Capítulo 12

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Há exato um mês Cecilia amava o colégio. Amava aprender coisas diferentes. Adorava saber mais do que os outros e obter as notas mais altas. Sentia orgulho de ser a mais nova em sua turma, mesmo com as constantes implicâncias e brincadeiras. Aquilo tudo não passava de pura e simples ignorância, já que os demais adolescentes eram desprovidos da mesma perspectiva de futuro que ela. Não tinham a mesma visão. Eram apenas adolescentes idiotas, os quais ela jamais fizera questão de ter como amigos.

As coisas haviam mudado para Cecilia. Ela não queria mais sequer aparecer no colégio. O dia a dia se tornara seu pior pesadelo desde o aparecimento daquela foto. Se antes ela caminhava pelos corredores com confiança, agora ela se sentia uma ratazana fugindo quando as luzes se acendiam na viela.

Todos pareciam olhar para ela com desprezo, apontando e rindo com o sórdido prazer de vê-la sofrendo. Eles sabiam que estavam sendo babacas. Eles sabiam. E não paravam.

Tudo aquilo era tão real e cruel, que por mais que ela negasse ser a pessoa da foto, por mais que alegasse ser uma montagem barata e implorasse para que a deixassem em paz, não conseguia fazê-los parar. Eles não estavam dispostos a tirar-lhe o alvo das costas. E ela se descobriu um alvo fácil. Frágil dentro da redoma que seus pais haviam construído para ela.

No começo, foram apenas olhares condenatórios e comentários depreciativos de desconhecidos, mas rapidamente a situação se desdobrou em um ataque em massa contra ela. Era a primeira vez que vislumbrava a realidade do comportamento de manada. Bastou que uma pessoa afirmasse tê-la reconhecido na maldita foto e todos os demais passaram a assediá-la e persegui-la.

Os insultos igualmente se estendiam a família e ninguém foi poupado, nem mesmo o caçula, que passou a ser ridicularizado não só por ser filho do tio-avô como Ceci, mas também por ter um rosto angelical e delicado demais para um menino. A sociedade era hipócrita. O medo crescia.

Cecilia não tinha mais forças para combater as ofensas, parecia constantemente desviar de flechas disparadas contra ela. Passou a andar de cabeça baixa pela escola cada vez mais envergonhada e acuada. Sua única tábua de salvação naquele mar de miséria era Mel, imune ao bullying devido ao prestígio e o empenho da família em preservar a reputação da garota. Diferentemente da amiga, Ceci não tinha o apoio da família a qual não estava sequer ciente dos acontecimentos.

Naquela manhã sua mãe havia finalmente notado que as folhas de seu caderno estavam completamente rabiscadas com xingamentos e frases obscenas. Cecilia recolheu o caderno tão rápido quanto conseguiu, mas não rápido o suficiente.

— O que é isso, minha filha? — indagou Lynn, imediatamente caminhando em direção à garota.

— Nada — respondeu ela, prendendo a respiração.

— Cecilia Anderson.

Aquele tom de voz era um que sua mãe jamais havia utilizado com ela. A firmeza fez com que seu coração se comprimisse no peito. Ela teria que mentir mais uma vez.

— Não é nada, mamãe. É só um rascunho.

O olhar da mãe não suavizou e ela entregou o caderno de anotações com os olhos já cheios de lágrimas. O rosto de Lynn se transfigurou instantaneamente ao ver o conteúdo das ofensas, especialmente porque seu nome aparecia várias vezes como "a ninfeta chupa tio".

A escola recebeu inúmeras ligações acaloradas. Fizeram uma reunião com o diretor. Com o conselheiro. Com a psicóloga. Com o pedagogo. A situação só piorou. Ao final da semana, Cecilia já abria seu armário com medo de encontrar algo pior do que recados ofensivos e bilhetes com ameaças veladas a sua integridade física.

A direção fizera diversas promessas de descobrir os culpados, porém até que chegasse o momento de alguém pagar por tudo aquilo, o mal já estaria feito, sua alma já estaria submersa na escuridão, banida para sempre do plano das virtudes. E talvez fosse o que merecia. Estava apenas sofrendo as consequências de uma noite despreocupada.

