1999 - Percy
Naquele verão eu e Annabeth gravamos e regravamos nossas vozes por cima uma da outra inúmeras vezes. Lembro de passar horas sentado na escrivaninha do quarto, falando sobre as ondas da vista da minha janela, sobre as expectativas da faculdade ou sobre qualquer outra coisa que passava pela cabeça de um adolescente de 18 anos. Eu amava o mar, amava os animais. Sempre pensei em biologia marinha ou oceanografia.
Meu pai era um pescador. Honesto, humilde e o pai mais descolado dessa parte da cidade. Ele e minha mãe trabalhavam muito para dar tudo o que eu precisava. Eu era matriculado em uma escola particular, e morava em uma pequena vila de casas, onde conheci meu vizinho e melhor amigo, Luke Castellan.
Esse era o ano de formatura, e eu não via a hora de me livrar daquilo logo. Claro, nunca havia sido o melhor aluno, a dislexia não facilitava, mas eu e Luke nos mantínhamos na média, diferente de Annie, que sempre estava com as notas verdes que seu padrasto exigia.
A mãe dela havia morrido três anos atrás, e deixado a menina sob a guarda de seu padrasto. Um homem grande, gordo e com o cheiro encrostado bastante insistente, ele amedrontava todos que se aproximavam dele ou dela. Annabeth constantemente evitava o constrangimento dos amigos, e optava por não levar ninguém à casa.
Eu achava isso ruim, já que ela também não pôde sair comigo e Luke no verão, nem para ir tomar sorvete naquele calor escaldante. Mas bem, escutar a voz dela nas fitas que chegavam pelo carteiro era muito divertido. Parecia uma parte da Annabeth Chase perdida na dobra do tempo. Uma Annabeth que só o Percy tinha acesso.
E essa ideia me agradava.
Quando as aulas começaram, seu padrasto flexibilizava as regras, e ela podia chegar em casa um pouco tarde, quando inventávamos algum trabalho de mentirinha para perdemos tempo, jogados sob meu carpete ao som de Nirvana. Isso também me agradava.
Com o passar do ano, eu e a loirinha nos aproximamos em estatísticas maçantes. Luke vivia andando mais com outra turma, mesmo que os encontros no meu carpete após as aulas fossem sagrados. Annie estava em minha casa todos os cinco dias da semana que era permitida sua saída, e meus pais adoravam sua companhia, sempre dizendo que era uma garota muito gentil e estudiosa, mas eu via mais que isso naqueles olhos tempestuosos.
Vi hematomas na minha amiga. Eu observei-a sendo destruída por quem deveria protege-la. Ela me pediu que eu não contasse. Que eu não ajudasse. Mas era difícil vê-la todos os dias, por olhos de quem sabia que suas calças e blusas compridas em dias quentes, eram mais do que o estereótipo de nerd puritana.
— Espere, Percy. — Ela impediu que minha mão continuasse passando o álcool em sua ferida. — Está doendo.
O seu padrasto nunca batia em cantos muito visíveis de seu corpo. Desta vez o sangramento vinha de suas costelas, causado de um cinto de couro e muita bebedeira.
— Não tem muito o que ser feito se não limparmos isso, Annie. — Quando estava perto dela minha voz saía bem mais gentil e meiga do que eu costumava pronunciar.
Ela respirou fundo, aceitando o fato que a dor não passaria. Sendo pelo álcool ou pela negligência à ferida, doeria da mesma forma.
— Tudo o que eu mais gostaria no mundo seria passar numa faculdade bem longe de casa. — Ela soltou em desabafo.
Pensei em dizer que fugir não resolveria, que eu não gostaria que ela fosse embora ou brincar dizendo que as fitas demorariam mais tempo para chegar.
Mas nada disse, apenas voltei a passar o algodão encharcado em suas costas.
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Adoraria Dizer Que Tudo Vai Dar Certo Para Nós
Любовные романыUm amor encerrado pela ambição adolescente. Percy seguiu bem sua vida após Annabeth Chase deixá-la. Não ótimo, nem maravilhoso, apenas bem. Sem desconfiar que uma brecha no destino dos dois, traria à tona a única oportunidade de tê-la de volta.