Capítulo V

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toc toc alguem por ai? Comentem por favor...

[...]

Em dois dias Elliot estava de volta a Severalls, preso em seu quarto sem qualquer contato com objetos que poderiam oferecer risco para sua vida ou de outra pessoa.

Ele estava sendo vigiado o tempo todo como um pássaro em uma gaiola e ficou assim por alguns dias até Alexia dar um voto de confiança e deixar ele vagar livremente pelo hospital como sempre fez.

Naquela noite fiquei até mais tarde revendo prontuários médicos, já havia se tornado rotina, perdia a maior parte do final de semana para corrigir medicamentos e ficar analisando receituário antigo. Não estava atolado de trabalho, apenas não possuía nada mais interessante para fazer em meu apartamento, além de ficar enfurnado no consultório me livrava de ter que enfrentar Zoe, que sutilmente tentava se aproximar de mim para darmos continuidade ao que fizemos na noite após o bar. Infantilidade da minha parte? Obviamente, mas prefiro não ter que lidar com isso agora, já que posso empurrar esse problema para meu eu do futuro.

Já passava da meia noite quando resolvi pegar novamente o prontuário do Elliot. O caso daquele garoto estava me intrigando de uma maneira que nunca havia acontecido. Sua foto de quando ainda era um jovem menino de quatorze anos presa com clips junto às folhas.

Ele era tão novo, me pergunto o que se passava em sua cabeça quando decidiu assassinar seu próprio irmão. Dizem que não se deve tentar entender a mente de um louco, pois isso pode torna-lo tão louco quanto, mas a sensação de Elliot não estar dizendo o que aconteceu naquele dia me incomodava.

Ele estava quase completando quatorze anos e afogou a sangue frio o irmão de dezessete na piscina olímpica de sua casa.

A mãe e o padrasto o encontram três horas depois, chorando debruçado sobre o corpo do irmão, no julgamento ele parecia tão assustado que mal conseguia falar e sempre dizia que não havia sido ele.

Fechei os olhos e suspirei, a falta de uma noite de sono adequada começando a mostrar presença. Precisava ir para casa e tomar um banho para conseguir trabalhar e pensar melhor. Massageei o pescoço dolorido e tirei o jaleco pendurando-o em meu antebraço, peguei minhas coisas e sai do consultório rumando a saída entre os corredores silenciosos do sanatório.

Nunca fui uma pessoa medrosa, mas o som engasgado que escutei me fez congelar. Cinquenta mil imagens de assombrações passaram pela minha cabeça para depois vir imagens de pacientes se enforcando e engasgando por falta de ar, tremi dos pés à cabeça, meu corpo me puxando para sair o mais rápido possível daquele lugar, mas meu instinto médico guiou-me para perto do som que parecia mais alto.

A porta entreaberta da sala que estocava produtos de limpeza me chamou atenção, segui para perto e o som aumentou, passou para gemidos e suspiros contidos. Eu já tinha ideia do que estavam fazendo ali e poderia dar meia volta e ir embora, deixar que eles fodessem em paz, mas a curiosidade de ver quem estava quebrando as regras no meio da madrugada para transar falou mais alto.

Em cima da pequena mesa que se encontrava no centro da sala não havia os desinfetantes ou papeis para higiene, estes estavam espalhados pelo chão. A luz fraca da luminária clareou o rosto de quem estava deitado de costas sobre ela, os cabelos loiros espalhados pela mesa. Ele abriu os olhos e olhou para a porta entreaberta, me observando em silêncio, os olhos tão vazios quanto a primeira vez que o vi.

Senti a bile subir até minha garganta quando meu estômago embrulhou como se tivesse levado um soco. Porque quem estava sobre a mesa era Elliot e quem estava entre suas pernas era ninguém menos que Noah, o segurança.

Ele me observou por alguns segundos, fechou os olhos novamente e virou o rosto para o lado oposto, evitando meu olhar abismado. Noah tinha o rosto enterrado em seu pescoço farejando-o e gemendo como um urso devorando uma presa, sequer viu que eu estava ali.

