Capítulo IV - queda

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Logo ao abrir a porta Márcio e Catarina se depararam com Rafael muito pálido, jogado ao chão de madeira, de imediato Márcio foi conferir o que tinha acontecido com seu amigo, ele estava suando frio, tremendo e sua voz saia tão baixa que era quase inaudível, ainda assim passava confiança para os dois dizendo que iria ficar tudo bem, quem dera Márcio tivesse esse auto conhecimento e essa autoconfiança, invejava Rafael, mas nas atuais circunstâncias não dava nem para invejar. Márcio carregou seu amigo que estava muito fraco, pelo peso errava algumas passadas e ameaçava cair, ainda assim chegaram ao hospital sem maiores problemas, a menina os seguia com uma cara angustiada, toda essa situação era algo novo e muito assustador para a jovem Catarina.
A cidade Verde não era grande, desse modo seu hospital também não era, porém já era o suficiente para tratar casos não tão graves, entraram na emergência e felizmente o atendimento foi rápido, Rafael entrou para um quarto na enfermaria, Márcio e a menina ficaram esperando até que o doutor voltasse com o diagnóstico. Catarina ainda com uma mente muito pura e infantil não esperava que nada de mal fosse acontecer com Rafael, até por isso chegou a conclusão que hospitais eram uma chatice, queria sair para brincar mas olhava para Márcio e rapidamente percebia que ela não conseguiria o que queria, de uma maneira quase que involuntária colocou sua mão sobre a mão dele. Foi quase como se falasse um "vai ficar tudo bem" e Márcio entendeu, sorriu para ela e voltou a fechar a cara e olhar para o chão, ela riu de volta e gostou muito da sensação que esse diálogo mudo havia proporcionado.
Márcio sempre pensava demais em situações como essa e estava cansado de esperar por algum diagnóstico da parte dos médicos, observava todos os detalhes para tentar não pensar no pior, tinha esses ataques de curiosidade. Antigamente acreditava que essa mania era algo ruim mas em momentos como aquele gostava de ter essa falha, no entanto acreditara já ter contado todas as linhas do chão, todas as portas do corredor e ter descoberto o nome de todos os doutores, agora tudo o que restava era esperar ainda mais, após mais alguns minutos Catarina deitou sobre seu colo e começou a dormir, chega babou, Márcio achou nojento porém riu.
De repente um doutor saiu da sala que Rafael se encontrava:

- Márcio, certo? - o médico perguntou.

- Sim doutor, sou eu, já tem alguma notícia para me falar? - Catarina continuava a segurar sua mão.

-Felizmente não foi nada demais, feitos os exames conseguimos perceber que ele está com uma deficiência sanguínea causada pela magia, a resolução para tal problema é fácil, é necessário apenas repouso e uma transfusão de sangue. Nada demais, em poucos dias ele vai estar de pé novamente, mas ele tem que ficar em acompanhamento para sempre.

-Entendi, que bom que vai ficar tudo bem com ele doutor, estávamos apreensivos- Márcio disse.

-Bem, imagino, relaxe, sob nossos cuidados tudo ficará bem, aliás nosso estoque de sangue está baixo, não gostaria de doar?

-Não havia pensado nisso ainda, porém quero sim doutor, algum dia alguém vai precisar como Rafael precisou!

-Certo, então preciso que o senhor vá até a recepção e preencha seu cadastro, preciso ir, obrigado.

Enquanto isso Rafael se encontrava em repouso em um quarto e Catarina estava em uma sala infantil pintada de verde, com vários brinquedos no chão e desenhos espalhados pela parede, transparecia muita felicidade em seu rosto e brincando chegou até a se esquecer tudo o que estava acontecendo. Algum tempo depois Márcio já estava nos corredores do hospital novamente, foi até uma área externa que se encontrava na parte do fundo daquele local, seria bom sair um pouco daquela atmosfera pesada, Márcio observou os arredores, amava ver a paisagem da cidade verde, tantas árvores e vida naquele lugar, o vento batia em seu rosto e ele fechou os olhos na expectativa de tentar se conectar novamente com a natureza, porém dessa vez foi em vão, uma forte ventania começou e algumas folhas voaram em seu rosto, ele se estressou e adentrou o hospital novamente.
Catarina já estava com um pouco de medo de Márcio ter a abandonado naquela sala, mas lembrou que ele era muito esquecido, então voltou a brincar, Márcio realmente havia esquecido a menina e estava vagando tranquilo por aquele ambiente quando de repente sentiu uma dor de cabeça muito forte, levou as mãos a cabeça que parecia estremecer, foi ao chão e ficou se retorcendo. Fora do hospital o vento aumentara tanto que árvores balançavam e pessoas não conseguiam ficar em pé na rua, começou a chover muito forte, Catarina estava muito assustada pelo som da chuva e pelas lembranças que passavam em sua cabeça, se encolheu em um canto e começou a chorar. Depois de um tempo Márcio conseguiu se recompor e se levantar, não entendera o que estava acontecendo ao redor do hospital, resolveu sair para ver o que acontecia, olhou para a chuva que caía torrencialmente, tanto que não dava para ver um palmo a frente, voltou para dentro e enquanto virava uma sombra passou por trás dele e antes que pudesse reagir fez um corte com uma faca em suas costas.
O ferimento reduziu a mobilidade de Márcio, não conseguia andar, ainda assim rastejou o máximo que pôde até não aguentar mais e parar poucos metros a frente, Catarina estava assustada com o que estava acontecendo, levantou de onde estava e saiu correndo pelo hospital desesperada, o vento continuava a aumentar de tal modo que o telhado do hospital balançava ameaçando voar, ela corria de maneira incansável procurando pessoas, porém não achava ninguém, era como se todos tivessem sumido, seus batimentos aumentavam e seu desespero crescia desordenadamente. Correu até achar uma saída, a chuva caía muito forte e ventava tão brutalmente que as portas de vidro do hospital já haviam se quebrado, muita água entrava, ela viu um corpo lançado ao chão poucos metros à frente das portas e correu para ver quem era, se aproximando um pouco mais viu que era Márcio, correu ainda mais rápido até que chegou no chão molhado e caiu, se pondo ao lado do corpo dele, começou a chorar.
As lágrimas escorriam incessantemente, pingando pouco a pouco nas grandes poças d'água que adentravam cada vez mais rápido o hospital em uma correnteza, era a segunda vez em poucos dias que presenciava pessoas importantes morrendo a sua frente e cidades sumindo do mapa. De repente seus olhos ficaram brancos, cada vez mais, de modo que aquilo já dominara seu rosto, um círculo de força aparecia ao seu redor, quando em um susto o teto foi brutalmente arrancado sobre suas cabeças, o vento estava incontrolável. Dentro do quarto do hospital Rafael dormia tranquilo até que pingos começaram a cair em seu corpo e ele acordou revoltado, ao olhar para cima viu o céu tomado por escuridão.

Cavaleiros da noite: a ascensão da escuridão Onde histórias criam vida. Descubra agora