Capítulo 2

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 Sentir isso novamente é estranho. Faz muito tempo, mas a verdade é que nós dois ainda sentimos algo, mesmo tentando esconder.

 Seus lábios vão em contato com minha nuca, o que me faz arrepiar mais ainda, se é possível. Fecho os olhos sentindo a brisa do mar que deveria ser gélida, mas ele não permite isso. O calor de seu corpo passa para o meu, suas mãos em minha cintura me viram para ele. Posso sentir que estamos próximos, mas não tenho a mínima coragem de abrir os olhos.

 -Para, Marshall... -sussurro.

 -Por quê? -seu nariz toca o meu.

 Não sei ao certo o que responder, na verdade, agora nada é certo. Nada quando se trata a respeito de nós é certo. Eu sei que nunca tivemos nada, aliás, nem sei o que temos, é um misto de amizade, carinho, amor e desejo.

 -Ainda não estou te beijando pra você ficar calada -socorro.

 Esse homem não é brinquedo não, quando quer ser terrível, consegue. Ele me dá um beijo na bochecha, tá bom, no canto da boca... e começa a rir ao passo que vai se afastando.

 Abro os olhos já vendo o barco deixar o porto e deslizo uma das mãos por minha testa. Me viro para o convés logo o vendo com aquela típica carinha provocativa. Vou andando até o moço numa tentativa de sair desse sol, ainda que fraco.

 -Você é insuportável! -paro de pé ao seu lado revirando os olhos.

 Ele passa o braço por meus ombros, permito isso me aninhando no mesmo e ficamos a olhar as águas agitadas pelo motor do barco.

 -Mas bem que você estava gostando -dou de ombros.

 -Você não é mais um pirralho de onze anos, Marshall, não podemos brincar com isso -realmente me preocupo.

 Ele sorri, não gosto quando faz isso, é sempre um sinal de que aprontou ou que vai aprontar mais ainda.

 -Você também não é mais uma princesinha de onze anos -rebate.

 É... nós dois crescemos. A verdade é que a idade nunca importou para nós, foi só amadurecermos um pouquinho para repararmos no que estávamos nos tornando e a convivência se tornar um pouco mais complicada, deixando a inocência de criança para o lado.

 O mais estranho é que, apesar das provocações e momentos quentes, nós não conseguimos falar sobre isso em si. Sobre o que temos ou, um dia, tivemos. A vergonha ou remorso se faz presente na maioria das vezes e não falamos mais nada.

 Odeio ficar em silêncio, ainda mais porque estamos indo pro trabalho e vou passar o dia todo olhando para a cara dele, esse rostinho lindo que... sossega Silvie!

 Me lembro de ontem a noite no jantar. O Sr. S nos contou um pequeno detalhe que, confesso eu, já estava suspeitando. Fazer o que? Todo trabalho tem fofocas.

 -Quem você acha que é o novo contratado? Estão dizendo que ele é um gato -comento.

 -Não sei não, mas só espero que a concorrência não seja forte -dou um risinho.- O quê? -ele próprio ri.

 -É difícil existir concorrência para você, Marshall -uma provocadinha.

 Sua risada aumenta e suas mãos me apertam mais contra si.

 Eu não estou falando? A gente não consegue sossegar, tem sempre que ter alguma provocadinha pra esquentar o dia.

 Finalmente avistamos o porto da plataforma sobre águas. O prédio preto e cinza parece bem futurístico, embora a cidade tenha alguns assim, como sempre, o Sr. S não quer que tenhamos uma vida fácil e insiste nessa dificuldade de locomoção.

(EM REVISÃO)New Deal.Onde histórias criam vida. Descubra agora