XI - Lar

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A sensação dos seus corpos juntos enquanto bailavam de um lado para o outro era surreal. Surreal para Snape que se privou por anos de se apaixonar novamente, de se deixar arrebatar por alguém, e perceber que esse alguém era Narcisa, a ex-mulher do seu amigo, a mãe do seu afilhado, aquela com quem jogava conversa fora nas festas da Mansão Malfoy.

E era igualmente surreal para Narcisa, que apenas agora confessava que sonhara com aquela cena por muito tempo. Foram anos desejando alguém que ela não sabia quem era, não sabia qual era o seu rosto, seu nome, seus gostos. Apenas sabia que seus sentimentos não eram mais direcionados ao seu, então, marido. Que surpresa fantástica era perceber, agora, que todo aquele tempo esteve sonhando com ele, com Severo.

Pensou como as coisas mudaram desde o fim da Segunda Guerra Bruxa, como Snape mudou. Sua imponência e taciturnidade eram inerentes e não havia nada no mundo que mudaria aquilo – e não gostaria nem um pouco que mudasse, pois, assim, não seria mais o homem pelo qual estava apaixonada. Mas percebia, ainda mais agora, tão perto dele, que eram muitas as mudanças.

Notou como ele aparou as pontas dos cabelos, porém ainda deixando o comprimento maior dos fios, que cresceram durante todo aquele tempo internado. Notou como aquele vinco entre as sobrancelhas, que já fazia parte de sua fisionomia, parecia menos aparente; isso trazia uma aparência mais leve ao seu rosto. Notou, até mesmo, que o terno que usava não era negro. Era de um azul muito escuro.

— Gosta do que vê? — Perguntou com uma sobrancelha arqueada e aquele tom jocoso, que Narcisa ainda não sabia dizer se amava ou odiava. O ardor em suas maçãs do rosto foram a resposta recebida por ele. — Estive pensando sobre algumas coisas.

— Estou ouvindo — seus rostos estavam próximos. Ambos podiam sentir o aroma de vinho que despontava de seus lábios.

— Estarei voltando à Cokeworth daqui alguns dias.

Ela não se desfez do seu toque nem parou a dança, mas afastou seu tronco alguns centímetros, procurando olhá-lo dentro dos olhos.

— Como assim? — Franziu o rosto. — Achei que... Que ficaria conosco.

— Quero fazer as coisas certas com você, Cissa. — Snape explicou polidamente, desejando afastar a decepção que ouviu na voz dela. — Quero levá-la para passear, jantar. Quero ir ao teatro com você, contar a Draco sobre nós. E então, depois, podemos dar um passo maior. Não quero iniciar uma vida de casados antes mesmo de namorá-la. — Por incrível que pareça, aquele termo não soou estranho aos seus ouvidos. — Quero fazer as coisas certas com você.

Conforme falava, podia enxergar todas as emoções passando pelos olhos pratas de Narcisa. A confusão, o medo, surpresa, felicidade e amor. Amor. Ele via amor nos olhos dela, e se pudesse olhar para um espelho naquele momento, sabia que enxergaria amor nos seus próprios olhos também.

— Pelos cabelos de Morgana, Severo! — Exclamou voltando a encostar seu corpo ao dele. — Você parece ter saído de um romance de Jane Austen.

— Acredito que estou mais para um niilista de Dostoiévski — seus lábios se curvaram em um sorriso depreciativo. — Mas aceitarei o elogio, madame.

— Disse que voltará à Cokeworth, então.

— Pretendo reformar a casa e pô-la à venda. Não contei a você — disse —, mas McGonagall me endereçou uma carta ontem pela manhã. Disse que posso ter meu antigo cargo de volta no próximo ano letivo.

— E irá? — Seus olhos pareciam ainda maiores vistos tão de perto, e Snape quase se sentiu engolido.

— Acho que sim — considerou. — Eu nunca quis ser professor. Fui contratado por Dumbledore pois ele me queria por perto. Mas foram tantos anos no magistério... — Suspirou. — Não me enxergo fazendo outra coisa a não ser lecionar.

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