As canecas na mesa

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As canecas estão na mesa de centro da sala. O cheiro de cigarro há tempos apagado e o café já gelado indicavam que o tempo passara, mas o cheiro de seu perfume ainda estava naquela camiseta que ele usava.

Era para já estar limpo, mas os fantasmas do passado não haviam sido exorcizados até aquele momento.

Machucados não cicatrizados, odores de prazer que traziam à memória tempos melhores. 

Ele não conseguia compreender a ideia de finais e de abandonos. Sumiços. Mas era aquilo que acontecera na sua história de vida.

Levantar da cama era difícil, pois teria que atravessar a sala e ver aquela última cena novamente, vez por vez. Tomar banho naquele banheiro em que seus dedos conheceram o corpo daquele que se foi.

Custava também a suspirar, pois tinha medo de que, respirando fundo, encontrasse aquele perfume mais uma vez.

Suas lágrimas já não caiam mais, pois o vazio lhes tomara o lugar. Celular desligado desde que acabara a bateria dias atrás. As forças que lhe restavam era para levantar e beber água. 

Tudo na geladeira lembrava dias de farinhas ao ar, panquecas doces, jantares de tapioca e pizzas. Comer era difícil.

Quando seria também seu último suspiro? Quando viria a ceifadora e findaria sua dor?

A porta bateu pela quarta vez e a voz dele ecoou. Não poderia ser, seu corpo já estava sepultado.

Ele conseguiu ouvir os passos irem embora novamente.

Os fantasmas. Eles vinham e voltavam.

Os fantasmas ficavam.

Quantos deles existiam e por que eles tinham o rosto daquele a quem amou?

A mesa estava com as canecas e as bitucas de cigarro. Como uma arte que paralisou o tempo naquele dia.

O dia em que ambos morreram.

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⏰ Última atualização: Sep 06, 2020 ⏰

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