CAPÍTULO 3

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[ Este capítulos contém muitos gatilhos]
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Essa semana que passou fora a mais difícil. Desde do dia em que decidi abrir meu coração para Diego, eu sinto como se qualquer pessoa que me olhasse estivesse me julgando internamente. É como se todos estivessem tramando ou conspirando contra mim. Está difícil tentar esconder toda a mágoa e tristeza com um sorriso. Eu não tenho motivos para sorrir. Aliás não tenho motivos para viver, sou uma decepção para meus pais. O que eles iriam dizer e fazer se soubesse que gosto de garotos? Queria uma maneira de me poupar de sofrimento e poupar eles dessa decepção que eu sou.

Vejo dizerem que a morte não é um caminho ou uma porta, mas para mim é sim! É uma porta sendo aberta enquanto estou me afogando aos poucos. É um caminho na direção certa, enquanto estou perdido. Nada mais me parece certo e muito menos errado. Anos atrás eu me cortava, não por ter problemas como os outros, mas só saber que a dor da carne iria aliviar as dores internas sofridas pelo o bullying escolar e familiar. Criaram um grupo de apoio na escola, mas nele só meninas participavam. Eu como menino ninguém ligou para isso.

Eu sei que isso não é uma coisa indicada a fazer, mas é o jeito que encontrei de aliviar as dores internas. A dor da alma não tem cicatrização, mas serve como apoio, saber que a dor da carne cicatriza e desvia essa dor. A cada dia me sinto mais atraído pela a lâmina.

- Usa-me, usa-me e livre-se da dor. – É como se eu ouvisse ela falar.

As vezes fico parado apenas olhando para algo afiado ao ponto de corta, mas me falta coragem. Talvez se eu passasse essa faca no meu pescoço, ou afundasse ela no meu peito, eu tiraria todas as minhas dores. Sem pensar duas vezes pego a lâmina e corro para o quartinho da bagunça onde ninguém me interromperá. Somente eu estou em casa, meus pais estão trabalhando e meu irmão como sempre está por aí bebendo. Talvez se eu tivesse um irmão presente, eu poderia me abrir e tirar um fardo das minhas costa, mas eu não tenho!

Desencapo a lâmina e a olho com fascinação. Você irá desviar a atenção das minhas dores. Irá me fazer sentir vivo. Você pode ser minha perdição e minha salvação. Passo a lâmina afiada um pouco acima do pulso e as lágrimas descem, por causa das duas dores. O líquido vermelho começa a brotar do corte em linha reta. Outro corte e mais sangue brota. Sinto prazer ao ver que essa dor pode ser cicatrizada e assim ameniza a outra dor. Outro corte por se idiota: mais sangue. Outro corte por ser uma decepção: mais sangue.

Cinco cortes são feitos e meu braço já está ensanguentado e ardendo. Dói porra! Livra-me dessa maldita dor. Vejo o sangue pingar no chão e sinto um vazio no meu peito, uma vontade imensa de passar a lâmina no meu pescoço e acabar com essa maldita vida. 

- Por que eu sou assim? – Deixo as lágrimas lavarem minhas dores.

Faço outro e mais outro corte com ódio e vejo mais sangue descendo. Eu não consigo controlar a vontade de fazer mais cortes. Sinto que está aliviando minha dor. Guardo a lâmina e limpo o chão para ninguém perceber. Lavo o meu braço e o ardor, me mostra que eu estou vivo. A somente a dor pode te fazer sentir vivo.

Tomo um banho e choro muito mais. Eu nunca deveria ter nascido. Eu deveria ter sido mais uma das crianças que morrem no parto. Deveria ter sido um aborto. Uma gravidez inacabada. Deveria ter sido tudo, menos gerado. Talvez se a minha mãe tivesse deixado aquele boi passar por cima de mim estaria tudo bem.

Nos meus seis anos de vida, ainda morávamos em um sítio. Meu pai criava vacas e bois, eu como uma boa criança e Salvador dos indefesos, fui alimentar um boi e não sabia que ele era bravo. Entrei no cercado alimentei o bicho e na hora que dei as costa para sair, ele me chifrou por trás e eu apaguei. Segundo minha mãe, eu fora jogado para cima com o impacto e cai no chão praticamente morto. Eles correram para me tirar pois o boi iria passar por cima de mim, por pouco ele não me quebrou inteiro.

