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Tony Stark sempre fora tão teimoso quanto Steve no tocante ao trabalho — se é que poderiam chamar aquilo de trabalho, pois não raramente sua única recompensa era uma bela de uma dor de cabeça —, então era provável que pudesse ser esse o motivo maior de seus embates frequentes. E ainda que Steve não se arrependa de nada que fez sob seu dever enquanto cidadão, ele sente o peito queimar toda vez que se lembra do que teve de priorizar diante de algumas situações complicadas. Aquele maldito acordo de Sokovia era, sem dúvidas, o primeiro da lista.

Mas Tony, em suas imorredouras tentativas de evitar mais conflitos e morte e sangue, fora capaz de achar em si resquícios de uma bondade quase que maléfica ao perdoar Steve pelo imperdoável. Talvez fosse exatamente essa a culpa que até os dias de hoje pesava em seus ombros, divagou: o perdão que sabia, lá no fundo, nunca ter merecido. Não pela mentira, não pelo acordo — mas por ele ter ido embora. Por ter abandonado Tony depois de uma briga tão violenta, sangrenta e estúpida a níveis astronômicos; talqualmente às estrelas sobre as quais o mesmo tinha tantos pesadelos. Fora um ato impensado e infantil, da mesma maneira que fatal a ponto de matá-los simultaneamente antes mesmo de cada golpe desferido um no outro.

“Ele é meu amigo”, Steve tornou. Em sua voz havia cansaço e receio, como se temesse a repercussão de suas palavras assim que deixaram-lhe os lábios.

Eu também era.

Só que aquilo não era nem de longe uma verdade. Tony e Steve nunca sustentaram qualquer amizade significativa fora da equipe ou mesmo fora da Torre dos Vingadores, seu relacionamento se resumindo essencialmente às missões e às discussões com teor de brincadeira no dia a dia. Ademais, havia outros sentimentos que envolviam aquela resposta magoada do Homem de Ferro e com certeza nenhum deles beirava qualquer ressentimento pelo fim de uma amizade entre os dois — a qual nunca de fato existiu. Não, Steve entende hoje que nunca houve o que considerar entre eles nas questões de camaradagem. Não passou de uma afeição imatura, fetal, incompleta em todas as suas partes, sendo isso justamente o que a tornou frágil desde o início. Uma porcaria de pedaço de papel foi o bastante para destroçá-la, afinal.

“Vou sentir sua falta, Tony.” Steve murmurou sem pensar, tomado por um impulso que só lhe atacava na presença de Stark.

“Sério?”, Tony sorriu de canto. “É hora de me afastar um pouco.”

Mas não é, Steve queria ter dito. Fique aqui comigo. Você é minha casa. Por que o faria logo após Tony ter posto todos em perigo com suas paranoias sempre lhe foi um mistério, mas hoje ele entende. Steve vê agora que sua confusão a respeito do que sentia por Tony nunca foi realmente uma mera confusão. Era pura e simplesmente medo. Medo de amar um homem. Medo de amar aquele homem em específico, o mecânico egocêntrico que pensava demais para seu próprio bem. Como não pôde ver o herói em Stark assim que lhe pousou os olhos pela primeira vez? Deveria estar cego; cego pelos próprios princípios, pela própria arrogância.

Eles trocaram palavras leves e gentis no começo, como uma amizade acanhada permitindo-se aflorar aos poucos. Mas Tony Stark era tão teimoso quanto Steve Rogers e seus respectivos princípios sempre estiveram à frente de qualquer afeição que pudesse existir entre os dois. Então não, eles nunca foram amigos. O sorriso fácil do gênio jamais direcionou-se aos olhos azuis e solenes do soldado de forma que competia a amizade. Suas brincadeiras descontraídas sempre foram tão raras quanto rasas. Nunca houve profundidade, nunca foi uma amizade.

Capitão América nunca foi amigo do Homem de Ferro.

— Refletindo sobre a vida de novo, meu velhinho? — Tony surgiu no terraço, o despertando de seus devaneios. Steve apenas assentiu em resposta e assistiu calado enquanto Stark sentava ao seu lado, as rugas no canto dos seus olhos castanhos se aprofundado durante o seu sorriso espertalhão. Alguns fios grisalhos voaram em sua testa pelo vento frio de fim de tarde e ele os tirou do rosto de Tony, recebendo um pequeno “obrigado”. O moreno emendou: — Todo dia você vem pra essa varanda, parece que está esperando por alguém.

— Eu estou. — murmurou baixo, a rouquidão em sua voz a tornando mais áspera e grave.

Steve pigarreou e olhou para a frente, avistando Sam Wilson ao longe no parque. Ele voltou a encarar Stark e sua expressão agora era confusa. O gênio abriu a boca para questionar o significado das palavras de Rogers, contudo o soldado selou seus lábios carinhosamente em um selinho.

— Sorte a sua que tenho que ajudar Peter com a tarefa de casa, mas depois vai ter que me explicar direitinho quem é aquele cara. — Tony apontou-lhe o dedo indicador ameaçadoramente, no entanto seu tom era descontraído.

Steve apenas assentiu novamente, assistindo em silêncio enquanto Stark se afastava. Ele fitou suas mãos e sorriu para o anel dourado em seu dedo, ouvindo os passos rítmicos de Wilson se aproximando sobre a grama. Havia um sorriso pequeno nos lábios do rapaz quando ele parou em pé à sua frente. Sua figura era tão jovem quanto se lembrava e ele o olhou terno, em um misto de saudosismo e felicidade em vê-lo depois de tantos anos.

— Quer me contar sobre ele? — Wilson arqueou uma sobrancelha, apontando com o queixo para a direção que Tony havia seguido. Steve sorriu misterioso, meneando a cabeça.

Nunca foi uma amizade.

n/a:

não foi assim que aconteceu?

obrigada por ler!

𝙨𝙩𝙤𝙣𝙮 𝙤𝙣𝙚𝙨𝙝𝙤𝙩𝙨Onde histórias criam vida. Descubra agora