Trabalho, Brincadeiras e Zoações

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 Se tinha uma coisa que Zola adorava nas obrigações de uma criança da vila, era experimentar coisas novas. Havia tanto pra aprender. Todo mundo na vila tinha uma função e, embora não fosse muito grande, era o suficiente pra render atividades razoavelmente diversas.

A rotina das crianças consistia em quatro horas de trabalho como aprendizes, na maioria dos dias. Uma vez ou outra ajudavam os pais com questões pessoais, e o resto do dia livre. Era regra que até às 15 primaveras, idade em que assumia as responsabilidades de um adulto, a pessoa tinha que ter passado por todas as estações, como era chamado cada trabalho. A ordem escolhida era a cargo da criança e, embora diversas as funções, eram suficientemente poucas para poder repetir estações. Sempre tem algo que fisga mais o interesse, bom, quase sempre. Além de sua utilidade, por proporcionar conhecimentos básicos sobre praticamente tudo, ainda ajudava na hora de decidir a profissão definitiva, já que se tinha o mínimo de conhecimento para escolher o que mais agrada. Dessa forma todos trabalhavam contentes e mais produtivos.

Alguns já sabiam o que queriam fazer. Como Gael, por exemplo, que queria ser artesão. Já que seu rosto era livre de sentimentos, a arte se tornou uma forma de expressão, e ele era muito bom nisso. Outros sabiam o que não queriam ser. Como Kiara, que definitivamente não seguiria os passos da mãe. Não a leve a mal, ela a amava, só achava o trabalho de tecelagem extremamente chato. A maioria não tinha certeza, mas tinham algumas opções na lista. E tinha Zola, que não fazia a mínima ideia de nada. Ela sabia que não levava jeito para coisa alguma e, pra não dizer o pior, o caminho que decidisse seguir seria bem difícil. Mas não significava que não gostava de fazê-los. Mas essa não era uma coisa com que se preocupava, tinha tempo antes de virar adulta e ter que se estabelecer na vida. Bom, era o que ela pensava, mas antes que percebesse, já não haveria mais tempo para tal preocupação.

Era quase fim do ano, o que significa que era praticamente verão. A manhã estava morna e ensolarada. O dia perfeito! A temperatura ideal no limite do agradável. Há um tempo que Zola e seu grupinho, a Molecada, estavam planejando uma surpresa pra o outro grupo. Não era a única, é claro, viviam pregando peças uns nos outros. Mas aquela em particular requeria condições climáticas específicas que, por sorte, tinham amanhecido naquele dia.

Zola tomou o café da manhã e se arrumou o mais rápido possível. Depois foi correndo direto para o Jardim das Gorunas.

– Isso!! – Ela comemorou.

Tinha sido a primeira a chegar, o que significava que a tão disputada pedra seria dela naquele dia. A pedra perfeita. Chamavam-na de trono. Não sem motivo. Ela era a mais alta e a mais confortável. Quase como se ela se moldasse especificamente pra quem fosse sentar. O que não acontecia, é claro. Não era possível que pedras mudassem por si só, era? Mas esse não é o ponto.

Mais ou menos uns dois minutos depois Elaine e Adriel chegaram apostando corrida, com certeza pra ver quem ia sentar no trono, mas pararam assim que viram Zola. Adriel balbuciou.

– Ah que droga! Eu que ia sentar lá hoje!

– Não ia não! Eu ia ganhar de você na corrida de qualquer jeito! – Elaine respondeu enquanto recuperava o fôlego.

E mais um. E depois outro. E aos poucos todos foram chegando, acompanhados pelo mesmo semblante de frustração por não terem sido os primeiros. Exceto por Gael. Não que ele não se sentisse assim, era só que sua cara continuava intacta, como se desconhecesse qualquer emoção.

Todos se conheciam desde que conseguiam se lembrar, e isso inclui Gael. E em todas as treze primaveras de sua existência, ninguém nunca o viu com qualquer resquício de expressão facial. Ele não tem essa capacidade? Ou simplesmente escolheu não demonstrar? A verdade ninguém sabe.

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