Dia 4

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Eu não fazia ideia da hora, talvez fosse meia noite, talvez quatro da manhã. Mas, o que eu sabia era que eu estava andando há muito tempo, com a sensação de que estava andando em círculos. Os corredores e escadas obscuras me fazia pensar o quão grande era aquele lugar, se tem uma entrada, deve ter uma saída. Passo as minhas mãos pelas paredes ásperas dos corredores, sentindo que cada vez mais elas estavam machucadas. As trevas me cobriam, criando formas aterrorizantes na minha mente, o meu coração batendo extremamente rápido, monstros subiam pelas paredes, imóveis, mas com a sensação de movimento. A cada passo era uma vontade desesperadora de gritar, eu tenho que continuar , pensei. Depois de aproximadamente duas horas andando sem parar, entrando em corredores e subindo e descendo escadas, me bati em uma porta, estava com medo e receio de ser a mesma que eu havia entrado, tomei coragem e abri, ela era pesada, mais pesada do que a grande prateleira que eu havia entrado. Um enorme facho de luz cegou-me, iluminando tudo ao redor, quando me acostumei com a iluminação fiquei surpreso que já era dia, tinha se passado rápido demais, tão rápido que eu não estava com fome, olhei para trás me despedindo do enorme labirinto que arrodeava todo o prédio.
Andei em direção à biblioteca para esconder todas as provas que me incriminavam. Andei pelo pátio central e fui abordado pela Irmã Rebeca, uma das freiras mais jovens do manicômio e seguidora da Irmã Verônica.
-Bom dia, estávamos te procurando por todo o lugar – ela falou estressada. A Irmã Rebeca era muito jovem, não passada dos vinte e sete anos. Mas, se comportava como a Irmã Verônica. – O senhor não compareceu para o horário do café da manhã.
-Desculpe, ontem a noite eu acho que comi demais, acordei cedo e fique caminhando pelo pátio para ver se chegava a fome – Tentei enrolar o máximo possível. Me afastei dela para não perceber o terrível cheiro de mofo que eu carregava. – Irei pegar um livro e comer lendo.
-Certo. Mas, fique sabendo que se aprontar, as consequências serão graves. Se lembre que a Irmã Verônica é famosa por aplicar as provas do senhor para pagarem seus pecados.– Ela falou e saiu andando – Ah, mais uma coisa
-Sim
-Tome um banho, você está imundo. – Continuou a andar
Fui as pressas para a biblioteca. Mas, não passei por ninguém que fosse me atrapalhar. Ao chegar lá, me surpreendi, pois, havia uma pessoa na biblioteca, tentei disfarçar pegando um livro qualquer e me sentando próximo ao esconderijo. Era uma mulher que estava lá, eu nunca tinha visto ela por aqui, tinha cabelos ruivos escuros e olhos cor de mel. Analisei ela todo o tempo em que estava lá, esperando-a partir o mais rápido possível. Já era praticamente o horário do almoço, ela se levantou, guardou o livro e foi embora, na saída ela olhou para mim, acenou com a cabeça e partiu. Será que ela sabe? Pensei.
Corri para o lugar guardar meus itens preciosos, minha fuga. Segurei o máximo a ansiedade de ler todas, então, para matar a minha insaciável ansiedade, peguei uma das fichas.
Carol Lovack
Nascimento: 21/11/1929 Sexo: Feminino
Responsável: Família não consta Sentença: Criminal
Assassinar três donas de casa. Os vizinhos ouviram gritos seguidos de tiros. A paciente informa não recordar de nada e apresentar constante perca de memória. Exames informam que não apresenta mudança de personalidade. Teste psicológico consta paciente agressivo.
Data do julgamento: 13/05/1969
Julgamento: Em andamento
Deficiência: Mental
Advertência: Extremamente perigosa. Mantê-la sedada
Forma de tratamento:
Banheira de vaporização
Cadeira de choque
Fiquei pasmo com as imagens que haviam lá dentro, aqui não era um simples manicômio, era uma instituição mental para criminosos. Comecei a pensar quem eu sou e o que eu fiz naquela noite.
Estava tonto, não sabia o que fazer, eu não me lembro de nada que aconteceu na minha vida anterior, não sei quem eu sou. Após me recuperar, joguei todos os documentos no chão em busca do meu nome, sem sucesso. Decidi guardar tudo, olhei ao redor avistando se vinha alguém, então me retirei da biblioteca, andando me batendo pelos corredores, cansado e exausto. Fui para os banheiros, só agora percebi que eu não tomei banho desde que cheguei aqui, tomei um longo banho, o fedor daquele escuro labirinto estava em mim, ao sair do banheiro fui comer, a fome tinha chegado com força dessa vez. Caminhei até o meu quarto e lá fiquei pensativo, esperando a comida chegar no quarto. Ouvi batidas na janela, me levantei da cama, fiquei na ponta dos pés e avistei quem era, o mesmo que me deu as chaves.
-Pelo visto você não foi pego – disse ele
-Caso eu fosse não estaríamos conversando agora – Tentei olhar a sua cara pensando no que ele queria.
-Eu quero a lâmina – Ele falou em tom de seriedade. – Caso contrário os guardas que irão ficar com ela.
-Certo, me encontre no banheiro, eu tenho que pegar de onde eu escondi. - Tinha esquecido completamente da lâmina.
-Okay, mas se você não encontrar... – Um silêncio pairou no quarto. Ele se retirou e foi embora.
Para a minha sorte ainda não tinha chegado o toque de recolher, fui até a biblioteca, peguei a lâmina e escondi no bolso, no caminho driblei o máximo de guardas e freiras possíveis. Cheguei no banheiro e ele já estava lá, entreguei o objeto sem falar nada, dei meia volta e fui embora.
-Se lembre de uma coisa, quarto 114. Eu não consegui. Mas talvez você consiga– disse ele e sumiu na escuridão.
Voltei para o meu quarto sem saber o que isso significava, talvez nada pois não conheço ele, possa ser um louco qualquer. Forcei a minha mente em busca do meu passado, parecia como um martelo batendo em minha cabeça. Mas, não consegui nenhuma recordação. Ao chegar no quarto estava morrendo de dor de cabeça, talvez de fome. Me deitei, fechei os olhos por um instante e peguei no sono.

Manicômio  (versão original)Onde histórias criam vida. Descubra agora