CAPÍTULO V

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Eu fico um tempo olhando para o nada, pensando em como seria no momento que que eu saísse daquele hospital. Eu não queria que minha vida voltasse a ser o que era. Na verdade, eu nem sei o porquê sinto tanto ódio de algo que não me lembro. Sei lá, eu parecia ter uma vida perfeita, mas havia algo de errado em tudo. Eu sentia. Meus pais... nunca sincero, meus amigos privados de me ver, eu excluída da sociedade, perda dos movimentos... tudo muito estranho.

Levanto da cama e vou em direção ao banheiro, tomar um banho. Eu rio ao pensar que fazia quase um mês que eu não tomava um banho decente. As bactérias do meu corpo choram nesse momento. Tiro a roupa e me olho por um tempo no espelho. "Não sou tão feia assim", sorrio e dou a língua para mim mesma. Tranco a porta do banheiro que esqueço semiaberta. Pego-me cantando "Pumped up Kincks", bem alto. Não sei de onde tirei aquela melodia, nem sei como soube o nome da música, mas continuo, era bom.

'Choro pelos outros pacientes'.

Não sei de fato o motivo que escolhi aquela música, mas, sei lá, ela foi a primeira que eu pensei, achei atraente. Me causava um sentimento de ódio e paz ao mesmo tempo. Enquanto as partículas de água escorriam por cada parte do meu corpo, as partículas sonoras invadiam a minha mente. Amava o estado de transe que as vezes me encontrava. Levando a cabeça com sensação de prazer, por aquele momento perfeito, e meu rosto se imunda com toda aquela água. Canto enquanto minha alma dança com aquele som. Não sei quantas vezes a repeti, mas quando fui perceber, meu corpo muito inteligente, fez tudo sozinho, e eu já estava vestida, com os cabelos molhados penteados, no quarto. Até que canto bem.

Sem a música meu ser volta ao normal estado, chamado "vida". Eu odiava os momentos de reflexão, porque eu sabia que a cada momento eu perdia menos um milésimo de quem sou agora. Eu tinha medo das influências externas me fazerem ser quem era antes, o que me conduziu a me sentir em completa escuridão. Mas por que tanta raiva? Bem, não sei. Era como se minhas mãos tocassem a minha alma. A alma da qual se encontrava em chamas, em total sofrimento. Olho para minhas mãos. Imagino elas depois desse momento de tentativa de uma relação estável. Elas estavam pretas, contaminadas de um mal do qual recomeço. Eu nem sei quem sou....

Felizmente meus pensamentos são atrapalhados, por batidas na porta. Eu estava pensando em sair, minha mente que atrapalhou. Reviro os olhos e abro a porta. Estavam querendo limpar o meu quarto, então preferir dá uma volta para respirar, e deixa-las ali.

Depois de uns 15 minutos perambulando pelo hospital, vi que ele era maior do que eu imaginava, e como se um dejavu tivesse caído sobre mim, me encontro ali, no jardim que vi hoje mais cedo. De fato, me enganei. Ali não era o final, pelo contrário, era o jardim entre os dois prédios hospitalares. Achei lindo e chique, e até continuaria contemplando se não fosse aquele sentimento que cada vez consumia mais meu peito, que agora doía. Algo ali me atraiu, e eu vou em direção a um banco de madeira, ocupado pela única pessoa ali, além de mim. Caminho calmamente, meu corpo se arrepia como já esperasse o que fosse acontecer. Minha respiração se torna ofegante, meus passos pesados como se quisessem me impedir de prosseguir. Ele ouve minha respiração e deixa o jornal que 'lia' ao lado de um buquê. Eu paraliso, e minhas pernas ainda me dão uma última chance de ir embora, minha mente diz "não", mas meu coração diz "sim". Eu o obedeço e caminho até a sua frente. Ele estava com a cabeça baixa, e a levanta calmamente até se deparar com meu rosto. Até nossos olhares se encontrarem naquela escuridão. Até o momento em que minha alma decide deixar um completo desconhecido a tocar. Seus olhos me penetram com muita força, fazendo-me olhar para o chão. Eu não vejo, mas seu rosto estampa um sorriso. Eu sentia. Aquele momento durava uma vida. Eu não sabia o que fazer, deveria ter obedecido a minha mente, deveria...

-Olá, minha querida! –Ele diz a mim, o que faz meu rosto se levantar novamente e corar- creio que gostaria de se sentar, não? –Ele olha para o banco e depois para mim.

Eu dou um sorriso malicioso e sento. Ele retribui meu gesto.

A partir dali eu não fui mais quem achei que fora.

Nunca mais...

O Homem de PretoOnde histórias criam vida. Descubra agora