Capítulo VII

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Naquele mesmo dia fui atrás de Katherine, a ansiedade quase tomando controle do meu corpo por minha recém-descoberta, meus pés vagando por conta própria por aqueles frios corredores.

Os cinco anos perdidos de Elliot pesando em minha consciência mesmo que eu não estivesse envolvido em seu julgamento.

Encontrei Katherine na sala de estoque de medicamentos, estava fazendo listagem daqueles que estavam em falta para solicitar uma compra para Alexia. Eu entrei e a esperei notar minha presença, usei esse tempo para tentar pensar em como abordar esse assunto tão delicado, mas nada significativamente bom veio em minha mente.

"Doutor." – ela cumprimentou após um leve sobressalto por me ver encostado no batente da porta em silêncio.

"Katherine." – eu cumprimento de volta. - "Preciso falar sobre um assunto complicado com você." – começo, desencostando do batente da porta e me aproximando dela.

"Aconteceu algo com algum paciente?" – ela pergunta, devolvendo uma embalagem de medicamento na prateleira para poder me ver melhor.

"Não. É sobre o caso do Elliot." – acrescento.

"Sim, o que há de errado?" – ela pergunta confusa, descendo da pequena escada que usava para alcançar as prateleiras mais altas e me dando toda sua atenção.

"Tenho fortes indícios que Elliot não cometeu o crime que há em seu prontuário. Na realidade, talvez ele sequer tenha qualquer tipo de doença psicológica." – sou direto e a vejo franzir as sobrancelhas.

"Doutor...?"

"Me escute." – peço. – "A maneira como ele age e fala, não parece insano, ele parece exausto. Ele sequer sabia nadar quando matou o irmão afogado, que era campeão municipal de natação. Elliot tinha metade do tamanho do irmão e não possuía arranhões no corpo ou qualquer hematoma." – tento mostrar os fatos da melhor maneira que encontro.

"Jacob..." – ela tenta contrapor algo, mas a interrompo antes que eu perca minha linha de raciocínio, agora que eu havia começado precisava esclarecer tudo até o final.

"Acredito que o padrasto ou até mesmo a própria mãe poderiam ter planejado isso. Eu entendo que é uma acusação grave, mas..."

"Jacob!" – ela grita para chamar minha atenção e eu paro de falar assustado com sua reação. – "Você está se escutando? Você levou em consideração alguma coisa que eu disse sobre Elliot quando você começou a trabalhar aqui? Não posso acreditar que ele já está fazendo sua cabeça." – ela diz nitidamente decepcionada, cruzando os braços sob o peito.

"Ele não está fazendo a minha cabeça, Katherine. Eu simplesmente estou percebendo pelas atitudes dele que talvez possa ter acontecido um erro e alguém foi condenado injustamente."

"Venha comigo." – não é um pedido, é uma ordem. Ela ruma para meu consultório, uma confiança invejável e uma determinação no olhar que me fez duvidar de meus argumentos bem antes dela contrapor.

Katherine vasculha as gavetas dos prontuários médicos e agarra a ficha médica de Elliot completamente confortável com o ambiente mesmo que o consultório não fosse seu.

"Paciente declarado incapaz de viver em sociedade. Possui esquizofrenia herbefrenica." – ela vasculha as prateleiras e puxa um livro de transtornos psíquicos e então olha para mim. – "Definição de esquizofrenia: alteração cerebral que dificulta o correto julgamento da realidade, paciente pode ter delírios tendo a certeza de estar sendo perseguido ou prejudicado de alguma forma, tendo a sensação de estar sendo vigiado e traído por quem mantem contato, tornar-se violento e evitar interagir com pessoas." – ela termina de dizer e volta os olhos para o prontuário.

"Katherine..."

"Paciente possui tendência sociopata e há suspeitas de distúrbio de identidade dissociativa. Definição de sociopatia: psicopatologia que provoca comportamento impulsivo, hostil e antissocial. Individuo não tem apego a valores morais e é capaz de simular sentimentos para manipular as pessoas."

"Katherine, por favor..."

"Distúrbio de identidade dissociativa: indivíduo possui duas ou mais personalidades, podendo agir de maneiras diferentes em uma mesma situação." – ela termina, fecha o livro e o prontuário e entrega para mim colando-os contra o meu peito. – "Você, como psiquiatra formado, deveria mais do que todos nesse hospital saber a definição desses transtornos." – ela diz rígida e é como se ela fosse a médica e eu apenas um jovem estudante, senti a vergonha manchar minhas bochechas de vermelho rubro, ela estava me lembrando tudo durante a graduação com basicamente um tapa na cara, ensinando-me como julgar o comportamento de um paciente.

Ela suspira olhando-me tristemente passando por mim e parando na porta. – "Ele sabe nadar, Jacob. Já ouviu falar sobre a família Rurik? Não há nada que eles temam, porque eles enfrentam seus medos. Elliot entrou em uma escola de natação logo após o ocorrido do quase afogamento. Ele sabe nadar, doutor."

Abraço o livro contra mim, sentindo meu estômago embrulhar. - "Eu não entendo... ele confirmou para mim que não sabia nadar, eu..." – meu raciocínio parecia embaralhado e eu não possuía mais certeza de nada.

"Estamos falando de um paciente com esquizofrenia, Jacob. Não sobre um colega de trabalho ou um amigo. Você não é o primeiro que cai na mesma teia de mentiras dele, mas espero que seja o último. Não esqueça em qual posição você e ele estão, você é o médico dele e é isso que irá mantê-lo são nesse lugar. Porque no momento em que você começar a duvidar de si mesmo e dos outros ao seu redor será o momento que teremos que afastá-lo."

Desviei os olhos para o chão, com as bochechas tão vermelhas quanto labaredas, a vergonha tomando conta até a raiz do meu cabelo. Ela passou pela porta sem dizer mais nada, o peso do silêncio parecendo me sufocar naquela sala.

Minha mente transbordando de confusão e duvidas como se tudo estivesse embaralhado, parecia uma enorme piada em que todos estavam rindo e eu era o motivo dela.

Segui para trás da mesa do meu consultório e despenquei na cadeira, vasculhei novamente o histórico de Elliot vendo sua matrícula em uma academia aos 5 anos até os 12, mais tarde descobri que se tratava da escola a qual ele fazia aula de natação, confirmando as palavras de Katherine.

Naquele momento, eu já não sabia o que era verdade ou mentira, ou em quem eu deveria acreditar, mas o peso de ser médico tendo tantas responsabilidades e me manter são pesavam sobre meus ombros e eu teria que escolher um lado, mesmo que eu não quisesse.

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