Capítulo 12 - Má-drasta?

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Leia o capítulo ouvindo a música: https://www.youtube.com/watch?v=ce5SdArOBYs

***


Atravesso o corredor da Seguradora Portella em direção à sala de Natasha, que fica ao lado da ex-sala do meu pai (e agora minha futura sala). Além de minha mentora, ela ocupa o cargo de diretora interina desde que meu pai faleceu. Ela era gerente de um dos nossos setores quando eles se conheceram e, com o passar do tempo, assumiu novos cargos até fatidicamente chegar a esse. A posição das portas, lado a lado, reflete essa conexão; ela sempre foi o braço direito dele. E agora, pelo visto, será o meu.

Depois de dormir até as dez da manhã, passei o café da manhã treinando as desculpas esfarrapadas que daria na conversa com minha madrasta. Eu sei que ela está dando o melhor pela empresa, cobrando de mim o que cobra de qualquer outro funcionário, no entanto ela poderia se esforçar para ser menos... menos... Natasha, comigo.

Marcela, sua secretária (e noiva do meu ex-namorado), está sentada na recepção, digitando com avidez no computador como se sua vida dependesse disso. Pigarreio ao me aproximar, chamando a atenção dela.

— Olá, dona Marina. Tudo bem? — ela me cumprimenta, simpática.

Coitadinha! Não faz ideia de que stalkeei seu querido noivo bundudo. 

— Oi, Marcela. Como está o humor da sua chefe? — sussurro. Quero sondar o que me espera lá dentro.

— Dona Natasha? Bom... não me pareceu muito animada. — Ela dá um sorrisinho sem graça e olha para a porta, com medo de que Natasha pulasse a qualquer minuto em seu pescoço.

Dou um suspiro profundo e aprumo a coluna antes de entrar. Nunca sei o que esperar ao abrir a porta, então apenas bato duas vezes e a abro, procurando por Natasha. Ela está sentada em frente ao notebook, com os óculos de leitura (ela nunca admite que precisa deles), e seus olhos azuis vivos olhando para o que quer que estivesse na tela do computador. Desvia o olhar por apenas um segundo até mim e faz sinal para que eu entre, assim que guarda os óculos na gaveta da mesa.

Fecho a porta e me aproximo da cadeira à sua frente.

— Que bom que sobreviveu — comenta, e me esforço para decifrar se foi ironia ou sinceridade. Nunca sei.

— É, uma aventura e tanto... — E que aventura!

Ela abre uma das pastas pretas que parecem flutuar ao seu redor (são muitas) e coloca uma resma de papéis bem diante de mim.

— Dá uma olhada nisso. São os reajustes que faremos no final do semestre — ela fala, antes de voltar o olhar para a tela.

Folheio os documentos e identifico a porcentagem no meio de tantos outros números. É comum fazer alteração nos valores dos planos dos clientes uma vez por ano, e já sei que isso acontece no final do primeiro semestre. O que me chama a atenção, nesse relatório, é que tem 3% a mais de alteração do que no ano passado.

— Por que tão alta? — questiono, estranhando. 

Natasha me fuzila com os olhos.

— Por acaso você leu o documento que te enviei por e-mail?

Droga!

— É que... lá no hotel... acabou... é... a chuva... — Tento encontrar uma desculpa, mas as palavras desaparecem quando fico nervosa.

Natasha bufa, impaciente. Encosta o corpo na cadeira e balança a cabeça, inconformada.

— É, não dá mesmo... — Ela suspira e prende o ar, como se estivesse prestes a explicar para uma turma enorme de adolescentes sobre genitálias. — Porque a inflação só aumenta, Marina. Não dá para manter um valor se todos os serviços que terceirizamos continuam subindo — explica, como se fosse óbvio. — O que você saberia se tivesse lido o protocolo inteiro. Aliás, está sabendo que passaremos por auditoria na próxima semana, né? E que isso vai ser questionado à futura diretora?

Uma mentira (im)perfeita [DEGUSTAÇÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora