5- COGUMELOS E SA'SI (LIAM)

1.1K 289 176
                                    

Eu não entendia o que estava acontecendo. Eram sentimentos novos. Já havia estado com várias mulheres e nenhuma me fez sentir assim. Estava totalmente entregue a ela. Não conseguia parar de olhá-la, tudo me atraía. Seus cabelos, seu cheiro, sua teimosia...

Então a vi, saindo do rio toda encharcada, o vestido pesava tanto que fazia com que ela andasse cambaleando. Achei bem engraçado. Acabei soltando um riso alto, mas me contive para que não percebesse. Seu cabelo estava minguado, emoldurando o queixo que não parava de bater. Eu não esperava que fosse realmente entrar com roupa, ou pelo menos não com todas elas.

- Tire essa roupa. Você vai adoecer - disse a ela com um pingo de maldade.

- Eu não tirei antes, porque tiraria agora? - Maíra respondeu revoltada e se tremendo. Balancei a cabeça discordando e me sentei.

- Eu tenho uma capa. Está embaixo da sela do cavalo. Pode se cobrir com ela enquanto suas roupas secam. Eu fico de costas. Te prometo. Não imaginei que realmente entraria vestida - sentia culpa.

- Não podemos esperar. Provavelmente os soldados já estão à minha procura - respondeu, preocupada.

Eu não tinha ideia de quem poderia feri-la. E para ela isso também era um mistério, eu podia ver em sua mente. Era preciso protegê-la de alguma forma, tinha isso comigo. Existia algum propósito em eu ter visto seu futuro. Seria para tentar revertê-lo?

- De qualquer forma se cubra com a capa, pelo menos irá se aquecer e evitar me deixar molhado - insisti. Ela me olhou parecendo reprovar minha atitude. Pegou a capa e a colocou. Subiu no cavalo esbravejando algo que não consegui identificar, então decidi esperar sua raiva passar.

Seguimos cavalgando em direção oposta ao rio. O silêncio estava me incomodando. Em pouco tempo junto a ela, já estava me acostumando ao seu falatório.

- Está com muito frio? - perguntei enquanto caminhávamos, tentando olhar sua face por cima de seu ombro. Não vi sua expressão.

- Estou. Não vê que estou tremendo?

- Devia ter entrado só com a roupa de baixo pelo menos.

- Você falou que olharia - disse de forma seca e malcriada.

- Não disse isso! - retruquei.

- Como não? - perguntou afoita, virando o rosto para trás.

Logo parei o cavalo. Percebi que precisávamos nos acertar. Eu não compreendia esses costumes que ela seguia, mas sabia que eram importantes para ela. Não podíamos ficar brigados em meio a uma fuga.

- Eu não afirmei que te olharia, mas sendo honesto, tive medo de perder o controle - disse como se isso pudesse amenizar a sua raiva. Em seus pensamentos vi que havia me comparado aos outros homens e me ignorou.

Caminhamos por algumas horas sem nenhuma interação. Até Maíra finalmente se pronunciar.

- Liam... Liam... Eu estou com muita fome. Não comemos nada desde ontem. Eu preciso parar. Será que tem algo por aqui para comermos?

Estávamos indo em direção a uma tribo amiga, mas faltava um bom trecho. Então descemos e começamos a procurar por algo comestível.

-Tem cogumelos aqui. - Quase os colocava na boca.

-Esses não servem. - Retirei rápido de suas mãos. - São venenosos.

Em seguida, ouvimos uma risada. Alguém nos vigiava. Maíra me olhou assustada e se aproximou de mim.

- Tem alguém aqui, Liam. - falou baixinho.

- Eu sei. Está bem perto. Se você ignorar ele vai embora. Ele quer atenção.

- Mas quem é? Você o conhece? Não vi ainda. - Segurava meu braço.

- É um Sa'si. Não precisa ter medo - respondi, mas vi que ainda estava estarrecida. - Você quer que eu fale com ele?

- Quero sim!

- Mas precisa soltar meu braço - sorri, carinhoso. - Ou você quer vir junto?

Maíra se desprendeu rapidamente. Então eu fui até a pequena criatura. Os sa'sis eram conhecidos por suas artimanhas e travessuras. Ele certamente estava vislumbrado com a sua beleza. Seria difícil nos deixar em paz.

- O que você quer? - iniciei o diálogo.

- Vocês estão juntos? Ela sabe que você não é humano? - perguntou o sa'si.

- Por que você quer saber disso?

- Porque eu gostaria de conhecê-la também. Será que ela se incomodaria? Parece não ter medo de você.

- Olha, eu gostaria de ficar a sós com ela... - Arqueei a sobrancelha, afrontoso.

- Não sei se você sabe, mas eu moro nessa região - insistiu.

- Entendi, você vai querer algo em troca. O quê?

- Eu só quero que ela me dê um beijo - falou convicto de que ganharia essa disputa.

Voltei até Maíra e contei o que estava acontecendo. Já previa o seu comportamento histérico.

- Eu o vi. Não vou beijar aquela... coisa - tentava controlar o volume da voz - Você disse que era só ignorá-lo.

-Ele mora aqui. Você sairia de sua casa se alguém quisesse? - achava graça da situação. - Um beijo... Que mal tem?

- Beija você!

Continuamos a procurar por alimentos ao som de assobios, risadas e às vezes umas cutucadas. Ele era bem ágil. Eu podia sentir a paciência de Maíra se esgotando. Juntava a fome com a vontade de esganar aquele pequeno ser zombador.

- Já chega! Eu vou beijá-lo - gritou e saiu na direção de onde vinha os barulhos.

Queria ter visto a cena, mas fiquei aguardando seu retorno. Depois de alguns segundos voltou segurando um arranjo de flores. Olhou-me e sorriu. Não aguentei e comecei a rir sem parar.

- Para de rir. - Maíra me pediu gargalhando. - Ele falou que tem algumas frutas mais à esquerda.

- Quem disse, seu novo namorado? - brinquei. Já me sentia cada vez mais íntimo dela. Sua companhia me deixava bem, apesar de o motivo de tê-la não ser bom. - Ele se foi?

- Sim - respondeu, tentando se recompor das risadas.

Quando encontramos as frutas, Maíra parecia uma criança esfomeada se lambuzando, de modo que me fez lembrar do dia em que a conheci no jardim de sua casa.

- O que foi? - perguntou enquanto caminhava querendo algo mais. Sua fome parecia insaciável.

- Eu lembrei do dia em que te vi pela primeira vez.

- Hum... Eu almocei um carneiro delicioso naquele dia. Queria tanto um agora... quer dizer... me desculpa... - ficou constrangida.

- Te desculpar pelo quê?

- Porque você cuida dos animais. - Olhava bem dentro de meus olhos.

- Não tem problema se alimentar de um animal. Só não pode matá-los por prazer - expliquei.

- Olha, achei cogumelos... Esses eu tenho certeza que podemos comer - Maíra disse empolgada com um sorriso tão largo, novamente com aspecto de infância.

- Eu vou acender o fogo para cozinharmos eles - falei a observando e a admirando por se importar com o que eu prezava. Já estava fascinado.

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
DEUSES DA FLORESTA 1 | O Renascimento da feiticeira Onde histórias criam vida. Descubra agora