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Apenas no dia seguinte percebi que não havia perguntado a Harry por que ele estava me ajudando. Também não perguntara sobre o que acontecera aos outros jovens que, assim como eu, seriam vendidos como escravos caso Harry não houvesse aparecido para o resgate. Também me perguntei qual teria sido o destino que tiveram os homens que ele prendeu – e principalmente do Caçador, como eu chamava em pensamentos a pessoa a quem Harry se referira como Riddle.

Mas não encontrei oportunidade de perguntar tão cedo. Nos dois dias em que estive sob os cuidados da Senhora Pomfrey, meu protetor não apareceu em casa, e em breve eu descobriria que Harry não era alguém com o mais disponível dos tempos. Foram dois dias calmos, mas interessantes, enquanto ele não aparecia novamente, em que fiz minhas refeições na cozinha em companhia de minha enfermeira e dos empregados do palazzo.

Eu descia e tocava harpa, e depois ia para a cozinha, observar as pessoas e a conversa fácil e cheia de risinhos que elas trocavam. As moças vestiam-se de forma simples, com vestidos de tons claros e sem tantos babados, broches e aquelas parafernálias que me pareciam exageradas no início, mas que acabei por me acostumar com o tempo.

Havia a doce e tímida Anna Abbot, as gêmeas tagarelas Padma e Parvati Patil, um garoto faz-tudo com um divertido sotaque Seamus Finningan, Emmeline e sua filha Romilda Vance, e o alegre e indulgente Frei Gorducho. Este, claro, era gordo, com maçãs do rosto rechonchudas e constantemente avermelhadas. Não havia dia em que ele não estivesse com a testa empapada de suor e passando nela, de minuto em minuto, um lenço que já deveria ter sido branco, mas que agora resguardava um tom amarelado. Ele cheirava a gordura, mas eu gostava de seus sorrisos simpáticos e risadas exageradas e fáceis.

"Então Harry decidiu mesmo te adotar." Frei Gorducho soltou uma risada larga enquanto segurava a barriga, como se com medo de deixá-la cair. "Nunca imaginei alguém tão reservado e fechado como o Sr. Potter dispondo-se a cuidar de uma criança."

"Harry Potter é extremamente bondoso. É claro que ele não largaria uma criança tão adorável como esta na rua da amargura, sozinha, sem quaisquer parentes. Veneza também pode ser um lugar cruel para aqueles que não têm nada além das roupas do corpo." Emmeline, que deveria ter mais de trinta anos, alta e esguia, com cabelos castanho-claros que lhe alcançavam a cintura, parou ao meu lado e acariciou meus cabelos. Sorriu para mim, e eu me senti estranhamente fascinado por seu rosto carinhoso, rosto de mãe.

"Qualquer lugar pode ser cruel para alguém que não têm dinheiro e amigos." Padma interveio enquanto mexia com uma longa colher de pau um tacho de onde escapava um aroma inebriante de açúcar derretido.

"Esse garoto na verdade tirou a sorte grande." Seamus, um garoto com cabelos cor de areia, olhos verde-claros e maçãs do rosto proeminentes, apesar de ser magro e ter estatura mediana, comentou em um tom azedo enquanto mordiscava uma maçã. Não sabia o que ele havia dito, mas o encarei com os olhos estreitados. "Vai ganhar tudo do bom e do melhor assim, por nada. O Sr. Potter já andou contratando alguns professores. Ouvi-o conversando com Sirius. Ao que parece, ele em pessoa vai ensinar esgrima para o moleque."

"Como você é invejoso." Anna Abbot revirou os olhos e deu um tapa na nuca do rapaz, que soltou uma exclamação indignada e levou uma das mãos ao local atingido. Frei Gorducho soltou uma risada espalhafatosa.

"O menino chegou a essa casa doente, subnutrido e cheio de machucados. É claro que o Sr. Potter iria se compadecer e querer ajudar! Quem não iria?" Senhora Pomfrey começou a falar com uma ferocidade na voz que fez Seamus encolher. "Vocês não sabem nem da metade do que ele passou. Nenhum de nós sabe, então não o encarem invejosamente como alguém de sorte."

"Eu só estava comentando!" Seamus exclamou jogando as mãos para o alto. "Desculpe por invejar a ideia de alguém que vai ter aulas com o melhor esgrimista de Veneza! É só meu sonho aprender esgrima com o grande Harry Potter!" O rapaz saiu pisando duro da cozinha, e eu torci o nariz, decidindo que não simpatizava com ele.

Era uma vez em Veneza (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora