Capítulo 1

226 22 4
                                    


Quando aquela mulher entrou na galeria, fez com que o coração de Letícia pulasse dentro de seu peito.  Ela era alta, usava dreads que se enrolavam no topo de sua cabeça, deixando apenas uma mecha solta que descia pelo lado esquerdo de seu rosto. Sua pele era marrom, e estava usando um cardigan vermelho que se estendia até um pouco abaixo do joelho. E por baixo vestia uma camiseta azul, com uma calça cigarrete preta. Calçava uma bota cano curto de tons cinza. Ela atravessava o salão com pressa, com o olhar voltado para o chão, parecia se incomodar com a quantidade de pessoas que estavam no local.
– Ei,  tá pronta para ir? – disse um rapaz de cachos dourados.
    Ele se chamava Felix. Félix foi a primeira pessoa que Letícia conheceu quando chegou em São Francisco.
   Fazia seis meses que ela tinha se mudado por conta de um estágio que havia conseguido em uma empresa de jogos chamada Dark House Game Studios. Era o sonho de Letícia trabalhar em criações de jogos, e viu uma ótima oportunidade quando a Dark House anunciou que estava abrindo vagas de estágios para brasileiros. Letícia logo tratou de se inscrever para concorrer a uma das vagas. O processo de seleção durou quase três meses, e depois de um longo processo de seleção, Letícia foi selecionada.
    Letícia ouve dedos estalando em sua frente, fazendo ela voltar sua atenção para Félix.
– Então? Você quer ir embora agora? – Felix pergunta novamente.
– N-não, acho que vou ficar mais um pouco. – gaguejou Letícia.
– certeza?
– sim.
– Então passo na sua casa mais tarde.
– Mais tarde?
– Sim, para nos irmos para o bar, ou você já desistiu?
    Letícia andava deprimida, pois fazia quase um mês que ela havia terminado com sua namorada. E naquela manhã Félix veio com dois convites para uma exposição da Alex Leblanc, a qual Letícia era muito fã. E dês que os dois saíram de casa ele não parava de falar sobre um bar que a Zoey – uma amiga em comum que Félix estava interessado - havia lhe apresentado, e ele queria levar Letícia para tentar esquecer sua ex.
– Claro que não  – Letícia dá um soquinho no ombro de Félix. – Você insistiu tanto que eu fosse, e a Zoey vai estar lá, quem sabe eu tenha alguma chance com ela.
– Nem pense nisso, – Félix sabe que Letícia nunca faria algo assim sabendo que ele tem interesse em Zoey, e ele estava certo, Letícia nunca faria algo desse tipo. – passo na sua casa às 08h, okay?
– Okay. – os dois se despedem com um soquinho.
    Logo depois que Félix vai embora, Letícia vê aquela mulher passando de volta. Ela parecia estar irritada, e logo atrás dela via uma outra mulher um pouco mais alta que a Letícia.
– EMMA ESPERA!!! – falava a mulher que via logo atrás dela.
    " Então ela se chama Emma." Pensou Letícia.

