Capítulo 53

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Isabel me encontrou na sorveteria minutos depois. Eu estava sozinha, pensativa e calada, brincando com a colher de plástico no caldo que havia se tornado o sorvete. Por mais encantadora que tivesse sido a atitude de Nico, era também uma prova de que não havia mais interesse algum dele em mim. Havia sido uma atitude fraterna, algo que um bom amigo ou um irmão faria.

— Catarina, cê nunca deixa de ser paiaça, não? — Bel se revoltou quando lhe disse isso — Ocê realmente acha que o Nico te vê como irmã dele? Cria tipo, menina!

— Uai, pode ser. — Fui subindo na charrete enquanto ela dava a volta — A gente foi criado junto.

— Cê num viu ele olhando pr'ocê? — Bel subiu, pegou as rédeas e fez a égua seguir caminho pela rua de paralelepípedos — Toda hora ele passava o zói de cima a baixo. E quando ocê saiu? Tive que cutucar ele pra parar de olhar pra sua bunda!

Pressionei os lábios para disfarçar a vontade de rir.

— Eu num vi isso, Bel. Cê tá sonhando.

— Num viu porque cê também tava comendo ele com o zói, uai! Num ia notar nunca. Dois sonso.

— Tá, deixa o Nico pra lá.

— Ainda não quer saber o que aconteceu com ele?

O balanço da charrete era igual ao dos meus pensamentos.

— Tem mais pra saber?

— Ah, se tem. Dele, da Vanessa e do...

— Não, não fala. — Fiquei muito curiosa, mas me controlei o máximo que pude. — Eu logo tô indo embora, Bel. Pra quê eu vou ficar perguntando da vida dele?

— Tá, ocê que sabe.

Não esperei nem cinco segundos e comecei:

— Mas ele tá com alguém? O que aconteceu com a Vanessa? Ele tá morando aonde? E os irmãos dele?

— Ele tá meio que...

— Não, deixa, não responde.

— Catarina! Quer ou não quer saber?

— Não, não quero.

Isabel balançou a cabeça de um lado e outro e ficou resmungando que eu dificultava muito a vida.

— Deixa pra lá, Bel. Eu precisava é de outra coisa. Cê passa num lugar antes de nós ir embora?

— Onde?

— Na casa da minha mãe.

— Da tia? Tem certeza? — Bel ficou visivelmente preocupada.

— Tenho. A última vez que vi ela tem mais de um ano.

— E ela te tratou que nem cachorro, lembra?

— Eu sei, mas tenho que ver como tão as coisa por lá. Vai ser rápido, prometo.

Isabel aceitou meu pedido e seguimos até a chamada "Rua das Flores", de onde minha mãe não havia saído desde quando chegou há mais de uma década. Assim que paramos em frente ao velho botequim, encontramos tudo fechado. Minha mãe não aguentava mais manter o estabelecimento funcionando por conta dos inúmeros problemas de saúde que a debilitavam. Vivia agora com a pensão do INSS, a que meu pai lhe dava de boa vontade e o dinheiro que eu enviava.

Parei no portão, bati palmas e gritei "Ô de casa" bem alto. Quem atendeu foi Camila.

— Catarina? — Ela veio correndo, abriu e foi logo me abraçando. — Que saudade! Não sabia que vinha!

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