13- Nílya

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Quando o sol deixar de existir e a lua eclodir, libertando os demônios que vivem lá dentro, a escuridão será sua maior aliada, e você poderá se esconder nela. Apenas torça para eles não te encontrarem.

O Diário do Cisne Negro.


Sozinha nas profundezas, com asas ainda sem penas crescendo fortes, mas sem poder armá-las, Nílya provou um pouco da angústia que as Asas da Magia provavelmente sentiam quando seus descendentes cresciam sem aquilo que os faziam ser tão temidos.  

Todavia, o mundo não temia os Gorghorones por causa das suas asas de morcego rubronegras; não temia os Mortynikhs por causa das asas brilhantes de borboleta azuis contornadas de negra beleza; ou os Xergowiines por causa das penas roxas que diziam ser enegrecidas pela morte em dois pares de asas gigantescas. Temia os poderes que elas foram adquirindo ao longo do tempo, e o ouromáximo em suas veias.

Por mil trezentos e trinta e três anos, com o Império Xergowiine dominando todos os reinos do oriente e o sul do Padhema, o norte nunca havia precisado se ajoelhar para os padholecks, pois os mesmos haviam dividido a terra em duas partes, e construído a cidade muralha para que aquele fosse para sempre o reino dos padhs, que atravessavam a muralha quando criavam asas que não eram brancas nem escuras. Contudo, aqueles que nascessem ao sul da muralha deveriam serví-los, e nove destas famílias lutaram para que o Padhema fosse um continente apenas de homens. Para isso, fora preciso conquistar os nortenhos, e com os Príncipes do Povo de Kusbalca guardando a muralha para as Asas fora um grande desafio para a Escuderia Glenistar avançar com suas tropas.  

Depois que seu avô tramara para entrar em Brutahla e a conquistara, o norte teve medo das escuderias que haviam se aliado a ele, e juntos investiram contra as Asas. É claro que isso só foi possível porque a magia havia abandonado as três grandes escuderias; e um a um, aqueles que ainda tinham o ouromáximo nas veias caíram diante das famílias que sobreviveram. Depois disso, as duas Coroas decidiram que a próxima família que conseguisse evoluir um dos seus padhs para um padholeck governaria o continente inteiro. Mas isso nunca aconteceu.

Esta é a única verdade sobre mim. Foi por causa das mentiras de Enthuny Glenistar que o norte se curvou a nós; foi por causa da traição de minha mãe que agora estou nesta jaula; e por causa da minha mentira, Barnolf Swenndder está morto e o norte nas mãos dos Glor'Rizans.

Ao contrário de sua mãe, que era quase como uma magassanta da Corte Sagrada, Nílya rezava três vezes ao dia para a Deusa Que Cavalga. Foi em uma de suas orações que ela sentiu a jaula se mexer e aquilo acontecia apenas durante as refeições, quando era puxada até metade da torre construída em volta do poço. A jaula não chegava até a água e era sustentada por grandes correntes presas a uma manivela. Quando as portas do alçapão redondo que dava acesso ao poço foram abertas, as correntes puxaram a jaula para cima, e ela ficou suspensa até que as portas se fechassem e sua cela de ferro pousasse sobre elas.  

Entraram na torre dois Penas negras de armaduras prateadas com acabamentos verdes e uma mulher usando um vestido prateado que ela apenas havia reconhecido por causa do turbante de chifres de couro marrom. Atúlipa Glor'Rizan usava uma pele de urso branca para cobrir os ombros, como se quisesse mostrar para o mundo que havia matado o Urso de Balehrim com as próprias mãos. Os dois bastardos mágicos ela conhecia bem; o de olhos negros sempre estava no palácio, e seus lisos cabelos negros que quase tocavam o chão não eram difíceis de reconhecer; o de cabelos loiros lisos, com uma franja que cobria seus olhos azuis, era Pedriel, o caça-magia.

— A cisne negra de Hirggenbrum...— Disse a coroada por chifres.— E vejam, ela agora tem um par de asas. Mas que ironia da deusa, pois para onde vai não poderá carregar suas penas, e nem muitos menos o nome de sua antiga Escuderia... É uma pena que tenha perdido a coroação. O norte aplaudiu de pé sua nova coroada. Tenho certeza de que você havia se preparado para isso a vida inteira; só que você jamais imaginaria que o seu próprio sangue fosse capaz de mentir sobre quem você realmente era, assim como foram capazes de mentir para todos aqueles que haviam lutado contra as Asas ao lado deles. Contudo, recebi daqueles que me coroaram o poder para legitimar um bastardo, e mesmo que muitos não concordem, quero te devolver o nome de sua família. Ajoelhe-se, e quando eu conquistar o sul, vou lhe dar Hirggenbrum, e a licença que precisa para usar o seu nome no lugar das asas.

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