O acidente na rodovia

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Não houve nenhum contato durante quarenta e três anos, imaginamos que teriam perecido.
Dois civis, os senhores Moore e Oashi, informaram uma colisão no túnel de ligação intersetorial, próximo à ponte que se conectava ao continente. Aparentemente um veículo se chocara com a proteção abobadada que levou à um vazamento de atmosfera controlada. O local foi selado pelo sistema automático de contenção, algo que impediu a passagem e a visão detalhada dos dois condutores.
Uma equipe de manutenção de túneis foi encaminhada para o local. Não era comum a ruptura de uma seção inteira da via. Algo que causasse um selamento de uma área daquele tamanho. Normalmente eram realizados pequenos reparos como trocas de revestimento e junções que se deterioravam com o tempo. No momento dessas trocas, sensores e jatos de injeção revertiam a contaminação do ar interior e o fluxo de veículos seguia normalmente.
A equipe era formada por servidores que se intercalavam em períodos do ano. Na verdade, poucos trabalhadores se dedicavam a mais que três meses de contribuição em qualquer atividade. Então, embora executassem tal função, experiência suficiente lhes faltava para lidar com aquela situação inusitada. Apenas o coordenador de manutenção, Agnes Hill, já presenciara uma colisão. Veículos são essencialmente seguros. Não há margem para erros dentro dos túneis estreitos. Um acidente com outro veículo é praticamente impossível devido a presença dos sistemas anti-colisão acionados automaticamente. No entanto, um esbarrão lateral poderia acontecer caso um motorista se posicionasse deliberadamente em rota de choque com outro veículo e o sistema escolhesse o desvio para o lado oposto como alternativa de menor dano. Ainda assim, a ruptura da estrutura era quase impossível. No caso que Hill observara, havia apenas arranhões no revestimento e folgas nas junções intercambiáveis.
Ao se deparar com o revestimento não rachado ou quebrado, mas derretido, ficara bastante intrigado. O veículo que causara a ruptura estava parcialmente destruído. Foi possível observar que não era equipado com rodas. Concluíram que caíra de fora para dentro e de cima para baixo, mas não havia nenhuma peça que o identificasse como qualquer aeronave conhecida. Ao se aproximar do que parecia ser o local destinado ao tripulante, o que se encontrara era algo tão consternante que não puderam descrever com exatidão. O coordenador entrou em contato com a Universidade e ao relatar de forma ofegante e superficial, teve a ligação transferida para o complexo de laboratórios do CPBM (Centro de Pesquisas Biomoleculares). Falou com o Dr. Alberto Jimenez, chefe do departamento.

A criatura encontrada no veículo foi levada ao laboratório 26 do CPBM na noite do dia 18 de março de 3032.
A análise do exemplar foi feita por Jimenez e o Dr. Adan Coll, coordenador geral do CPBM. A forma humanoide não estava despida como descreveram os que o encontraram. Apresentava uma roupa branca, com aspecto de borracha, rente ao corpo. Este tecido, ao ser cortado por um bisturi, inflou-se imediatamente, como se apresentasse uma camada sob pressão negativa. Na face, boca e narinas pequenas. A caixa torácica e abdômen aparentemente subdesenvolvidos. Ao examinar os olhos, uma constatação impressionante: não se encontrava esclera, apenas algo como uma grande íris negra. Descobriram então, tratar-se de mais uma camada protetora, como um segundo lance de pálpebras, de consistência córnea. Acreditaram que teria a serventia de filtro de luminosidade. O Dr. Jimenez prosseguiu com a incisão e ao entrar em contato com o aparelho respiratório defrontou-se com a terrível verdade: sete glândulas anexadas à luz dos pulmões.

Caso encerrado em 3034Onde histórias criam vida. Descubra agora