo que me ocorre parece tão... Inapropriado. Não no sentido sexual, mas estou enterrando todos os versos que pipocam na minha mente para o mais fundo que consigo. Sentar na varanda e escrever com a Dawn está fazendo meu cérebro se permitir a escrever sobre a Dawn. 

Não posso mais escrever sobre ela. Quer dizer, todas as músicas do último álbum que escrevi eram sobre ela, ou sobre como pensar nela estava arruinando meu relacionamento com Arzaylea. Não posso ter um novo álbum cheio de músicas falando sobre ela de novo. Principalmente porque agora eu tenho uma namorada com quem eu não gostaria de arruinar as coisas. 

Não que as coisas não estejam em ruínas. Estou confortavelmente me acostumando a ignorar meus problemas com Sierra que crescem a cada dia, como erva-daninha se enfiando em tudo. Sierra está em NY há algum tempo agora, e não nos vemos desde que eu saí em turnê, mais de dois meses atrás. Nós temos tentado muita coisa. Porra, nós tentamos até sexo virtual. Tudo. Mas quando Sierra liga, sei que ela não está feliz com isso. Estou me concentrando tanto na insatisfação dela para ignorar que não estou feliz também. 

É tão irritante como estamos todos sempre em páginas diferentes. Dawn, Ashton, Sierra, Arzaylea, eu. É uma dança das cadeiras descoordenadas. Eu gosto de Dawn, Dawn não quer gostar de mim. Dawn gosta de mim, eu ferro com tudo. Arzaylea gosta de mim, eu amo a Dawn, que por sua vez, quer Ashton. Ashton quer a Dawn, depois quer a KayKay. Eu amo a Dawn, mas gosto de Sierra. Dawn me ama, mas não me quer. Então eu fico com Sierra, e acho que talvez eu a amo. Mas tudo sempre termina na Dawn, e como nós nunca gostamos um do outro da mesma maneira. 

Até mesmo agora que estabelecemos essa nossa estranha amizade. Eu a amo, ela me ama, mas não da mesma maneira. 

Dawn finalmente abre os olhos, e faz anotações apressadas no caderno em seu colo. Eu fico observando enquanto ela escreve, o barulho da caneta riscando a folha. Ela escreve sem nenhuma pausa por algum tempo, depois para e contempla a folha. Ela não parece satisfeita, no entanto. Dawn encara as palavras que acabou de escrever com certa insatisfação. Não. Com vergonha. 

— Alguma ideia? — pergunto apenas por perguntar, porque é óbvio que ela pensou em alguma coisa e escreveu. 

— Eu achei que sim, mas é um monte de bobagem — ela fecha o caderno e coloca na espreguiçadeira, do lado esquerdo do seu corpo, longe de mim. — E você? 

Olho para meu próprio colo, onde meu próprio caderno está aberto e repousado, com um lápis marcando a página. Encaro-a, e minha mente fica repetindo. Nunca nos amamos do jeito certo. Nunca da mesma maneira. Anoto as cinco palavras no meio da página, com uma caligrafia preguiçosa. 

Not in the same way, escrevo. Viro o caderno para Dawn e ela lê a frase ali. 

— O que isso quer dizer? — ela pergunta, porque um verso não faz música.

— Não sei — minto. — Acho que é sobre duas pessoas que nunca estão na mesma página. 

Dawn me olha, e parece estar prestes a dizer alguma coisa, mas um barulho a interrompe. Demoro para identificar, mas é o celular dela tocando. Dawn levanta da espreguiçadeira, apenas para descobrir que estava sentada em cima do celular. Ela pega o aparelho e olha para mim. 

— April — diz, antes de atender a chamada. 

Sento-me ereto, prestando atenção nas expressões e moviementos de Dawn. Faz algum tempo que sua irmã não entra em contato, desde que elas foram visitar o túmulo de Hana, mãe de April, e Dawn contou sobre serem irmãs. A garota pediu que se afastassem por um tempo, enquanto pensava em toda história. Aparentemente, April finalmente está pronta para uma conversa. 

— Ei — Dawn diz. Pausa. — É, faz um tempo. 

Pausa. 

— Eu posso ir até aí, se quiser. Ou... — Dawn espera pela resposta. — Certo, você só precisa me mandar o endereço. Estarei lá em algumas horas. 

Dawn desliga o telefone e volta a olhar para mim. 

— O que ela disse? — pergunto. 

— Nada — Dawn dá de ombros. — Ela me pediu para encontrar com ela num café, lá em Santa Barbara. Disse que quer conversar. 

— E você vai? — já sei a resposta. 

— Eu não tenho muita opção, tenho? — arqueia as sobrancelhas. — Estive esperando por esse momento, preciso encarar. 

— Eu posso te levar — proponho. 

— Luke, eu preciso ter esse momento com April, a sós. Bom, provavelmente num Starbucks cheio de gente, mas você entendeu. 

— Eu sei — aproximo-me dela. Seguro seus pulsos com suavidade, tentando fazê-la relaxar com o contato. — Não preciso estar com vocês lá. Eu dirijo, você entra e fica esperando. Mais ou menos o que Sam fez no seu primeiro encontro com seu pai. Só alguém para se certificar de que você vai estar bem. E para dirigir de volta se você não estiver. 

Dawn revira os olhos, mas um sorriso suave toma conta dos seus lábios. 

— Às vezes eu esqueço que você consegue ser um amigo legal quando quer — ela resmunga. 

— De nada. 

— É sério — Dawn afasta seus braços das minhas mãos e dá um passo para longe. — Você tem feito muita coisa por mim esse ano. Eu não faço ideia de como vou retribuir todos esses favores, sinceramente. 

— Dawn! — avanço dois passos para perto dela. — Eu não estou fazendo coisas legais esperando que você retribua. 

— Eu sei, mas é irritante. Você é irritante. 

— Acho que irritante não é a palavra que você queria usar, não é? — dou um sorriso zombeteiro para ela. 

— Pelo amor de Deus, Luke Hemmings — ela se afasta, andando em direção a porta da varanda. — Por favor, se arrume rápido. Temos uma longa viagem até Santa Barbara.


Daylight || Luke HemmingsOnde histórias criam vida. Descubra agora