1 | Como? (Segunda-feira)

696 69 35
                                    


As noites são sempre as mesmas para Wanna. Ela fica ouvindo aqueles zumbidos que ela costuma chamar de "música" pelos fones de ouvido enquanto olha para os pés na beira da calçada. Sentar debaixo da árvore depois da aula para esperar o seu pai é um tipo de terapia para ela. Tem uma coisa esquisita em sua mente no momento que ela está ouvindo mais um daqueles zumbidos. Ela começa a pensar sobre as coisas. Nenhuma coisa em especial. Só nas coisas. Nas mesmas coisas que têm tentado evitar.

Ela gosta de pensar. Pensar é um dos seus passatempos favoritos. Quando alguém tenta cortá-la nesse ato, ela sempre costuma ficar desconcertada.

— Oi — foi o que Ondy fez. Ele a tirou dos pensamentos sobre as coisas.

— Oi — ela pareceu meio confusa para aquele garoto que invadiu seu momento de terapia. Tirou os fones, mas deixou que a música tocasse, pensando que a companhia inesperada logo iria embora.

— Posso sentar aqui? — ele meio que choramingou. Estava fazendo barulhos esquisitos com a garganta, como estivesse prestes a isso.

Wayne, ou Wanna — como seu melhor amigo a chamava — fez careta por causa dos barulhos nojentos.

— Posso te contar por que estou prestes a chorar? — ele a olhou devagar enquanto se organizava na mureta pintada de vermelho que cerca a grande árvore. Ele se inclina para trás, para que suas costas descansem na árvore, ficando perto demais de Wayne.

Como já estava tarde da noite — já que eles estudavam no período noturno —, Wayne mal conseguia ver o rosto do garoto. Ela não estava o reconhecendo, nem sequer achava tê-lo visto alguma vez.

— Conte-me — ela pediu um pouco interessada. Não era fofoqueira, mas sempre foi a primeira a perguntar "tudo bem?" quando via alguém chorar.

— A minha melhor amiga e eu tivemos uma briga feia. Acho que ela nunca mais irá querer falar comigo... — seu suspiro de frustração fez com que Wayne sentisse pena dele.

— Ah cara, eu e meu melhor amigo também não estamos em um bom momento. Nós tivemos uma briga sobre comida — ela quis mostrar a ele que entendia do assunto.

— Vocês são tipo melhores amigos desde quando? — Ondy era viciado em gírias, mas sua melhor amiga nunca usara, dizendo sempre "gíria é coisa de moleque".

Ver aquela garota fofa, de sapatilha bege e cabelo bagunçado dizer cara, foi com certeza impressionante.

— A gente não se fala há uns três dias, mas nos conhecemos tem cinco anos. E vocês? — Perguntou Ondy.

— Dois anos. E não nos falamos faz duas semanas — realmente a situação dela parecia pior.

— Véi , você está encrencada. Acho que ele nunca mais vai falar com você — Ondy foi sincero e falou a primeira coisa que veio em mente. — Olhe, é o carro do seu pai — ele apontou com o queixo o final da rua.

Wayne virou naquela direção e confirmou com a cabeça. Realmente era o carro do pai. Ficou até impressionada por ele saber.

— Acho que tenho que ir — ela se levantou.

Ele fez o mesmo e direcionou um sorriso a ela. Não parecia que estava prestes a chorar. Nem parecia que tinha estado prestes a isso.

— Espero que faça as pazes com seu melhor amigo — o garoto deu um passo pra trás.

— Espero que faça as pazes com sua melhor amiga — Wayne colocou um pouco da franja atrás da orelha quando seu pai estacionou ao lado.

— Até mais, Wanna — Ondy acenou quando ela entrou no carro.

O pai não fez perguntas. Wayne só ficou um pouco incomodada. O seu melhor amigo era o único que podia chamá-la assim.

Quando colocou os fones novamente, a música que tocava era religiosa . Ela se perguntou se seu melhor amigo já tinha pensado sobre Deus.

Os MelhoresOnde histórias criam vida. Descubra agora