Amor e distância

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- Mamãe ainda compra esses curativos de flor, sabia? – Sarada disse, risonha.

Assenti. Eu sabia bem, ela sempre andava com um em sua bolsa – que não tinha mais flores coladas, mas ainda era uma bagunça.

- Começou a nevar de novo – Sarada percebeu. A neve branca grudava no vidro da janela, atrapalhando a visão.

O relógio pendurado próximo à janela indicava que já tinha passado de meia noite. Estava tarde e nevando e até agora nada de Sakura. Eu estava começando a ficar preocupado.

- Talvez eu deva ir buscar sua mãe no hospital – sugeri.

Sarada deu de ombros, mas não parecia concordar comigo.

- Ela tem chegado bem tarde desde que começou a ajudar o novo médico. Esses dias, já ia amanhecer quando ela finalmente voltou para casa – explicou ela.

Suspirei, impaciente. Eu sabia que Sakura não corria risco quase algum sozinha, era talentosa, dedicada e uma ótima ninja. Mas era minha esposa e parte da pequena família que me restava. Eu continuaria me preocupando, mesmo tendo plena noção de que ela sabia se virar.

- Ela disse quanto tempo vai ficar ajudando esse médico novo? – Esforcei-me para soar casual.

- Não, mas acredito que uma semana ou duas.

Sarada deixou o álbum que segurava de lado, pegando outro e começando a folhear. Eu estava absorto em pensamentos, então fui pego de surpresa quando ela soltou:

- Você está com ciúmes?

Seu tom era irônico, mas impressionado. Sarada me encarava com um sorriso maldoso no rosto, esperando por qualquer expressão facial que demonstrasse ciúmes ou ressentimento. Meneei a cabeça, um pouco rápido e intensamente demais, sem convencê-la.

- Está com ciúmes da mamãe e do médico recém chegado?! – Ela queria que soasse como uma pergunta, mas era uma afirmação. – Não acredito.

Respirei fundo, evitando elevar minha voz ou fazer movimentos bruscos que indicassem que eu estava sem graça com a conclusão de Sarada. Na verdade, eu não tinha parado para pensar a fundo em como me sentia sobre o tal novo ninja. Mas sabia bem que confiava em minha esposa e isso bastava.

- Estou preocupado, só isso – Tentei encerrar o assunto, sem sucesso.

Sarada acreditou em mim, mas continuou puxando o fio dessa conversa.

- Então não sente ciúmes nunca?

Assenti.

- Nunquinha?

Assenti outra vez.

- Não é possível, papai! – Sarada jogou os braços para o alto, inconformada. – Você fica meses fora, nunca está em casa, mamãe está sempre sozinha. Está dizendo que você nunca se preocupou com voltar para casa e ela estar com outra pessoa? NUNCA?

Suspirei. Nunca era tempo demais. Sarada não ia desistir desse assunto e eu tinha me comprometido em conversar com ela sobre nossa família.

- Eu confio na sua mãe, Sarada, e sei que ela quer o melhor para a nossa família... – Ela me olhava atenta, esperando por uma continuação. – Sim, já senti ciúmes da sua mãe – admiti, finalmente. – E de você também.

Seus olhos se arregalaram, surpresos com minha revelação.

- De mim?

Assenti.

- Eu fico longe de vocês duas quando viajo. Eu me preocupo que você possa encontrar alguém que seja melhor no que eu faço.

Era desagradável falar sobre isso com Sarada. Eu não queria deixa-la inquieta ou pensando que não tinha o direito de ter carinho por outro adulto. Mas, ao mesmo tempo, era bom poder dizer o que eu sentia para minha filha. Ela estava certa: nos conhecíamos tão pouco. Precisávamos disso.

- Papai, ninguém vai ocupar o seu lugar. Nunca.

Sarada me lançou um olhar delicado ao dizer isso, piscando com seus longos cílios negros. Um momento de silêncio se abateu sobre nós, até que ela pigarreou e voltou a folhear um álbum de fotos.

- Esse médico novo... – começou ela, sem me olhar diretamente. – Nem é tão bonito assim. Não é o tipo da mamãe.

Soltei uma risada discreta.

- Qual é o tipo da sua mãe?

- Homens altos, de cabelos pretos, com sharingan e uma personalidade enigmática – respondeu ela, segurando uma risada.

Toquei o queixo com o indicador, fingindo pensar.

- Quem eu conheço que se encaixa nessa descrição? – brinquei, fazendo-a gargalhar.

Sarada secou as lágrimas que caíram de tanto rir e se ajustou, sentando mais perto de mim.

- Deve ser difícil ficar longe por tanto tempo – conjecturou ela.

Assenti, com um suspiro.

- Você sente muito a nossa falta?

- O tempo inteiro, querida.

Sarada passou a página do álbum que continha as fotos do dia de seu nascimento. Fotos de Sakura segurando-a no colo, suada e com as bochechas coradas, admirando nossa pequena recém-nascida.

- Quando você me conheceu? – perguntou Sarada.

Franzi o cenho, sem entender a pergunta.

- Você sabe, depois que eu nasci – explicou ela, deixando-me ainda mais confuso.

- Como?

Sarada passou as páginas, apontando para cada foto no livro.

- Não tem fotos suas no dia em que eu nasci – explicou ela, folheando o álbum novamente. – Você não estava.

Meu coração ficou mais gelado que o tempo lá fora. Minha filha realmente pensava isso?

- Sarada, eu jamais perderia o seu nascimento – argumentei, tocando seus cabelos.

- Mas as fotos... – Eu a interrompi.

- Não tem nenhuma foto no álbum porque... – Remexi meu bolso, tirando minha carteira. Abri-a, mostrando à Sarada uma foto nossa, no dia em que ela nascera. Eu a segurava em meus braços, enquanto Sakura sorria, observando o momento em que conheci minha filha.

Os olhos de Sarada se encheram de água. Ela tomou a foto em suas mãos, segurando-a como se fosse um diamante precioso.

- Eu carrego comigo para matar a saudade de vocês sempre que posso – expliquei.

- Não acredito que esse tempo todo eu achei que você não tinha chegado a tempo de me ver nascer – ela falou baixinho, mais para si que para mim mesma.

- Sua mãe nunca contou a história do dia em que você nasceu? – questionei, incrédulo. Era difícil de imaginar que Sakura nunca tivesse contado sobre esse dia tão importante.

Sarada secou o rosto, fungou e me devolveu a carteira.

- Ela me disse que foi improvisado e que você chegou correndo, mas nunca explicou direito o que isso queria dizer. Eu nunca te vi nas fotos e achei que... – ela deixou a frase morrer.

- Querida, é claro que eu estava lá – Segurei suas mãos, olhando em seus olhos marejados. – Eu que fiz o seu parto.

- O que? E mamãe nunca me contou isso?! – Seu tom de voz subiu, agitado.

- Vai ver ela estava esperando que eu mesmo contasse um dia – Dei de ombros.

Sarada me encarou, ansiosa e curiosa, esperando que eu o fizesse. Abri um sorriso, lembrando daquele dia.

- Eu estava em uma missão com Kakashi e faltavam duas semanas para voltarmos...

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