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O meu despertador toca, indicando as 08h da manhã e ainda enrolada em meu pesado edredom, estico a mão até ao meu telemóvel e acabo com o barulho incessante em apenas um toque. Esforço o meu corpo tomado pela preguiça a levantar-se e quando os meus pés entram em contacto com o chão frio do quarto, sinto um arrepio atravessar-me a espinha, fazendo-me repensar se devo ou não sair da cama.
Hoje é o dia da minha entrevista de emprego e devo admitir que estou um pouco ansiosa para a mesma. O senhor com quem falei, que estranhamente ainda acho ser-me familiar, marcou a entrevista para as 10h da manhã e isso significa que eu terei que estar dentro do metro em praticamente uma hora e meia, sem contar que ainda tenho que repensar bem sobre as respostas que terei que dar à cada pergunta, mas isso eu posso decidir quando estiver à caminho de lá. Levanto da cama em um salto e cubro os meus pés com as pantufas felpudas que comprei na internet semana passada, pego a minha toalha atrás da porta e saio do quarto, sendo tomada por um silêncio cortante. O apartamento de Ruth fica demasiado silencioso pela manhã e devo dizer que um pouco sombrio também. Nem consigo imaginar como era para ela morar aqui sozinha e ter que lidar com esse clima todos os dias, sendo que eu nem sequer aguentaria mais do que dois.

Sim, eu sou demasiado medrosa.

Abro a porta do quarto banho e entro silenciosamente para não incomodar Ruth com o meu barulho. Sem demoras, faço a minha higiene calmamente e assim que termino, saio de lá e vou para o meu quarto vestir-me. Quando chego em frente ao meu armário, ja ocupado por uma imensidão de roupas, sinto o meu humor praticamente murchar e amaldiçoo-me por não ter o hábito de comprar roupas formais. Todas as minhas roupas são casuais, sem exceção e isso causa-me um pânico enorme, porque eu quero mais do que nunca causar uma boa impressão ao meu possivelmente novo patrão.
Depois de longos minutos tentando procurar por alguma roupa que parecesse no mínimo "formal", desisto, e decido optar por uma calça axadrezada preta e cinzenta, uma blusa branca e umas nikes da mesma cor que a blusa. Faço um rabo de cavalo nas minhas tranças, que inclusive eu já tenho que desmanchar porque já estão velhíssimas, passo perfume e finalizo com um gloss para não ficar com os lábios muito secos. Pego a minha inseparável mochilinha e coloco lá carregador, carteira de documentos, telemóvel e algumas pastilhas também.
Quando estou nervosa, fico com dores de barriga e pastilhas ajudam imenso a aliviar.

Saio do quarto praticamente na ponta dos pés, ainda a tentar não acordar Ruth, mas tal como das outras vezes em que tentei fazer isso, sou surpreendida com a minha prima na cozinha a fazer o pequeno-almoço.

-Bom dia, Raio de Sol!- Ela cumprimenta com um humor impressionantemente radiante e eu pergunto-me onde é que essa miúda encontra tanto entusiasmo logo pela manhã.

Tudo que eu consigo oferecer pela manhã é mal humor e ofensas descabidas.

-Dá-me o que tu bebes para ficar assim, por favor!- Eu imploro de forma exagerada e sento-me numa das cadeiras da cozinha.

-Oh! Tu queres Vodka, é isso?- Ela para de mexer algo no fogão e olha para mim com falsa inocência. Eu arregalo os olhos, sem acreditar no que ela diz e abano a cabeça freneticamente.- Estou a brincar, eu não bebo.- Diz em tom de riso e eu respiro fundo, aliviada.

Sinceramente, desde que eu cheguei aqui, eu ainda não vi a minha prima a colocar uma gota de álcool que seja na boca ou simplesmente a sair para ir à alguma festa. Na verdade, eu nunca vi algum amigo ou amiga dela a vir aqui para o apartamento, o que é deveras curioso para mim.

-Prima...- Eu chamo, ainda pensativa em relação à essa questão, e Ruth murmura um "sim", dando-me liberdade para continuar.- Porquê que nenhum dos teus amigos vem aqui ao apartamento?

Pergunto e no mesmo minuto, percebo Ruth praticamente congelar onde ela está. Estranho aquela reação e decido levantar-me para ver se havia acontecido algo. Assim que chego mais perto dela, tendo uma visão mais ampla do seu rosto, abro a boca sem acreditar no que vejo.

(Un)Crushing YouOnde histórias criam vida. Descubra agora