Capítulo XVIII - O direito internacional constitucional

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Direito constitucional é o ramo do direito público interno dedicado à análise e interpretação das normas constitucionais. Na perspectiva contemporânea, tais normas são compreendidas como o ápice da pirâmide normativa de uma ordem jurídica, consideradas leis supremas de um Estado soberano e têm por função regulamentar e delimitar o poder estatal, além de garantir os direitos considerados fundamentais. O direito constitucional aborda ainda as normas de organização e funcionamento do Estado, do ponto de vista de sua constituição política.

Tanto o direito internacional quanto o direito constitucional transformam-se em conjunto e cada vez são encontrados mais pontos de interseção entre os dois ramos, que não necessariamente terminam onde o outro começa.

A transformação e redução das fronteiras econômicas passam a transformar gradativamente também as fronteiras políticas. O processo de globalização econômica acentua-se cada vez mais. Excetuando os períodos de tensão, cresce a ideia de que são necessários padrões globais, denominadores comuns entre os países e as civilizações, posto que estamos cada vez mais conectados.

Assim, ao lado de processos de integração regionais, com a elaboração de um direito supraconstitucional, a defesa dos direitos humanos ganha destaque, podendo ser considerado esse elemento comum integrador.

Na evolução e intensificação da integração das relações sociais em escala mundial, surge a necessidade de estabelecer normas aceitas e reconhecidas pela comunidade internacional dos Estados como um todo, consagradoras de valores essenciais para a convivência coletiva, imperativa, ou pelo menos cooperativa às normas constitucionais dos Estados, restritivas da soberania estatal e variáveis no tempo e no espaço.

Apesar da crescente integração internacional, inclusive, com a criação de blocos regionais e poderio crescente de empresas multinacionais, é difícil empreender a construção de um conjunto de normas que representem o interesse comum de todos os Estados, estabelecendo um novo Direito que irmanasse, inclusive por um sentimento de união global, Nações de diversos Continentes, através da fixação de padrões jurídicos mínimos conformadores de uma sociedade internacional plural e complexa de nossa era contemporânea.

Com o gradativo desaparecimento das fronteiras das nações, surge a necessidade mundial de um ordenamento que estabelecesse normas que visem, na verdade, enfrentar os graves problemas de globalização, com a tentativa de estabelecer sistemas de proteção das relações internacionais com vistas de permitir o convívio entre os membros da sociedade internacional.

A Carta da ONU é parte da constituição material do Direito Internacional Geral. Celebrada em "momento constitucional", ela não apenas possui vocação universalista, mas também consolida hierarquia normativa internacional, inaugura lógica jurídica de subordinação e vincula terceiros Estados a seus princípios.

Atualmente, a Organização das Nações Unidas comporta, virtualmente, a totalidade dos Estados existentes no mundo. Por mais que isso reflita a tendência evolutiva de universalização do Direito Internacional Contemporâneo, a pretensão universalista da organização esteve presente desde sua criação, como evidenciam as palavras da Casa diplomática brasileira durante as negociações que antecederam a Conferência de São Francisco: "Da mesma forma como todo indivíduo, em um ordenamento jurídico, é subordinado à jurisdição de algum Estado, também na ordem externa todo Estado deve estar incluído na Organização Internacional."

O caráter constitucional da Carta da ONU é defendido por diversos autores, entre os quais Bardo Fassbender. Para o autor, o "sistema de governança" instituído pela Carta é um dos seus mais importantes elementos de constitucionalidade. O artigo 25 do documento confere ao Conselho de Segurança verdadeiras competências legislativas em matéria de paz e segurança internacionais. No exercício de suas funções previstas no capítulo VII da Carta, o órgão emite resoluções obrigatórias para todos os membros da ONU. O próprio autor reconhece, contudo, que essa ordem constitucional é rudimentar; a Corte Internacional de Justiça não possui jurisdição obrigatória sobre os Estados membros da organização, e não há um sistema formal de "freios e contrapesos" entre os seis principais órgãos da ONU. Se, por um lado, o Direito regula a sociedade, por outro, é um produto dela. Dessa forma, a constituição da sociedade internacional não poderia ser alheia a seu caráter descentralizado; por isso a institucionalidade imperfeita.

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