Quando acordou no dia seguinte percebeu que o ventilador estava agora desligado, os raios de sol entravam pela janela iluminando o pequeno sofá e seu corpo, se sentou ainda com a visão embaçada e esticou os braços sentindo as dores em suas costas, consequência de ter dormido no sofá. O chão abaixo de seus pés parecia quente e depois de um tempo percebeu que o tempo ainda estava abafado, ficou observando os poucos móveis da sala por um tempo. A velha poltrona amarela outrora de seu pai agora sem um dono fixo, a pequena estando cheia de livros e gibis da antiga era que os irmão achavam e traziam para casa, o porta retrato do papai.
Tudo ali tinha um motivo, tudo fazia Ikel se sentir segura e protegida, sabia que seus pais haviam trabalhado muito para que tivessem cada uma dessas coisas. As vezes ficava naquela mesma posição tentando imaginar como seria se as coisas fossem diferentes, se tivessem nascidos com mais dinheiro. Talvez o chão da casa não rangesse tanto, haveria mais janelas para a luz entrar, as meninas não dividiriam o quarto, ela provavelmente não precisaria roubar e Kass teria outro destino, um que ela pudesse escolher.
Não sabia ao certo o que estava sentindo, mas a raiva que antes havia sentido pela irmã deu lugar a uma raiva muito maior, raiva do estado e de seus reis. Raiva dessa lei ridícula criada para controlar a taxa de natalidade e impedir que as pessoas chegassem a pobreza total. Raiva de toda a desigualdade que isto criava, os ricos não perdiam nada mas como sempre os pobres perdiam tudo. Odiava tudo aquilo, odiava os reis, odiava o reino e até mesmo seu vilarejo.
Se pudesse ela iria embora do Norte poderia ir para o Sul, onde as pessoas usam roupas extravagantes e fazem torneios de luta televisionados, onde todos tinham a oportunidade ter carros e as leis eram menos duras.
Uma vez enquanto andava no centro da capital a noite, viu um homem entrando em um dos becos, achou que talvez ele estivesse bêbado e então seria uma boa chance, ela o seguiu e ficou esperando em uma das pontas, o homem parou no meio do caminho e se recostou sobre uma das paredes com um de seus pés levantados, ele olhou para a menina lhe dando um sorriso de felino, ergueu uma das mãos e fez com que uma chama azulada pairasse sobre ela. Aquela foi a primeira vez e única que a menina viu um dos Kratus, ficou encantada com o modo como a chama reluzia perante o beco escuro, como sua cor era diferente, ela quis chegar mais perto e perguntar como ele fazia, mas uma outra figura apareceu e então ela correu. Depois disso imaginou como seria morar nas Ilhas de ferro junto aos Kratus. Talvez aprendesse algo com eles, certamente eles têm leis menos duras, apesar de morarem em Iliria a maioria das leis não se aplicava a eles, o rei não os achava digno de tanto.
— Ikel?— ouviu a voz de sua mãe e percebeu que a mesma estava parada em sua frente com uma xícara de café em mãos.
Haviam olheiras debaixo de seus olhos e sua expressão denunciava que não havia dormido a noite, se sentiu culpada pela mãe, sabia que não era culpa dela, mas talvez se fosse mais obediente ajudaria mais em casa, se ao menos arrumasse um emprego de verdade.
— Sim?— sorriu em direção a mulher.
— Sua irmã precisa ir a capital poderia ir com ela?— a mulher a olhava quase como em um suplício, sabia que ela estava cansada demais para que a menina respondesse um não por isso apenas assentiu com a cabeça, mesmo contra a vontade.
Se levantou e foi em direção ao quarto, pegou as botas que havia jogado ali na noite passada e esperou a irmã terminar de se arrumar. O caminho para a capital foi muito constrangedor e desconfortável para as duas, sabiam que uma não queria a companhia da outra, e que a menor das palavras poderia fazer com que brigassem novamente. O silêncio pairava entre elas a cada passo que davam, Kass andava com a cabeça erguida como se aquilo não a abalasse e Ikel tentava manter seus olhos concentrados nas vitrines das lojas. Por mais que quisessem ficar assim até o caminho de volta, não poderiam, era um caminho longo demais para que o fizessem.

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A lenda de Drogon
FantasyAte onde vai sua lealdade quando a pessoa a quem jurou já esta morta? Em Illiria vive uma sociedade separa pelo poder dos mortos. Ikel vivia sua vida razoavelmente estável em sua casa, com suas janelas minúscula e sua família, nunca pensou que pode...