Josh havia desaparecido da face da Terra. Só então ela percebera o quanto ansiava pela presença reconfortante dele. Pela proteção, pelo olhar inflexível e desaprovador. Se houvesse confiado mais naquele insano, talvez não estaria passando por aquilo. Se tivesse passado a noite inteira com ele, não haveriam fotos para se envergonhar.

Infelizmente o jogo da culpa não servia para resolver nada e ela precisava enfrentar mais um dia acadêmico. Cecilia saiu do banheiro secando as lágrimas e seguiu rumo a sala de aula, lembrando-se que teria que revisar se a cadeira estava limpa antes de sentar, pois nestes dias acabara se sujando com tinta de caneta vermelha.

—Ceci, posso falar com você?

A voz familiar causou-lhe um sobressalto e ela estacou ao ouvir alguém se aproximando por suas costas no corredor. Ninguém era confiável, ela não tinha mais o luxo de se distrair com pensamentos.

— O que você quer? — perguntou ela, girando nos calcanhares e retraindo-se, apertando os cadernos contra o peito ao perceber que se tratava de um garoto alto.

O tom lhe soara inicialmente inofensivo, mas ela sabia muito bem que tipo de ardis poderiam se esconder por trás daquela fachada pouco elaborada.

— O que você quer? — repetiu, com olhar hostil, sentindo-se como um animal acuado.

— Meu nome é Jordan.

— E daí? Tenho que ir pra aula — disparou ela, sem medir a agressividade.

— Espera, Cecilia! Eu sei o que está passando.

— Você não sabe porra nenhuma.

— Eu já passei por isso na outra escola, eu era gordo e tinha muitas espinhas. Um dia uma fotografia minha sem camisa circulou e eu desejei me matar depois disso.

— Aquela foto NÃO É minha! —gritou ela, mas sua voz saiu fraca, quase sem ar para fazer o som ecoar. Não tinha mais forças. Somente ela própria conseguia se ouvir.

— Tá bom, tudo bem... Não acho certo o que estão fazendo com você. Não sou igual a eles.

— Me deixa em paz!

O garoto estreitou os olhos, em seu rosto a incredulidade se mostrava mais que evidente.

— Você está me desprezando? — indagou, por fim deixando de lado o ar amistoso — Então deve ser tudo verdade o que falam sobre você. Se acha superior a tudo e todos. Piranha...

— Vai se foder, Jeremy!

Sentindo as pernas fraquejando ela se pôs a correr em direção à sala de aula. Por algum motivo acreditava que lá estaria a salvo, pelo menos respeitavam a presença de um professor. Ela empurrou a porta com força, avistando os alunos no interior da sala sorrindo para ela. Por um instante sentiu alívio.

A sensação durou pouco, sendo quase que instantaneamente substituída pelo choque de água fria indo de encontro ao seu corpo. O susto fez com que largasse a alça da mochila e seu material se espalhou pelo piso encerado. Logo em seguida o balde de plástico atingiu sua cabeça. Cubos de gelo deslizaram para todos os lados e a garota se viu encharcada da cabeça aos pés.

Após o breve momento de impacto que a cena causou, as gargalhadas inundaram o ambiente hostil.

— Tirem fotos do peito dela para comparar! — alguém gritou.

— Não dá pra ver por causa do sutiã.

Ela olhou para baixo e percebeu a transparência da camisa branca molhada, fazendo aparecer a lingerie cor de rosa. Sentiu um empurrão e suas pernas dobraram sob seu peso, resultando numa queda dolorosa sobre os joelhos.

— É Jordan, vadia! — disse o garoto mostrando os dentes num sorriso quase demoníaco, apontando a câmera do celular para ela.

Os demais alunos a cercaram, dificultando o ato de se levantar do chão molhado. Ao perder o equilíbrio, ela caiu por cima de uma garota, que a impulsionou na direção de outra pessoa. Ela já não sabia mais quem era quem, mas sentiu as mãos esfomeadas tentando arrancar-lhe a camisa. Cecilia gritou e chorou até que a comoção fosse suficiente para atrair alunos de outras turmas e, finalmente, um fiscal de corredor.

Garota InconsequenteOnde histórias criam vida. Descubra agora