Páscoa desgraçada (terror)

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     Amanhã é a Páscoa. Grande dia. Todos ganham chocolate e saem festejando com quem amam.
     Aos 12 anos, já não acredito em coelho da Páscoa, mas, mesmo assim, adoro a véspera. Aliás, quem não gosta de ganhar uns chocolates?

     Faltava apenas uma hora para a tal véspera. Eram onze da noite. Meus pais já tinham ido dormir. Por minha vez, fiquei acordado até tarde, assistindo séries na TV da sala. Também fiquei contando os segundos para a meia-noite, que seria, consequentemente, o início da tão esperada Páscoa.
     Faltavam cinco minutos para o dia seguinte. Neste momento, o episódio que eu assistia terminou, o que deixou a casa num silêncio, onde só era possível ouvir os baixos estalos da geladeira. O clima ficou estranho e comecei a suar, embora estivesse frio. E, numa imagem rápida, algo passou pela janela. Era um vulto preto, não consegui ver a sua forma. Meu coração disparou. Encolhi-me ao canto do sofá, e lá fiquei, atento a qualquer coisa que aparecesse ou ecoasse ao meu redor.
     Poucos segundos neste silêncio amedrontador foi o suficiente para me colocar num pânico enorme. Nunca senti tanto medo na vida. Minha real vontade era gritar pelos pais, mas eu não tinha coragem de fazer isso.
     O silêncio foi interrompido por um ruído vindo do banheiro. Olhei para o mesmo rapidamente, o que vi foi o corredor escuro que levava ao lugar de onde vinha o som. Minha mente, neste momento, acreditava no pior, no desastre.
     Não sei como aquilo chegou ali, mas, no fundo do corredor escuro, vi uma sirueta na forma de um coelho gigante. De alguma forma, ele conseguia se destacar no escuro, era mais preto que o preto.
     Não vi nada além da sirueta. Era como se aquilo não tivesse face, como se apenas o preto fosse a sua cor, e nada mais. Entrei numa maldita êxtase quando vi aquilo. Era diferente dos filmes de terror, onde os personagens saem correndo. Eu, porém, não conseguia me mover, não importa o que fizesse ou tentasse fazer.
     Consegui ouvir um sussuro vindo daquela sirueta.
     ㅡ Feliz Páscoa! ㅡ A voz era rouca e assustadora, nunca me esqueci deste tom.
     Depois, em questão de pouco tempo, o medo que me dominava foi trocado por uma sensação de morte, e então, fechei os olhos e saí de mim. Senti que estava morto.

     Quando acordei, era de manhã. Eu estava deitado sobre o sofá. Quando me lembrei de toda aquela experiência assustadora, o mesmo medo da noite voltou. Mas, desta vez, corri ao quarto dos meus pais a toda a velocidade. Foi a primeira vez desde ontem à noite que consegui fazer algo. Mas, se eu soubesse o que viria, teria ficado no sofá.
     Aquela imagem me deu ainda mais medo e nojo. Eram meus pais. Mortos, dissecados sobre a cama. Em volta deles, uma poça de sangue enorme, que manchava o lençol da cama. Fiquei paralizado com aquela cena. Não demorou muito para que um policial me pegasse pelo ombro e me levasse para fora da casa.

     Passei o resto dos tempos na casa de minha tia. Aquela cena, aquele medo, nunca me esqueci daquilo. Os policiais abriram uma investigação para a morte de papai e mamãe, mas fecharam depois de não ter muitas provas para descortinar o caso.
     Vivi cada dia com medo daquela figura retornar. Não consigui mais estudar e nem viver. Minha tia diz, às vezes, que estou ficando louco. E acho realmente que estou. Ela vem dizendo que está tentando me colocar num hospício para jovens. Não hesitei. Não tenho mais motivo de vida. Sem meus pais, sem alguém importante. Se eu tiver de morrer, que seja da forma mais ordinária possível, mas não seja por aquele coelho. Aquele maldito coelho...

Contos Diversos - Vol 1Onde histórias criam vida. Descubra agora