"JAKE!!!"
Ele estava rabiscando algo indecifrável na mesa quando seu celular vibrou no bolso, produzindo um ruído consideravelmente alto, mas não tanto quanto a gritalhada dos alunos desrespeitosos.
Mantenho o celular atrás de um livro de capa dura, mas à essa altura estou pouco me lixando em ser pega.
"Ariel? O que foi?"
"a Jessy"
"não tá"
"me respondendo"
"u preiso da sua ajuda"
"eu preciso*"
"Fica calma... eu vou te ajudar. Mas preciso que você me explique exatamente o que está acontecendo."
"Eu chamei a Jessy porque ela não apareceu aí ela me respondeu e disse que o Dan sofreu um acidente e tava no hospital com ele aí disse que eu tenho que parar de investigar começou a escrever ao contrário disse que não pode me contar que ele é burro aí eu perguntei QUEM e ela O HOMI SEM ROSTO e disse que me ama aimeudeus"
Jake me lança um olhar confuso, movimentando a cabeça como quem diz "o que eu faço com essa guria?". E então, subitamente, sai da cadeira e vai até a professora, murmurando alguma coisa para ela e passando pela porta.
Ele dá sinal de vida:
"Arranje alguma desculpa e me encontre aqui fora."
"Qual foi a sua desculpa?"
"Longa história."
"Longa? Mas foi tão rápido."
"Meu Deus Ariel, não temos muito tempo para conversar. Estarei te esperando no terraço."
"No terraço? Você tem a chave pro terraço?!"
"Menos perguntas, mais ação."
Como se fosse fácil: não é ele quem já deu todo tipo de justificativa existente e inexistente para literalmente todos os professores do colégio.
Pigarreio, parando atrás dela como uma sombra, os braços endireitados na lateral do corpo.
— Professora, eu posso-
— Vá — interrompe.
Pasma, meus olhos quase saltam.
— O quê?
Ela ajeita o par de óculos, enrugando a testa e prosseguindo com as anotações em giz no quadro negro.
— Com todo respeito, meu dia está uma bosta, Ariel. — Contenho o riso. — O que menos preciso hoje é ficar ouvindo suas desculpas esfarrapadas.
— Eu prometo que não demoro.
Ellen apenas gesticula para que eu saia de uma vez.
Em passos apressados, atravesso o corredor e subo a escadaria que leva até o terraço. Acotovelo a porta, irrompendo como uma louca. Jake encontra-se de frente para a cerca alta de arame galvanizado que cerca todo o perímetro, contemplando a paisagem.
— Jake! A Jessy — corro até ele, tagarelando: — Ela parou de me responder de repente. Estou com medo de que tenha acontecido alguma coisa com ela. Ela me disse pra parar de investigar... mas não quis contar o porquê — tento desbloquear o celular em vão, pois as mãos trêmulas não permitem. — Mas que merda!! Eu não entendi nada! — desenho o Pin e abro a janelinha dela no Whatsapp, rolando para o diálogo mais recente.
Levo um susto quando as mãos grandes de Jake cobrem as minhas, que agarram o celular com força.
— Se acalme, Ariel — pede suavemente. Subo os olhos até os dele. Por um átimo, fico quase que hipnotizada ao mergulhar em suas íris iluminadas pelo sol, parecendo duas pedras de âmbar. Absorvo toda a brisa que balança meus cabelos para os pulmões, expirando pausadamente. Não vou conseguir me acalmar. Não com ele me tocando e me olhando desse jeito.
— Certo... eu... — tum tum. Tum tum. — Você não leu a conversa?
— Eu apenas leio suas conversas quando sinto que é necessário — sua voz está rouca. — O que a Jessica te disse?
— Ela... me disse pra parar de investigar. — A intensidade do vento aumenta, arrastando uma mecha ruiva até meus lábios. — Parece que ela sabe alguma coisa sobre o homem sem rosto. Tento me desvencilhar de seus dedos para tirar o cabelo incômodo, mas Jake age mais rápido e faz isso por mim, tocando-o com delicadeza e passando o fio atrás da minha orelha.
Ele está tentando me acalmar ou me matar do coração?!
Como se caísse a ficha do que acabara de fazer, Jake limpa a garganta e dá um passo para trás, desunindo as mãos e demonstrando interesse repentino pelas nuvens.
— Você já parece mais calma — diz, tirando o celular do bolso. — Aparentemente a Jessica só conversou com você hoje, até agora. Suas últimas conversas foram ontem à noite com o Dan e com o Richy.
Instintivamente, imito seu gesto, torcendo para que o calor na minha cara diminua.
— E o que ela falou com o Richy?
— Ela avisou que estava saindo, já que pelo jeito ele não estava lá.
— Ah, não — solto um suspiro pesaroso. — Que merda, Richy. Por que ele tinha que desaparecer logo na noite do acidente?
— Você pode perguntar — sugere. Tornamos a nos encarar. — Não se preocupe, Ariel. Irei monitorar todas as ligações da Jessica a partir de agora. Você disse que ela está no hospital com o Dan, não é mesmo?
— Sim... de acordo com ela.
— Então não tem com o que se preocupar. Ela deve estar bem.
Sinto a vontade de dizer em voz alta: como você consegue me acalmar com tanta facilidade? Por que sinto que posso confiar em você? Por que me sinto segura com você?
— Que merda é você? — Mas é isso que acaba saindo.
Ele tem um sobressalto com a minha pergunta. Alguns segundos depois, cai na gargalhada.
— Você não tira a merda da boca, não é mesmo?
Acabo entrando no embalo, esquecendo por um momento toda a merda que está acontecendo. É, acho que ele tem razão. Não tiro a merda da boca e nem da cabeça.
— Mas, sério... — amenizo o riso e as feições. — Obrigada, Jake. Ultimamente, tem sido difícil confiar na minha própria sombra.
Ele dá um sorriso tímido. — Sou eu quem agradeço, Ariel. Obrigado por confiar em mim. — Jake se aproxima, puxando uma caneta no outro bolso da calça, gentilmente erguendo meu punho e escrevendo na palma da minha mão: 16035.
— O que é isso?
— É meu número. Meu número de verdade. — Ele mantém os olhos fixos na minha mão por uns segundos. — Pode entrar em contato sempre que quiser. Principalmente depois da escola quando estiver com o Phil. Mesmo que não seja... quero dizer... — coça a nuca.
— Mesmo que não seja para falar sobre a Hannah? — sorrio, achando-o adorável. Um hacker deve ter de confiar muito na pessoa para compartilhar algo assim. — Obrigada, Jake. Assim me sinto um pouco mais calma. Mas só um pouco.
Ele pronuncia as palavras de maneira assertiva:
— Não se preocupe, Ariel. Não deixarei que façam nada com você ou com as pessoas que você ama. Nada.
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SCARECROW - DUSKWOOD
Mistério / SuspenseDo ponto de vista de Ariel, não há cidade mais bizarra que Duskwood. E, de certa forma, ela não está errada: todos os anos, nas noites de 31 de outubro, um cadáver é encontrado no meio da floresta. A polícia negligente é incapaz de divulgar detalhes...