Cap. 3 - A Sra. Jauregui (Parte II)

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Há um ar de excitação na sala enquanto Marco explica ao elenco suas ideias para a peça. Todos ouvem e assentem e boa parte faz anotações em seus roteiros. Lauren, entretanto, não está segurando um texto, mas inclinada e franzindo a testa, concentrada.

Agora há uma energia nova nela. Certa agressividade, como se houvesse uma nuvem negra perseguindo-a, puxando suas sobrancelhas para baixo e lhe trincando os dentes. Eu sei que isso se tornou parte do seu apelo, mas estou curiosa em saber como essa história começou.

Lauren está sentada ao lado de Lucy, sem tocá-la. Na verdade, quando ela se inclina para sussurrar algo em seu ouvido, um flash de irritação atravessa seu rosto antes que ela a afaste. Lucy observa o entorno para ver se alguém notou. Quando ela olha em minha direção, eu diplomaticamente volto a fazer anotações no meu laptop.
É reconfortante saber que elas não são sempre tão abençoadas quanto aparentam em suas fotos. Isso faz com que pareçam mais humanas.

Não posso nem imaginar como é ser noiva da mulher mais desejada do mundo. Não é segredo que Lucy recebe ameaças de morte regulares e é alvo de desaforos e xingamentos nas redes sociais por parte dos fãs mais raivosas de Lauren. Se fosse comigo, eu estaria completamente paranoica, mas ela sempre parece animada e otimista.

Deve ser exaustivo permanecer positiva e centrada como Lucy faz. Mesmo que esteja deixando uma aula de spinning, ela parece recém-saída das páginas de uma revista glamurosa de boa forma.

Boa forma é só mais uma coisa que ela e Lauren têm em comum. Eu sei que o negócio delas é serem bonitas, mas, honestamente, ninguém precisa se esforçar tanto quanto elas. É errado e artificial. Minha ideia de ginástica envolve calças de ioga, sem a ioga de fato.

Na verdade, minhas calças de ioga deveriam ser chamadas de "calças de ficar sentada e comer queijo". Um nome mais longo, claro, porém mais preciso.

— Meu comentário final é... — diz Marco — mesmo que A Megera Domada seja uma peça facilmente vista como sexista, temos o objetivo de desfazer essa percepção. Lucy fará uma Catarina cuja amargura vem de sua falta de vontade de se conformar com a definição do papel da mulher pela sociedade, assim como uma reação ao favoritismo óbvio do pai pela irmã.

Petruchio não será seu domador, mas seu parceiro no crime. Meu objetivo é mostrar à plateia, um casal que traz o melhor um do outro, que se alimenta dos desejos sexuais inusitados um do outro e que consegue fazer graça com aqueles que tentam fazê-los ser o que não são.

Ele junta as mãos e sorri.
— Então, com tudo isso em mente, vamos ver o que criamos juntos. Vamos fazer a primeira cena. Em suas marcas!

Pelas próximas horas, ensaiamos as três primeiras cenas do primeiro ato.

A princípio, Lucy é boazinha demais como Catarina. Depois que Marco lhe pede que seja mais forte, ela exagera e, aos berros, faz as cenas de Catarina com a irmã e com o pai como um Mensageiro da Morte que os partirá em pedaços. Tipo uma Lizzie Borden.
Não sou a diretora-geral, mas acho que Marco vai insistir que ela tenha um pouco mais de sutileza.

Lauren, por outro lado, é excelente de primeira. Seu Petruchio é apaixonado e carismático e ela tem ótima química com os atores que fazem seus servos e amigos.

Estar novamente com ela na sala de ensaios me lembra o quão hipnotizadora Lauren é de perto. Tenho vergonha de dizer que assisti à série Rageheart vezes demais para contar. Mas por mais poderosa e intensa que Lauren pareça ser na tela, ela é ainda mais ao vivo. É revigorante vê-la fazer um papel tão diferente daquele demônio inquietante e violento.

Sua versão de Petruchio é um malandro adorável e quase havia me esquecido como é linda quando sorri. Ela não fez isso muitas vezes quando massacrava aqueles lordes-anjos-sádicos.

CAMREN: Impiedoso Coração (G!P)Onde histórias criam vida. Descubra agora