Meu cérebro entrou em parafuso. Meus pés andaram sozinhos para fora daquele lugar, sequer sei como consegui dirigir. Meu estômago me traiu assim que abri a porta do apartamento, vomitei ali mesmo e meu corpo vibrou em nervosismo, andei até o banheiro, tomei banho e limpei meu vômito de maneira automática. Minha mente paralisada em algum lugar que eu desconhecia.

Depois que estava sentado a mais de meia hora olhando para a televisão desligada finalmente voltei a raciocinar.

Elliot estava sendo abusado e só Deus sabe por quanto tempo isso vem acontecendo. Um calafrio passou pela minha espinha arrepiando minha pele.

Na manhã seguinte, fui para Severalls com uma determinação que encheu meu peito. Iria denunciar Noah para a diretoria do Hospital, a ideia desse homem puder estar fazendo isso com Elliot desde que ele tinha quatorze fazia minha ânsia voltar e pensar que ele pudesse estar fazendo isso com mais pacientes tornava tudo pior.

Antes de eu ir oficialmente ao escritório de Alexia e Caleb, iria solicitar a presença de Elliot em meu consultório, precisava tirar aquela estória a limpo para poder ir até o final.

Para minha sorte, Elliot apareceu sem ser chamado, entrou em silêncio e sentou-se em seu lugar de costume em frente à minha mesa.

"Doutor." – ele cumprimenta, procurando um cigarro nos bolsos.

" Elliot..." – suspiro olhando-o atentamente. –"O que eu vi ontem..." – ele me corta sem que eu possa terminar, olhando-me sério como se eu estivasse sendo inconveniente.

"Você não viu nada ontem." – ele diz firme. – "O que você pensa que viu não tem nada a ver com você."

"Ele está abusando de você, Elliot. Me pergunto a quanto tempo isso pode estar acontecendo." – digo vendo-o arregalar os olhos. – "Não precisa ficar com medo, irei proteger você, ele nunca mais irá tocá-lo." – digo segurando sua mão sobre a mesa para passar segurança, mas ele a tira rapidamente.

"Ele não está me molestando. Eu permito qualquer contato que ele já tenha feito em mim." – ele responde, uma convicção que me surpreende. – "Eu não fui estuprado, doutor, pare de pensar besteiras nessa sua cabeça." – ele diz puxando um humor na voz que eu não estou disposto a aceitar.

"Não entendo como pode deixa-lo tocar você assim. Isso é... não sei... há quanto tempo acontece? Por que permite isso?" – questiono confuso com sua declaração, temendo que ele estivesse protegendo Noah e, mais ao fundo do meu peito, eu torcia para que ele não estivesse permitindo isso por estar apaixonado pelo segurança.

"Como acha que eu consigo os cigarros?" – ele pergunta o olhar tornando-se morno por minha nítida preocupação com ele. – "Como acha que posso vagar livremente pelos corredores em qualquer horário?" – ele estava trocando sexo por regalias e isso me entristeceu.

"Não precisa disso, Elliot. Está se prostituindo por cigarros? Posso trazer alguns se quiser, posso deixar que fique em minha sala caso queira ficar um tempo sozinho. Apenas não faça mais isso." – novamente para minha surpresa ele riu, um riso fraco e amargo. Quietamente ele olhou para mim por alguns segundos, talvez ponderando se falaria algo ou não.

"Não é apenas pelo cigarro. Desde que entrei nesse lugar tentaram me matar mais vezes do que posso contar nos dedos. Ele me protege, Jacob." – ele sussurra, é a primeira vez dizendo meu nome e ele diz de uma maneira amedrontada. – "Não é apenas pelos cigarros."

Naquele momento, ele parecia mais são do que qualquer um que já conheci.

Lost Boy {Romance Gay}Onde histórias criam vida. Descubra agora