Capítulo 8

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Na calada da noite, meus pés tocam suavemente o chão de madeira maciça na tentativa de não fazer barulho algum. Todos os outros já estão no último sono, enquanto eu não consigo pregar meus olhos nem por um instante.

Me revirei na cama por toda a noite e de nada adiantou, estou descansada fisicamente, mas completamente acesa mentalmente. A ansiedade corre dentro de mim atrás de uma resposta como um gato corre atrás de um rato.

A ideia de ir ao palácio de Selene me assusta, mas saber que ela, assim como as outras deusas, estão todas presas, me assusta mais ainda. Assim como eu ela está presa, enjaulada, reclusa... Mas, há muito mais tempo do que eu.

Ainda não decidi o que sinto com relação à Selene, é um misto de sensações e sentimentos. Abandono, desleixo, mas ao mesmo tempo sinto um carinho vindo de sua parte... Minha cabeça é um turbilhão de pensamentos.

Vou até a mesa onde nos sentamos na hora do jantar e fica sentada nela, queria poder olhar da janela, mas Callidora nos proibiu terminantemente de abrir as janelas, disse que é perigosíssimo. E falando nela...

–Irina? –Olho para trás a vendo em pé ali com seus grandes olhos azuis e seus cabelos loiros ondulados soltos. Ela veste uma longa camisola branca, com casaco e pantufas e logo se senta ao meu lado cruzando o casaco no corpo e me perguntando: –O que faz acordada a essa hora? Está cedo ainda.

–Não consegui dormir de jeito nenhum. –Falo. –Acho que to ansiosa demais.

–Por que não me chamou? –Pergunta ela arregalando ainda mais os olhos. –Eu poderia ter feito o meu famoso chá de flor de maracujá, você adora!

–Adoro mesmo! Espera... Como sabe que eu gosto? –Pergunto franzindo o cenho. Ela pisca confusa e logo se corrige:

–Ah, perdão! –Ela diz dando um leve tapa na testa. –É o sono que embarga minha fala. Quero dizer que você adoraria, mas que bom saber que gosta! Você tomava muito isso lá embaixo...?

–De vez em quando... Antes de grandes eventos, coisas que me deixassem nervosa. Minha avó sempre fazia pra mim, minha mãe também, mas o da minha avó era o melhor. –Digo sentindo a saudade apertar no peito com a lembrança de minha avó.

–Dizem que tudo feito pela avó é mais gostoso! –Fala Callidora com um sorriso meigo no rosto se levantando e indo esquentar a água na chaleira. –Já que está perto da hora de acordarem, farei um chá pra você se sentir bem pelo menos, pra não ficar cansada.

–Duvido que eu ficarei. –Digo me recostando na cadeira. –Estou ansiosa para ir a esse palácio.

–Imagino! Sente como se estivesse voltando pra casa?

–Não... Mas, aqui não é minha casa, quer dizer, eu não nasci aqui. É a primeira vez que venho, então!

–Sei.

–Mas, Callidora...

–Me chama de Callie!

–Okay... Callie, há quanto tempo não vai no palácio da Selene?

Ela deixa a chaleira no fogo e se vira para mim, recostada na bancada.

–Bom... Pra ser sincera, desde a batalha.

–Posso perguntar uma coisa? Tipo... Eu sei o quão é horrível falar sobre guerras, perdas, luto... Por isso quero saber se se sente à vontade pra falar. E, se não se sentir, ta tudo bem também! –Falo com cuidado pois não quero de forma alguma machuca-la.

–Pode perguntar o que quiser, meu amor. Sei o que passou lá embaixo... Se eu puder ajuda-la a se sentir melhor, mesmo que seja se identificando um pouco comigo, então que seja! –Ela fala com um tom cuidadoso e suave, de quem realmente se importava. Aquilo aquece meu coração pela primeira vez em muito tempo.

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