   Letícia adentrou o seu apartamento e se jogou em sua cama. O apartamento se resume a um quarto com uma cama, uma tv, um videogame, um espaço que seria a cozinha, e um banheiro que provavelmente só cabia uma pessoa. Foi o mais digno que Letícia pode pagar. Ela tira os sapatos, pega o seu laptop para iniciar uma chamada de vídeo. Depois de um tempo alguém finalmente atende.
– Olha quem lembrou que ainda tem irmã. – disse Carol, a irmã mais velha de Letícia.
– Até parece que eu não te liguei ontem.
– Ontem? Achava que fazia um mês.
    As duas riram por um tempo.
– Então? Como você está hoje? – perguntou Carol de boca cheia.
– Na verdade estou ótima, e é falta de educação falar de boca cheia.
    Carol mostra o dedo médio em um gesto vulgar, e Letícia responde com o mesmo gesto.
    Carol e Letícia sempre foram próximas, e compartilhavam tudo, tanto é que ela foi a primeira pessoa que Letícia contou que era gay. Foi em uma noite, Letícia tinha 14 anos, Carol havia acabado de chegar do seu trabalho. Letícia estava nervosa, mas tinha que contar aquilo para alguém, não aguentava mais guardar aquele segredo, e sua irmã era a melhor pessoa para ela contar. Letícia foi até Carol, respirou fundo, e disse, "eu sou gay", e logo depois ela começou a chorar, Carol abraçou a sua irmã mais nova e disse que estava tudo bem.
– Você tem algo para me contar não é? – Carol sempre sabia quando Letícia queria lhe contar algo.
– Você me conhece bem.
– Não me diga que é sobre a Laura, porque eu já não aguento mais essa garota.
– Não é sobre ela.
– E é sobre o que?
– Eu fui hoje para uma exposição da Alex Leblanc.
– Espera, não vai me dizer que ela estava lá, por que é muito provável que eu tenha um ataque cardíaco. – disse Carol enquanto colocava a mão em seu peito.
    A Alex Leblanc nunca apareceu em público, era algo que todos esperavam acontecer. Sempre havia notícias de que ela finalmente iria revelar sua verdadeira identidade, mas nunca eram notícias verdadeiras. Uma vez até apareceu um homem dizendo que se tratava dela, e que usava um nome feminino porque seus quadros eram muito femininos, mas logo foi comprovado que também era só mais uma mentira.
– Não foi isso. – Letícia revirava os olhos.
– Então me fala de uma vez o que foi.
– Eu vi uma garota hoje durante a exibição, ela era linda, provavelmente a mulher mais linda que eu já vi na minha vida. – havia um brilho em seus olhos, algo que Carol não via nos últimos dias.
– Você falou o mesmo da Laura.
– Você é bem estraga prazeres às vezes.
– Não, espera. – havia um sorriso no rosto da Carol. – você falou com ela?
– Na verdade não, só vi quando ela entrou, e quando saiu, e aliás, parecia estar bem brava.
– Então você nem sabe como ela se chama.
– Emma, o nome dela é Emma.
– É meio bizarro você saber o nome de alguém depois de ter visto uma unica vez.  Vai me dizer que você é algum tipo de stalker, e que tá seguindo essa garota a dias. – Carol fala com um tom de brincadeira.
– O quê? Não, tinha uma mulher gritando o nome dela na galeria.
    Letícia escuta um choro de beber no meio da chamada.
– Droga, ele acordou. – disse Carol. – preciso ir, depois a gente conversa.
– Okay, pode ir cumprir o papel de boa mãe.
    As duas encerram a chamada de vídeo, e Letícia se levanta em direção ao banheiro.

Era quase 8h quando Félix bateu em sua porta. Letícia havia acabado de se arrumar.  Felix usava o seu cabelo amarrado para trás, vestia uma camisa de manga longa da cor vermelha, e uma calça jeans. Ele não era muito bonito, mas existia um charme que encantava as garotas, além da simpatia.
– Nossa! Você tá muito bonita. – Félix sempre costuma fazer esse tipo de comentário sobre Letícia, mas nunca existe malícia vindo de suas palavras.
    Letícia usava uma jaqueta preta, com uma blusa vermelha por dentro, seu cabelo era curto e loiro, com um dos lados raspados. Ela pega seu celular junto com sua carteira e chaves, tranca a porta, e os dois seguem no corredor.
   

    Ela estava na garupa de uma moto, agarrando a cintura de Félix. A moto não é dele, e sim de um colega de quarto, que o emprestou naquela noite. Letícia não conseguia parar de pensar em Emma, imaginando se voltaria a vê-la.
    Depois de um tempo eles chegaram ao bar que ficava na Kearny Street. Era um bar relativamente grande,   estava escrito Charlie's Bar com letras neon, que brilhavam em um tom vermelho escarlate. Felix estacionou a moto, e logo em seguida os dois entraram. O lado de dentro era bem aconchegante, havia dois andares, no de baixo tinham algumas mesas, logo à frente ficava um balcão, com três barmans atendendo as pessoas, e a alguns metros à esquerda, havia um palco, com vários instrumentos. No andar de cima era repleto de mesas e pessoas socializando.
     Felix parecia procurar alguém no meio daquelas pessoas, quando uma mão se ergueu acenando para eles.
– É a Zoey. – comentou Letícia.
    Zoey saltou de onde estava, vindo em sua direção..
– Você veio. – disse Zoey segurando as mãos de Letícia.
    Zoey era programadora na Dark House, ela era só um pouco mais alta que Letícia, seus cabelos eram longos e vermelhos, o seu rosto era repleto de sardas. Ela trajava um vestido preto, com uma fita vermelha na cintura.
– O Felix me convenceu a vim. – disse Letícia olhando para Félix.
    Zoey não largava a mão de Letícia.
– Vamos, Preciso lhes apresentar alguém. – Zoey agarrou a mão de Félix, e puxou os dois.
    Eles foram até o balcão, havia um barman, no seu crachá estava escrito Bill.
– Cadê a Emma?
"Emma?"
    Bill apontou para o palco.
"Emma?"
    Zoey os guiou até o palco, desviando de todo mundo que estava no caminho.
– Ei Emma! Esses são os meus amigos que eu queria que você conhecesse.
    Quando ela se virou, Letícia não podia acreditar no que estava vendo em sua frente.

Letícia & Emma.Onde histórias criam vida. Descubra agora