Quero ver você dizer que sua vida é ruim depois que ouvir sobre a minha. Triste é a vida de um menino sozinho, ansioso, antisocial, chato, tímido e acima de tudo,
Órfão.
Aí você pergunta:
"Mas Raoz, o que tem de tão ruim em ser órfão?"
Realmente, quando a pessoa é assim "desde que nasceu" e por isso não teve tempo de criar nenhum tipo de vínculo emocional com seus pais, não faz tanta diferença viver com ou sem eles. Obviamente, né?
Para a gente, é normal.
Tudo bem que rola uma curiosidade sobre o passado, ou um sentimento de inferioridade quando se vive rodeado por pessoas com famílias completas, mas nada que force em uma vida totalmente sem graça ou cercada por tristeza.A maior diferença é que, pessoas que vivem em um orfanato, assim como eu, têm família só de irmãos que, inclusive, podem ir embora. Isso fora as nossas tutoras (Que na verdade também podem ser homens, mas é MUITO raro), que, dependendo, podem ser assimiladas ou àquelas tias inconvenientes que querem saber sobre tudo na sua vida, ou, quando é uma pessoa boa (o que acontece uma vez em um milhão), podemos compará-las às mães, carinhosas, amorosas e cuidadosas.
Esse último caso não faz parte da minha vida. Mas no Bonheur, minha casa, a nossa sorte é que possuímos um tutor homem (o único que já conheci) que se chama Johan.
Ele ama crianças e, pelo fato de também ser órfão, decidiu seguir a profissão por vontade e não por falta de opção, o que é se admirar. Acho que este é o principal motivo de ele ser tão bom, "Quando a gente faz o que ama, não importa se o salário é pequeno" é o que ele diz.Johan é meu único amigo no Bonheur, já que sou a criança mais velha, com meus quatorze anos. O fato é que, quando a gente é mais velho, não vê tanta graça em conversas com mini-pessoas de 9 ou 10 anos. Não que eu seja tãaaaao mais velho assim, mas não quero discutir entre cartolina verde ou azul para fazer o trabalho do colégio.
Pensando nisso tudo, eu que estava sentado no pé da minha cama olhando para a janela que dava bem em frente, resolvi ir dormir. Já era quase uma da manhã, e Paris, à esta hora, faz jus ao título de terceira cidade mais iluminada do mundo.
Nossa casa é relativamente longe da famosa torre, tanto que daqui do quarto, mesmo que seja no terceiro andar, só conseguimos ver o topo da mesma. E a sorte é minha, de ter a cama, janela e torre perfeitamente alinhadas.
Levantei do chão e olhei em volta. 27 camas, e uma delas era a que eu dormia, a única que ainda permanecia com os edredons intactos.
Sabia que por volta de três horas Johan inspecionava o quarto, para ter certeza de que nenhum dos meninos estivesse acordado aprontando algo. E quando digo "algum dos meninos", quero dizer eu, o único que os tutores (quatro no total: Lucy, Isabel, Aurélie e Johan) se preocupavam, e o único que ficava acordado até de madrugada.
Olhei ao redor, o quarto é bem grande, as camas são divididas em três linhas horizontais,e por se tratar de um lugar pobre e carente, os poucos móveis são feitos de peças velhas de madeira.
O único espaço que cada um tem para guardar seus pertences é uma espécie de baú, que fica abaixo de cada cama como se fosse uma gaveta enorme. Os baús dos meninos com mais de 10 anos só podem ser abertos pelo dono, o que é bom para mim, já que eu posso esconder o que eu quiser lá e sei que ninguém vai encontrar, muito menos me dar uma bronca.
Maravilhoso!
O que ilumina bem pouco o quarto inteiro é a enorme janela, que sempre fica fechada por causa das frequentes chuvas. Mas, o vidro é bem grande e contínuo, o que me deixava mais lisonjeado por conseguir enxergar grande parte da cidade daqui.
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Um passo
Short StoryVocê acredita em magia? Se pudesse usá-la em seu favor, Seja para o bem ou não, Como você usaria? Esse livro é um compilado de contos curtos, sobre pessoas distintas mas que de uma forma acabaram se interligando. Aposte na ideia, mergulhe de cabeç...