Conforme as semanas iam passando o clima na casa dos Cuthbert's se transformava em um guerra fria, desde o ocorrido na loja de roupas Ikel e Akassia não se falaram mais, faziam de tudo para que não precisassem ficar durante muito tempo no mesmo cômodo, durante as manhãs Kass saia mais cedo para as aulas e a noite Ikel chegava um pouco depois do horário a tempo da irmã terminar o jantar e ir se deitar, às vezes decidia dormir no sofá o que fez com que ela começasse a considerar exercícios para melhorar a coluna que estava estragada demais para alguém da sua idade. Os outros integrantes da família fingiam que não viam a pequena guerra silenciosa dentro de casa, Mark pegou alguns turnos extras na serralheria e chegava em casa cansado demais para conversar com Ikel sobre seu comportamento irresponsável tão perto da ida de sua irmã, e sua mãe continuava fingindo sorrisos pela casa para o bem de todos.
Ikel começou a procurar emprego desde que sucedeu a pequena briga. Quando anoitecia e o céu de Chulam se abria de estrelas pensava no que seu pai estaria achando de tudo isso, se estaria orgulhoso de sua filha caçula, provavelmente estaria do filho que estava seguindo seus passos. Se perguntava se ele poderia ler seus pensamentos de onde estava e se pudesse a perdoaria por tê lo culpado pela sua morte durante tanto tempo? Talvez pudesse consertar as coisas agora, ser uma filha melhor, quem sabe eles até poderiam esquecer dos problemas depois de um tempo, quem sabe voltassem a cantar e dançar nas noites felizes quando todos estavam em casa e o clima era fresco o suficiente para estarem juntos no mesmo cômodo.
— Alguma coisa Willow?— perguntou se escorando no balcão de madeira do estabelecimento.
Willow trabalha nas agências, por isso ela foi a primeira pessoa a quem ikel recorreu quando decidiu dar um rumo a sua vida, e então lá estava ela no estabelecimento branco encarando os óculos fundo de garrafa da atendente.
— Você toca piano, não toca?
—Sim...
— Então tenho algo para você — exclamou sem tirar os olhos da grande tela digitalizadora a sua frente— mas apenas se for tão boa quanto a sua mãe — ela fitou os olhos da menina esperando receber uma resposta convicta.
— Ela mesma que me ensinou tudo que sei— rebateu dando seu melhor sorriso enquanto mantinha os olhos nos da atendente.
— Trouxe seus documentos?— voltou a fitar a grande tela enquanto estendia sua mão para a garota.
Ikel lhe entregou tudo e observou enquanto esperava as próximas instruções, o silêncio se seguiu durante alguns minutos agonizantes, não se tinha muito para olhar no estabelecimentos e as poucas coisas que tinham eram do mesmo tom branco das paredes, fazendo Ikel ter um leve desconforto nos olhos.
— Amanhã às quatro da tarde esteja neste endereço— lhe entregou um papel junto a um pequeno passe com a foto e os dados de Ikel— não é necessário levar nada, tudo que irá precisar lhe será entregue— ela falava de forma clara e eficiente se assegurando de que a garota prestava atenção em cada uma de suas palavras— não arrume confusão, faça um bom trabalho e não se atrase. Venha no dia seguinte para o pagamento.
A menina lançou um sorriso a atendente enquanto guardava rapidamente o papel e o passe que acabara de receber. Fez sinal de referência antes de sair do local, quando sentiu a brisa quente bater em seu rosto não se importou por ainda estarem no verão, por ainda estar quente, estava feliz, seu primeiro emprego cadastrado e faria algo que sua mãe amava, com certeza ela iria se orgulhar. Decidiu que só iria contar quando já estivesse com o dinheiro em mãos, poderia comprar os doces favoritas da mãe e lhe fazer uma surpresa.
No caminho para casa sentou no chão do metrô e retirou os papéis que havia recebido e releu as instruções, torceu o nariz e o canto da boca ao notar a data do trabalho, seria no mesmo dia em que Kass iria embora para a seleção, por mais que estivessem brigadas ela ainda queria se despedir da irmã, dar um último abraço ou até mesmo um último sermão entretanto talvez a irmã não compartilhasse dessas vontades então seria melhor assim. Decidiu que não daria um último adeus, sairia antes que todos acordassem então assim poderia escolher qual seria sua última memória de Akassia.
Gostava de lembrar da primeira vez em que foram até a capital sozinhas, seu pai havia recebido um dinheiro a mais por um grande lote de móveis feitos ao castelo, deu alguns trocados para as filhas que elas logo trataram de fazer planos. Era primavera a estação favorita de Ikel, o clima era agradável o suficiente para andarem durante horas sem sentirem suas pernas tremerem de cansaço. Era uma sexta de feriado, haviam milhares de barracas nas ruas devido a grande feira, elas iam de barraca em barraca passando seus dedinhos curiosos nos objetos diversos, por fim pararam em uma barraca de bijuterias onde decidiram trocar presentes, Ikel comprou um colar com uma pequena pedra esverdeada que combinava com os olhos de akassia, a irmã lhe comprou um par de brincos com contas vermelhas penduradas, ela disse que combinava com os fios pretos do cabelo da irmã.
Ikel sorriu recostando sua cabeça sobre o metal gelado, podia sentir novamente todas as emoções do dia como se tivera acabado de vivenciar, o vento fresco passando por suas bochechas, como os braços da irmã eram macios e quentes ao redor dos seus, como suas bochechas doíam por causa do sorriso estampado em seu rosto a cada segundo do dia. Se lembrava do cheiro das comidas diferentes e incomuns das barracas, da sensação da bota nova que tinha acabado de ganhar e por isso machucava seu pé exatamente como faziam agora por estarem velhas de mais. E se lembrava de como se sentia quente e acolhida enquanto ria nas ruas cheias de gente mas que para ela havia apenas as duas irmãs, felizes.
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A lenda de Drogon
FantasyAte onde vai sua lealdade quando a pessoa a quem jurou já esta morta? Em Illiria vive uma sociedade separa pelo poder dos mortos. Ikel vivia sua vida razoavelmente estável em sua casa, com suas janelas minúscula e sua família, nunca pensou que pode...