Sete | Angel, A esquecida.

48 15 38
                                    

Quatro meses se passaram desde que Angel havia desaparecido. A mesma quantidade de tempo que uma nova vida havia surgido em Lídia. Há menos de duas semanas ela havia descoberto que a pílula havia falhado, e sua barriga estava saliente, embora ainda conseguisse esconder aquele fato de todos ao redor. Ainda era um choque do qual não havia conseguido absorver.

Em todo aquele tempo, finalmente a garota conseguiu encontrar coragem para entrar no quarto da irmã mais velha, e averiguar cada item que continha lá dentro. Apesar de aparentemente normal, em suas gavetas escondiam-se artefatos que Lídia julgava ser um tanto quanto esquisitos.

Entre os segredos mais intrigantes de suas descobertas, estava um exemplar do livro "The Satanic Rituals", escrito por Anton Szandor LaVey, fundador da Igreja de Satã. O livro era todo preto, com letras vermelhas e um pentagrama invertido desenhado logo abaixo.

Lídia dividiu todas aquelas informações com Natália e Lucas, que pelos quatro meses que decorreram, estiveram ao seu lado em todas as situações, tanto com relação à descoberta da gravidez, quanto ao livro satânico que lhe trazia arrepios apenas ao vislumbrar sua aparência.

Como a garota não tinha feito quase nenhum amigo desde que havia se mudado para capital, ter Lucas e Natália por perto era bom, apesar das circunstâncias não favorecerem muito. Eles tinham mais conhecimento sobre o assunto "satanismo" do que Lídia, e explicaram que a maioria dos jovens que se envolvem com aquilo eram antigos cristãos, e que a maioria do aliciamento das pessoas para cultos satânicos eram feitas por internet.

Ao pesquisar mais sobre tal fato, a jovem deparou-se até mesmo com sites e fóruns dedicados à auxiliar cristãos convertidos ao satanismo à esconderem sua nova crença da família e amigos. A jovem não acreditava que Angel era uma aliciada, mas talvez, uma aliciadora. Em seu subconsciente a garota sempre esperava o pior quando o assunto era a sua irmã mais velha.

Apolo estava cada vez mais convencido que Lídia estava escondendo algo dele, devido à distância que a garota estava mantendo nos últimos tempos, e por isso, havia proposto uma conversa com ela em um restaurante que ficava próximo ao apartamento em que ela morava. Um restaurante em que costumava à ir com a sua irmã, quando seus comportamentos estranhos ainda não eram tão nítidos.

— Você sumiu. — Apolo pronunciou assim que viu Lídia aproximando-se da mesa em que ele estava sentado.

— Só estava raciocinando em algumas coisas. — Admitiu, sentando-se ao lado do rapaz, em um sofá vermelho que havia no encosto da parede.

— Pensei que fossem as companhias novas. — Ele disse, referindo-se ao Lucas e Natália. Como respostas, Lídia apenas forneceu um sorriso torto ao rapaz.

Ao olhar Apolo, depois de quase dois meses tentando evitar contato com ele, a garota reparou que seus cabelos haviam crescido e suas olheiras, que antes eram invisíveis, agora estavam saltadas. Ela deduziu que aquele era o resultado de noites em claro.

— Eu imagino como está sendo difícil ficar sem Angel, mas eu também tenho passado por períodos turbulentos, Apolo. — Confessou, e em seguida abriu o cardápio, analisando as opções de pratos do dia.

— Na verdade, tem sido difícil ficar sem você.

Lídia, ao escutar as palavras que ressoaram da boca do advogado, olhou em seus olhos azuis tão profundos como o próprio oceano, e soube que mergulharia neles todas as vezes em que por mero acaso, esbarrasse em sua frente.

— Apolo, eu estou grávida. — Lídia falou, sem ponderar. Ela finalmente havia se tocado que não importava por quanto tempo ensaiasse para dizer aquilo, seja para Apolo ou para seus pais, nunca estaria preparada. Da mesma forma que nunca achava que estaria preparada para ser mãe.

Os olhos do advogado arregalaram-se em direção à Lídia, e por alguns instantes a garota teve a súbita impressão de que aqueles olhos azuis marejavam sutilmente.

— Quanto tempo?

— Quatro meses. — Lídia respondeu, sem paciência. — Não tive relação com mais ninguém depois de você, Apolo.

O homem sentiu-se atordoado pelos fatos que havia acabado de receber, seu olhar mudou, e dessa vez, fixava o chão. Estrategicamente, o ele levantou as mãos, chamando um garçom com gravata borboleta vermelha, combinando com o terno preto.

— Água com açúcar, por favor. — Ele fez o pedido, e o garçom saiu apressadamente para cozinha para atendê-lo, tendo em vista a palidez em que o cliente estava.

— Você está bem? — A garota perguntou por educação.

— Sim. Na medida do possível. — Admitiu, enquanto pegava o copo de água com açúcar da mão do garçom, que havia feito o trajeto da cozinha até à mesa em uma velocidade impressionante. — Faz quanto tempo que sabe disso?

— Algumas semanas.

— Poderia ter me contado. Estamos juntos nessa. — Respondeu, ingerindo toda água que havia no recipiente de uma só vez. — Meu sonho é ser pai, e por mais que as condições não sejam propícias, quero que saiba que isso... Não é uma angustia.

— Obrigada. — Lídia respondeu, com um sorriso triste nos lábios.

Não conseguindo mais segurar a seriedade que estava mantendo até aquele momento, a garota deixou com que uma lágrima caísse de seus olhos. Lágrima que rapidamente foi enxugada pelos dedos de Apolo. Ele envolveu a garota em um abraço confortante, e pode sentir mais uma vez a falta que a garota fazia, e o tanto que a queria, enquanto o choro silencioso e incontrolável dos dois saia de forma arrebatadora pelos olhos.

Apolo sabia que por mais que Angel fizesse parte de suas lembranças, Lídia fazia parte de seus pensamentos presentes, e agora, futuro. Desde aquele abraço e aquela revelação, o advogado selou um comprometimento com aquela garota que estava em seus braços, e também, com o futuro filho que geraria. Angel teria que ser esquecida.

Angel, O demônioOnde histórias criam vida. Descubra agora