capítulo 3

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 Anna estava em um dilema terrível.

Embora estivesse convicta de sua decisão e soubesse que não tinha mais como voltar atrás uma vez que já tinha preenchido sua filha com esperanças, ela não sabia o quão difícil poderia ser falar sobre um assunto teoricamente enterrado há tantos anos. Tinha sido leviana também por achar que nada a respeito daquela história poderia abalar com seus sentimentos já bem resolvidos, mas remexendo em caixas antigas, vendo fotografias e lendo seus diários, finalmente entendeu o significado das palavras que dizem que reviver o passado é sofrer duas vezes.

Como iria contar para Lilly? Diria todos os detalhes desde o começo até o fim ou omitiria questões? Seria relevante para ela saber que a história dos pais tinha sido uma intensa história de amor ou ela só precisava saber que tinham se envolvido e que Anna tinha engravidado por inconsequência? Como ela reagiria ao saber que o pai que ela tanto queria conhecer era famoso e que possivelmente sua vida mudaria do dia para a noite já que milhares de outras pessoas ficariam interessadas em sua história dali em diante? Como proteger a privacidade de Lilly e a sua própria?

Por não saber como responder essas e outras diversas questões, Anna adotou uma postura reclusa nos dias que se seguiram ao aniversário de Lilly. Sabia que a filha se tornaria irredutível e que não esqueceria tão cedo a promessa e nem era esse o objetivo, Anna só queria ganhar mais tempo... Porque aparentemente dezoito anos não tinham sido o suficiente para adiar aquele momento. Pensando nisso, ela passou a sair para trabalhar no ateliê muito mais cedo do que o necessário e passou a chegar em casa quando Lilly já estava dormindo. Nos intervalos do trabalho gastava tempo para voltar passeando pela cidade tentando organizar como faria tudo.

- Volta para realidade, Anna, estou falando com você! - Jules chamou a atenção e Anna piscou longamente virando-se para a amiga.

- Desculpe, estava distraída.

- Você anda muito distraída ultimamente, nos últimos dois dias a sensação que eu tive foi de que você não ouviu uma só palavra do que eu disse.

Anna suspirou e revirou os olhos voltando-se para a mulher de feições orientais.

- Você disse que não aguenta mais a Rachel e que vai pedir a separação - Anna repetiu de um jeito extremamente resumido o que a amiga disse - Mas como eu já ouvi isso outras quinhentas vezes, sei que você só está chateada e que daqui alguns dias tudo vai estar perfeitamente normal.

Jules analisou Anna por alguns segundos antes de soltar um muxoxo.

- Odeio você por ter razão.

- Sabe, eu até queria que você desse alguns conselhos para Lilly, nesse aspecto não posso ajudar muito porque infelizmente vim ao mundo destinada a sofrer e ser heterossexual - Anna disse recolhendo os papéis da mesa e Jules estava rindo quando virou-se para ela com expressão severa - Mas você é desequilibrada demais para dar conselhos amorosos para minha filha!

- Anna eu admiro sua coragem de me chamar de desequilibrada - Jules disse em tom de brincadeira e depois suspirou ao cruzar os braços e olhar para a amiga com pesar - Você está bem?

Anna desviou o olhar e deixou seu foco na paisagem de Nova Iorque através da vidraça da sala.

- Eu não sei o que fazer, Jules. Quer dizer, sei, mas...

- Isso tem a ver com a história do pai da Lilly, não é? Que você resolveu contar?

Anna Black não tinha feito muitos amigos ao longo da sua infância e adolescência porque acreditava que não precisava de mais nada quando tinha Nick Kepner, que supria todas as suas necessidades no quesito amizade. Por isso, quando o único e melhor amigo morreu, ela se viu tão desamparada. Felizmente encontrou um pouco de paz e acolhimento ao chegar em Seattle quando conheceu os membros da Mookie Blaylock e fez não somente amizade com os rapazes como também encontrou um namorado que era também um confidente e bom amigo. Para além disso, também tinha feito amizade com Anthony Gibbs, um senhor ranzinza e rancoroso que tinha o triplo de sua idade... Mas nada de amigas.

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