6- REVELAÇÕES (LIAM)

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Depois de nos alimentarmos, resolvemos descansar. As sombras das árvores estavam nos atraindo, nos deixando com sono, então recostamos cada um em troncos diferentes e começamos a conversar.

- Ainda está com frio e irritada? - perguntei com sarcasmo.

- Pelo contrário, já estou com muito calor. Fiquei bem próxima à fogueira enquanto comíamos.

- Que bom! Me desculpa dar a entender que te olharia. Eu deveria ter considerado a sua pureza. Sei que isso faz parte da crença do seu povo - disse a ela, me referindo às tradições de casamento que eu não assimilava muito bem. Logo depois, percebi o seu semblante mudar e quando desviou seu rosto da minha direção.

- Não sou mais pura - falou, cabisbaixa.

Reparei seus olhos molhados e a luta contra seus pensamentos. Tentava imaginar outras coisas para não me revelar. Eu sentia que estava envergonhada. Parecia ter se arrependido de contar, mas ao mesmo tempo tinha a necessidade de desabafar.

- O que aconteceu? Você não queria? - indaguei já certo da resposta, mas queria saber quem tinha feito esse mal a ela.

- Eu não queria... Meu noivo me forçou. Nós caminhávamos na floresta e... aconteceu.

Maíra parou por instante de falar para controlar sua voz, que mudava ao surgir a vontade de chorar. Ela queria se convencer de que havia superado. Então engoliu o choro e continuou a falar: - Está tudo bem. Já passou.

- Eu não entendo porque os humanos são tão maus. Como podem fazer algo a sua própria espécie? - falei indignado, com raiva.

- Nem todos são assim - defendeu enquanto pensava em seu pai, o responsável por arquitetar guerras em prol da Coroa. Maíra ainda não conseguia enxergar como isso era contraditório. - Você acha que Arlo poderia tentar me matar?

- Já havia cogitado ser ele. Você disse que o ama. Como pode amar alguém que te fez isso? - indaguei. Maíra não me respondeu, entretanto, entendi que havia mentido para mim. - Precisamos compreender a visão. Estamos fugindo, sem saber de quem e para onde - disse reflexivo. - A sereia falou sobre amar o que não deveria e mexer com forças maiores. Você mexe com bruxaria?

- Você acha que sou uma bruxa? -  ofendeu-se.

- Eu não sei. Não te conheço. Mas estou me arriscando por você.

- Sabe de uma coisa? Não precisa! É meu destino, não é? - tagarelou, irritada.

- Não vou deixar você sozinha... eu só acho tudo estranho. Até o que aconteceu a você e seu noivo...

- Pois bem, para sua surpresa, isso é bem normal entre os humanos.

Então ficamos nos encarando por alguns segundos. Desconfiávamos um do outro.

- Por que não me mandaram fazer nada? Nós somos responsáveis pela segurança na floresta. Não recebi ordem - perguntei a mim mesmo, em voz alta.

Os deuses da floresta nos avisavam sobre tragédias que poderíamos evitar. Estávamos ali a séculos cumprindo nosso papel de guardiões. Muita coisa mudou com a chegada dos estrangeiros. Eram numerosos, não se preocupavam em destruir tudo, não tinham temor algum.

- Eu não sei. Mas sei que não sou uma bruxa.

- Me desculpa. Eu só queria desvendar esse enigma, para o seu próprio bem - disse arrependido, mas sem me importar se de fato era uma. Eu só queria saber a verdade.

- Talvez não fosse pra você me defender. Talvez outro kurupi ou... Qual nome dos outros mesmo? - perguntou.

- Chullachaqui e caapora.

- É... isso. Talvez um outro de vocês devesse me defender, mas estava ocupado. Sei lá... - falou, mais calma.

Maíra sem querer me fez pensar na possibilidade de alguém ter descumprido algo. Havíamos encontrado uma área devastada na noite anterior. Era um sinal de que alguma coisa grande estava acontecendo. Eu não sabia se poderia ter alguma ligação a ela. Mas era nítido que eu deveria me preparar para uma traição em meio ao meu povo.

-Está tudo bem. Não precisa ficar com essa cara de bravo - disse ao se levantar e sentar ao meu lado. Depois disso, me surpreendeu ao acariciar meu rosto enquanto olhava em meus olhos. Parecia tentar fazer comigo o que eu estava fazendo a ela, lendo sua mente.

- Acho melhor não - interferi, retirando sua mão.

- Por quê? - sussurrou, se aproximando cada vez mais.

Ela não tinha o controle de seus desejos por mim. Eu implantava automaticamente um encanto, um tipo de sedução. Era algo que alguns da espécie possuíam. Eu não podia correspondê-la, seria desrespeitoso com ela. Então desviei o meu rosto e levantei.

- Vou dar uma volta.

- Vai me deixar sozinha? - ela retrucou.

- Eu acho que aqui não tem perigo - desconversei.

- Você acha? - indagou ela, se levantando e batendo o vestido. - Cadê aquele herói que me raptou no meio da noite a fim de me proteger? - ironizou. - Não se preocupe, não irei te atacar. De qualquer forma, eu acho que podemos ir. Já descansei o suficiente. - Maíra subiu no cavalo antes mesmo que eu pudesse concordar com o que disse.

-Tudo bem, eu vou a pé, estou cansado de cavalgar - respondi. Ela sacudiu os ombros.

 Ela sacudiu os ombros

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DEUSES DA FLORESTA 1 | O Renascimento da feiticeira Onde histórias criam vida. Descubra agora