X - Dança

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Aquela foi a sua melhor noite de sono depois de muito tempo. Dormiu com o cheiro de Narcisa ainda dançando próximo de suas narinas, com a sensação da curva da cintura dela ainda queimando em sua mão. Tivera um sonho tão real com a mulher que dormia do outro lado do corredor que, por um momento, pensou que tivesse sido verdade, que acordaria com seu corpo junto ao dela.

Infelizmente, não havia passado de um sonho – um sonho muito bom, por sinal. Mas aquilo não o entristeceu. A resposta de Narcisa no dia anterior não fora negativa, pelo contrário. Ela foi muito clara em suas colocações e muito direta dizendo que também o queria.

Ela o queria.

Mal podia acreditar nos últimos acontecimentos. Mal podia acreditar na coragem desajuizada que o acometeu. Quase riu. Sentiu-se como um grifinório imprudente, e lembrou-se de quando Dumbledore insinuou que a seleção para as Casas era feita precocemente. Pela primeira – e única – vez em sua vida, agradeceu por ter agido impulsivamente. Aquilo o salvara. Arrancou-o do fundo do poço que foi sua vida pré-guerra. Ayo ficaria orgulhosa, não pôde deixar de pensar.

Quando desceu as escadas, Narcisa terminava de pôr a mesa. Ela lhe sorriu como se aquele fosse mais um dia qualquer, embora os dois soubessem que não era.

— Bom dia — desejou ao se sentar.

— Bom dia — ela despejou o café em sua xícara. — Dormiu bem?

— Como nunca antes. E você?

— Tive alguns sonhos que me deixaram... — hesitou — inquieta. Mas dormi bem, sim.

— Sonhos? — Arqueou a sobrancelha. — Que sonhos?

— Nada demais. — Narcisa respondeu muito rápido e escondeu o rubor em suas bochechas levando a xícara até os lábios, mas seu olhar penetrante não escapou da atenção de Snape.

Merlin, me dê forças.

— Escute — disse —, irei almoçar com Andrômeda hoje. Devo voltar para o jantar. Tudo bem para você?

— Perfeito — isso era uma meia-verdade, pois perfeito estaria se pudesse passar aquele dia inteiro na companhia dela. — Não sabia que tinha voltado a falar com a sua irmã.

— A vida é uma coisa muito estranha — estalou a língua. — A guerra me tirou uma irmã, mas me trouxe a outra de volta. Andy foi muito solidária com toda essa situação do Lúcio e do Draco, e, é claro, fiz o mesmo por ela. Perdeu o marido, logo depois perdeu a filha... — Balançou a cabeça com pavor. — Não gosto nem de pensar quão dolorido deve ser.

Snape assentiu, permanecendo calado em respeito às dores das duas irmãs Black. Quis abraçá-la. A ideia de perder Draco era tenebrosa, inclusive para ele. Óbvio, era padrinho do rapaz. Amava-o como a um... Um filho. Jamais pensou naquela perspectiva, jamais ousou pensar em enxergá-lo como um filho, mas a verdade era que já se sentia como um segundo pai para o garoto há muitos e muitos anos, e sabia que era recíproco da parte de Draco.

No início da tarde, Narcisa aparatou nos jardins cobertos pela neve enquanto Snape preparava algo singelo para o seu almoço. Ficar sozinho era uma dádiva e aproveitou sua momentânea solidão para pensar em alguns pontos essenciais para seu futuro – a curto e a longo prazo.

Precisava retornar até a Rua da Fiação. Precisava endireitar suas coisas, reformar a casa e pô-la à venda. Precisava ir até o Gringotes para se atualizar sobre a quantia que havia em sua conta, pois sabia que, depois que foi inocentado pela Suprema Corte dos Bruxos, a herança que Dumbledore deixara para ele tinha sido desbloqueada. Precisava encontrar uma nova casa e precisava pensar sobre sua carreira.

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