Fui internado e a coluna descolada. Fiquei uns dias internado e com uma faixa prendendo toda a minha cintura. Se nesse dia por algo maior, se minha mãe não tivesse visto isso eu estaria em algum lugar melhor que esse que chamam de mundo. Ou então se a moto que bateu em mim e quase esmagou minha cabeça, tivesse de fato esmagado e me matado eu estaria feliz.

Quando tinha nove anos, vinha da escola com minha mãe e uma amiga da minha idade, eu atravessei a pista sem minha mãe ver e sem olhar para os lados. Tropecei e cai no meio da pista, uma moto parou com o pneu em cima da minha cabeça, por mais um pouco teria esmagado completamente. Nem mesmo a morte me quis nesse quinze anos.

Saio do banho e lavo o rosto. Visto uma camisa de manga longa para cobrir as marcas. Elas pararam de sangrar, só estão ardendo, me sinto até melhor. Visto uma bermuda por causa do calor e sigo a contra gosto terminar as atividades. A escola ou melhor dizendo inferno. É um lugar monstruoso, achamos que monstros não existem, mas eles existem e convivemos com eles diariamente. Meus monstros não moram debaixo da minha cama, meus monstros moram em casas comuns e são reais.

Eu sofri bullying por se tímido. Sofri por ser mais afeminado. Sofri por não pegar mais de dez garotas. Tudo era motivo de praticamente bullying comigo. Sofri e sofro calado. São meus  problemas e ninguém pode ajudar, podem até tentar, mas não adianta. Temos que bater de frente com nossos medos! Mas como bater de frente se esse medo, pode te espancar até a morte? Como caramba? Como enfrentar?

Talvez um desses caminhões que estão passando na rua possam acabar com meu sofrimento de uma vez. Acabar com o bullying que ainda hoje sofro. Acabar com esse vazio. Acabar com a  dor da rejeição e acabar com a dor de ser uma decepção.

- O que tá fazendo? – Marta me desperta dos pensamentos. Eu estava segundo para o meio da rua, sem perceber. – Quer morrer? – Ela brinca sorrindo. Isso é tudo que eu mais quero.

- Nem percebi. – Forço um sorriso, que parece ser convincente.

- hoje não vamos esperar as meninas. Então vamos? – Avisa  e começa a caminha. A sigo.

- Não vejo hora disso acabar. – Desabafo cansado.

- Nem eu. – Ela levou no sentido de a escola acabar, mas o que eu queria que acabasse era outra coisa.

Ela começa a teclar no celular e eu somente ando o seu lado. Vejo Diego e passo de cabeça baixa por mim. A aula inteira ele não olha ma minha cara. Eu deveria achar isso bom, no entanto isso faz meu peito ficar apertado.

- Olha para mim.. – Digo sem querer.

- O que? – Alana pergunta sem entender.

- An? – Sorrio forçado.

- Tu tá pirando. – Ela rir. A minha gargalhada fora involuntária e escandalosa, nem assim ele virou para me olhar.

Caio soltou algumas brincadeiras e palavras ofensivas como sempre, mas ignorei e segurei a vontade de pegar a tesoura na minha bolsa e empurrar ela no olhos dele e por último no coração. Nenhuma das minhas amigas, percebeu que eu estava usando casaco o dia inteiro, mesmo estando calor. Afinal por que elas ligariam para isso?

Caio idiota como sempre, pegou uma cartolina enrolada e simulou que era seu pênis e começou a bater no meu braço, para a diversão de todos. Conti a vontade de avançar nele e de chorar, apenas ignorei. Ele continuou com isso e não me segurei.

- Vai tomar no seu cu! – Amasso a cartolina com ódio.

- Ficou bravinha? – Zomba e seus amigos riem. Minhas amigas estão apenas rindo. Não sei se elas não sabem o que fazer ou não querem fazer.

- Chega disso Caio. – Alana fala e ele apenas sorrir, olhando para Martha.

O resto do dia é chato e tedioso. Ele realmente não olha mais na minha cara. O que será que ele pensa de mim? Qual será seu pensamento quando olha para mim? Ele deve achar que sou gay. Mas eu sou gay, né? Eu gostar de garoto me torna gay. Mais uma tortura não ônibus, com os garotos idiotas. Tenho muito medo de ir no fundo do ônibus, pois nele muitos garotos vão e eu posso ser Tachado de gay e apanhar e ninguém vai se importar com isso.

- De casaco nesse calor? – Minha mãe pergunta.

- É. – Forço um sorriso. Tomo um banho janto e deito para dormir, torcendo para não acordar amanhã. Tudo para mim perdeu o sentido. Nada mais tem graça.

Eu Desejo A.. (✔)Onde histórias criam vida. Descubra agora